Busca no site da UFMG

Nº 1620 - Ano 34
07.08.2008

entrevista

“Sofrimento e felicidade se combinam”

Itamar Rigueira Jr. e Luiz Dumont Jr.

Paulo Cerqueira
David
David Lynch: o artista não precisa sofrer para mostrar o sofrimento

A UFMG recebeu na última semana, como parte do ciclo de conferências e espetáculos Sentimentos do Mundo, o cineasta americano David Lynch, diretor de Veludo azul e O homem elefante. O artista viaja pelo mundo para lançar o livro Em águas profundas: criatividade e meditação e divulgar a prática da meditação transcendental, que segundo ele faz fluir a criatividade e leva à felicidade completa. Em Belo Horizonte, Lynch falou de seu processo de criação e pregou a adoção da meditação transcendental pelas escolas e universidades, que podem se transformar em “fábricas de paz”. Estes são alguns aspectos que o cineasta abordou na conferência e em entrevista à imprensa.

Mais inteligência, menos medo

“A meditação transcendental influencia todos os aspectos da vida de maneira positiva”, garante David Lynch, que pratica duas vezes ao dia, há 35 anos. “Ela abre as portas para níveis mais profundos de vida. Amplia a consciência, a inteligência, a criatividade. Essa experiência faz desaparecer a negatividade, a ansiedade, a tristeza, o ódio e o medo”, diz o cineasta, que é também escritor, pintor, fotógrafo, escultor e compositor.

Potencial pleno

A negatividade, de acordo com Lynch, é inimiga da criatividade. “A meditação facilita o fluxo de idéias e da intuição, que é a ferramenta número 1 do artista. Estimula a exploração do potencial pleno, que é chamado de iluminação.” Segundo ele, ao transcender, a pessoa descansa três vezes mais que durante o sono. “E recebe energia. Esse poder positivo alimenta o trabalho do artista e de qualquer pessoa, não importa o que ela faça.”

O mundo é como você é

A chave para tudo é a consciência, diz David Lynch. “Algumas pessoas vêem o mundo através de lentes escuras e sujas. Este é o seu mundo. Quando transcendem, elas começam a limpar as lentes. Todos têm consciência, mesmo antes de começar a meditar. É uma questão apenas de quantidade. Por que passar a vida inteira com uma pequena quantidade de consciência, se é possível expandi-la sem esforço e aproveitar mais a vida?”

Filmes obscuros de um cineasta feliz

Lynch conta que as pessoas sempre lhe perguntam por que um artista que se diz tão feliz produz uma obra tão densa e obscura – seus filmes são considerados perturbadores e exploram aspectos bizarros do ser humano. Ele assegura que não há qualquer paradoxo aí. “Sofrimento e felicidade se combinam em todas as histórias. E meus filmes refletem o mundo, que hoje é muito problemático. Mas o artista não precisa sofrer para mostrar o sofrimento, é preciso que ele entenda a condição humana.”

Apaixonado por idéias

Para David Lynch, tudo é idéia. Ele conta que para realizar suas obras se agarra às idéias que encontra pelo mundo. Ele se diz apaixonado por idéias, pela forma como o cinema as traduz, e afirma que isso é o que o empolga. “Não sei aonde vou ou o que faço antes da idéia vir. E isso não se encontra em supermercados, então eu espero que a idéia venha para trabalhar em torno dela”, afirma.

Fluxo contínuo

“Com um roteiro acontece assim: você tem uma idéia, depois outra. Coloca isso no papel e no fim tem um roteiro. Você lê aquelas palavras em seqüência e vai entender toda a lógica da idéia que teve. Depois é só organizar o roteiro”, afirma. David Lynch ressalta que o fluxo das idéias é contínuo e uma idéia que norteia o caminho pode se mostrar incompleta durante a criação. De acordo com o diretor, é possível também deparar com uma grande idéia no processo de pós-produção de um filme, quando as cenas já foram gravadas e a obra já está sendo montada. “Eu insisto que, ao encontrar uma idéia, você deve gravá-la e trabalhar nela até o seu esgotamento. Mas uma idéia pode aparecer depois, e você se diz: ‘Não posso terminar sem isso, agora sim meu trabalho está completo."

Meditação nas escolas

O trabalho do cineasta, que está à frente da Fundação David Lynch e inicia viagem por 15 países, é estimular as escolas a adotar a meditação transcendental. "A educação deve trazer à tona o potencial pleno dos jovens. E isso só é possível com a redução do estresse e o aumento da compreensão”, disse Lynch, que garante que nas escolas em que se pratica a meditação o relacionamento é muito melhor e é muito mais fácil aprender. “A educação baseada em fatos, imagens e estresse faz muito pouco pelo estudante”, ele afirma, acrescentando que a meditação entre os jovens é um caminho para a diminuição da violência e da criminalidade.

“Fábricas de paz”

A intenção de David Lynch é visitar pelo menos uma universidade em cada um dos países de sua turnê de divulgação. “As universidades são lugares especiais. Se elas introduzissem a meditação transcendental na rotina de alunos e professores, poderiam se transformar em fábricas para criação de paz. A universidade deve se tornar invencível, e a invencibilidade é a paz dinâmica, o que significa que nenhum mal pode vir de dentro ou de fora do país”, diz o cineasta. Segundo Lynch, uma universidade iluminada influencia positivamente a consciência coletiva de uma cidade, de um país e do mundo.