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Nº 1466 - Ano 31 - 9.12.2004


No túnel do tempo digital

DCC e Centro Cultural UFMG apostam em temas históricos para desenvolver jogo eletrônico

Andréa Hespanha


aminhando pela Praça Tiradentes, em Ouro Preto, um turista decide ir ao Museu da Inconfidência para conhecer um pouco mais da história de Minas Gerais. Ele entra numa "máquina do tempo" e faz uma viagem de volta ao século XVIII. Para retornar ao presente e seguir seu caminho, o nosso herói deverá resolver enigmas que envolvem as cidades que fazem parte do percurso conhecido como Estrada Real.

Essa é a lógica do jogo produzido pela equipe do Projeto Estrada Real Digital , sob a coordenação dos professores Wágner Meira Júnior e Rodrigo Carceroni, do Departamento de Ciência da Computação (DCC), e pela historiadora Regina Helena Alves, diretora do Centro Cultural UFMG. O jogo é mais uma iniciativa ligada a um programa do governo de Minas que pretende fomentar o turismo nos municípios localizados no entorno da estrada que ligava as minas de ouro e diamante à Corte no Rio de Janeiro. O DCC contribuirá com o desenvolvimento da tecnologia, enquanto o Centro Cultural estabelecerá os roteiros e elementos históricos que entrarão no jogo.

"Ora no passado, ora no presente, o personagem mostrará aos jogadores porque determinadas coisas têm valor histórico", conta a professora Regina Helena. O game abordará quatro frentes: patrimônio histórico e material (igrejas, monumentos, locais e objetos); o patrimônio imaterial (costumes e manifestações culturais); roteiro gastronômico (que associa a alimentação à cultura regional) e meio ambiente.

Em fase de pesquisa e prototização, o projeto deverá ser efetivamente iniciado em 2005, com conclusão prevista para 2006. "Estamos construindo ferramentas e montando equipe", informa o professor Rodrigo Carceroni. Durante a fase de produção, o grupo, que hoje conta com oito pessoas, poderá chegar a 25 participantes.

O jogo será sustentado por cenários realistas, através de modelos digitais das cidades históricas e da estrada real. "Estamos produzindo fotografias desses lugares, a partir das quais realizamos a fotogrametria digital, base para a construção de um modelo tridimensional", explica Carceroni. O trabalho também envolve a modelagem de personagens históricos que entrarão no jogo e dos cenários rurais da região _ estradas, caminhos, florestas e cachoeiras.

Valorização cultural

Regina Helena ressalta que o jogo é parte de uma fórmula complexa que une inclusão digital e valorização cultural. "Queremos realizar um trabalho em parceria com as populações envolvidas. E é esse diálogo que vai revelar o verdadeiro significado da Estrada Real para as pessoas", analisa a professora. Para Rodrigo Carceroni, o grande retorno do projeto vem da certeza de que a tecnologia de produção de jogos, a princípio acessível apenas no exterior, pode ser aplicada em Minas Gerais, onde "fará uma diferença efetiva na vida das pessoas, dos guias turísticos e das crianças nas escolas".

Carceroni pondera que o público consumidor do Estrada Real não tem o perfil dos tradicionais aficionados por jogos digitais. Portanto, a frente aberta pelo DCC não pretende explorar tal segmento de mercado. "O Estrada Real não é um jogo de ação, é um game educativo que será distribuído em quiosques eletrônicos, terminais turísticos, pousadas da região e escolas. Além disso, será utilizado no treinamento de guias turísticos", conta Carceroni.

Este será o primeiro jogo efetivamente produzido pelo DCC. No primeiro semestre de 2004, o departamento ofereceu disciplina de programação de jogos para alunos da graduação e pós-graduação. "Trata-se de um mercado em expansão e, no Brasil, somente a Unisinos, do Rio Grande do Sul, também oferece essa disciplina", esclarece Carceroni. Segundo o professor, foram formadas turmas de 30 a 40 alunos, e as produções realizadas em aula caracterizaram-se pela qualidade.

O professor do DCC conta que a tecnologia de desenvolvimento de jogos é um dos caminhos que o curso de Ciência da Computação possibilita aos alunos por meio de disciplinas optativas, como Computação gráfica, Modelagem visual, Programação de jogos gráficos, Processamento digital de imagens, Robótica, Caracteres articulados e Engenharia de software. "Também o curso de Matemática Computacional sofrerá uma reforma curricular que também abrirá frentes para criação de jogos", acrescenta Carceroni. Outra perspectiva de evolução da área na UFMG está no projeto de criação do curso de Cinema e Audiovisual, que envolve o próprio DCC e os departamentos de Comunicação, da Fafich, e de Fotografia, Teatro e Cinema, da Escola de Belas-Artes.

O Estrada Real ainda não está pronto, mas a equipe já esboça novos projetos. "Com uma equipe montada, a realização de novos jogos passa a exigir esforços menores", afirma Rodrigo Carceroni. A próxima empreitada deverá ser um jogo baseado na obra Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa.

*A Estrada Real é constituída pelos caminhos que, durante o século XVIII e parte do XIX, foram as únicas vias de acesso à região das reservas auríferas e de diamantes da Capitania de Minas Gerais autorizadas pela Coroa Portuguesa. Ela começa em Diamantina, sofrendo uma bifurcação em Ouro Preto. Um caminho vai a Parati, o outro ao Rio de Janeiro. O trajeto, em cujas margens formaram-se 179 cidades de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, foi decisivo para o povoamento e colonização de vastas regiões do território brasileiro.

Legenda (Foto 1): Mapa com percurso da Estrada Real. No computador, vista da Praça Tiradentes, em Ouro Preto, um dos cenários do game

Legenda (foto 2): Rodrigo Carceroni, Wagner Meira e Renato Ferreira, da equipe do game: nova frente tecnológica
Foto: Eber Faioli