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Nº 1506 - Ano 32
27.10.2005

O eterno guerreiro da vanguarda

Márcio Sampaio, professor da Escola de Belas-Artes e um dos mais importantes artistas brasileiros, comemora 50 anos de carreira

Regis Gonçalves

espaço está congestionado pela circulação ininterrupta de pessoas e à medida que se avança entre corredores apinhados, onde se vêem quadros, livros, objetos, instalações, pôsteres, fotografias e painéis, numa profusão de signos, a figura miúda de um homem se destaca. Mais que isso, se agiganta e adquire contornos salientes contra a forma de um poema impresso na parede.

Estamos na Grande Galeria do Palácio das Artes para a inauguração da mostra Declaração de Bens, uma retrospectiva de 50 anos de carreira artística de Márcio Sampaio. Visitando-a, percebemos o quanto são imensas sua figura e a arte que faz dele uma referência indispensável para a cultura em Minas Gerais nas últimas quatro décadas.

Márcio Sampaio: "notório saber"

Nesse período, Sampaio exerceu influência decisiva como poeta, artista plástico, professor, crítico, ensaísta, curador, museógrafo, historiador da arte, livre-atirador e até secretário de Cultura, em Itabira. Uma dessas facetas - e talvez a mais importante _ foi desenvolvida na Escola de Belas Artes (EBA), da UFMG, onde ingressou em 1967 para uma fugaz experiência como aluno, logo jubilado. Mas para onde voltou a convite, dez anos depois, como professor, por "notório saber".

"Aposentei-me em 1999, depois de 40 anos de trabalho cultural e artístico", suspira. Mas por esse trabalho não lhe faltam os créditos. O diretor da EBA, Evandro José Lemos da Cunha, testemunha que Márcio "exerceu influência muito grande na linha criativa da Escola. Além de grande artista, foi excelente professor, seja no trato com os alunos, seja na proposição investigativa".

Além da academia

A influência de Sampaio ultrapassou em muito o círculo acadêmico. Ele é um dos mais notáveis líderes da vanguarda artística em Minas Gerais. Sempre voltado para a pesquisa e a experimentação, seu temperamento irrequieto levou-o também à poesia, onde mostrou-se capaz de uma sensível articulação entre texto e imagem. Com um grupo de amigos, fundou a revista de vanguarda Ptyx, participou do Suplemento Literário do Minas Gerais que, sob o comando de Murilo Rubião, revelou uma geração inteira de escritores mineiros, publicou inúmeros livros individuais e participou de outras tantas antologias.

"Se duas palavras podem definir a obra de Márcio Sampaio, estas são surpresa e originalidade. Ao longo de toda a sua trajetória de artista plástico, multimídia e multímodo, Márcio construiu ambigüidades, incertezas, desambientes, desestruturas e castelos no ar, que se transformavam em altas peças de elaborada edificação estética", testemunha seu contemporâneo de lutas vanguardistas, o poeta-escritor-editor Sebastião Nunes.

Foi em Santa Maria de Itabira, onde nasceu há 64 anos, que Márcio Sampaio ensaiou os seus primeiros rabiscos. "Aos 12 anos comecei a pintar, copiando cartões-postais e figuras de revistas", relata. Em 1953, partiu para Itabira, a fim de continuar os estudos. "Fiz logo amizade com os fantasmas itabiranos, aqueles mesmos que atormentaram a infância (e a vida toda) de Carlos Drummond de Andrade", revela.

Depois, veio para Belo Horizonte, de onde nunca mais saiu. Aqui se enturmou, cultivou grandes amizades, fez-se conhecido e respeitado. De seu casamento com a artista Eliana Rangel (morta em 2003) resultaram os filhos Alberto e Gustavo. "Além de ter sido excepcional colaboradora de meus projetos pessoais, Eliana participava de meus trabalhos de curadoria e museografia, sempre disposta a ajudar. Tinha uma acuidade extraordinária e via as coisas muito além da superficialidade da obra", relembra.

Quem não pôde ver Declaração de bens, aberta à visitação em 7 de outubro, terá nova oportunidade de conferir o trabalho de Márcio Sampio no próximo dia 30, quando será lançado catálogo composto de texto crítico de Bartolomeu Campos Queirós, registros fotográficos da montagem, fotos das obras e dos eventos que ocorreram na abertura da exposição.