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Nº 1666 - Ano 35
7.9.2009

Direto ao ponto

Nova abordagem adotada no Departamento de Terapia Ocupacional ajuda crianças a superarem os efeitos do transtorno de coordenação

Bárbara Xavier França

Em salas de aula comuns, formadas por crianças com idades de 6 a 12 anos, é possível notar que algumas não interagem com seus colegas durante o recreio, são mais caladas, não participam das atividades físicas e frequentemente apresentam rendimento escolar abaixo da média. Esse perfil coincide, em muitos casos, com o de crianças portadoras do chamado Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação (TDC), dificuldade em realizar atividades do dia a dia que exigem habilidades motoras, como amarrar o cadarço, andar de bicicleta, pegar bolas ou escrever.

Os problemas motores aparecem em 5 a 9% das crianças em idade escolar e ainda não se sabe exatamente qual a causa, mas se não forem diagnosticados e receberem a devida atenção na infância, baixa autoestima, isolamento social, ansiedade e depressão podem surgir na adolescência e estender-se até a fase adulta. Para tratar o problema e ajudar a criança a melhorar sua qualidade de vida, a mestranda em Ciências da Reabilitação Clarice Ribeiro Soares Araújo, do Departamento de Terapia Ocupacional da UFMG, busca soluções com uma nova forma de tratamento trazida do Canadá por sua orientadora, Lívia de Castro Magalhães.

O projeto, intitulado Efeitos da Terapia Motora Cognitiva no desempenho de atividades e na participação social de crianças brasileiras com Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação, trabalha de acordo com o protocolo da Cognitive Orientation to Daily Occupational Performance, ou CO-OP, sigla mantida do inglês para transmitir a ideia de cooperação – no caso entre terapeuta, paciente e os pais.

As terapias usadas até então para tratar o TDC olhavam para o processo e trabalhavam cada etapa do movimento da criança para melhorar o resultado final. Mas essa abordagem, segundo Clarice Araújo, é demorada e, muitas vezes, não surte efeitos em crianças mais velhas. Já a Terapia Motora Cognitiva vai direto ao ponto. “Olhamos para o que, de fato, é problema, para o que a criança quer aprender e o que ela tem dificuldade. A partir daí, faço uma análise da tarefa e utilizo os princípios dessa terapia, que é embasada em várias teorias das áreas de comportamento motor e psicologia comportamental”, explica.

Etapas

Quatro marcos regem a terapia: meta, plano, execução e checagem. A criança estabelece suas metas, baseadas nos aspectos em que tem mais dificuldades e gostaria de melhorar, como pintar, escrever rápido, andar de bicicleta, jogar basquete. Num segundo momento, juntamente com a terapeuta, pensa em planos que lhe permitirão chegar ao objetivo de forma satisfatória. Em seguida, executa a tarefa pretendida e, por último, checa se o planejamento foi bem-sucedido e a necessidade de mudar de rota.

Na avaliação (checagem) do processo reside outra inovação. Quem comanda a tarefa é a própria terapeuta só que na pele do esperto Mr. MetaplanoFazcheca, um fantoche que fareja soluções para os problemas. De acordo com a pesquisadora, essa é uma estratégia que torna a relação entre ela e o paciente mais leve e amigável. “Assim, tiramos um pouco aquele peso do erro que recai sobre os ombros da criança”, argumenta.

Em vez de simplesmente apontar o erro, a nova abordagem permite uma reflexão sobre ele. Os especialistas acreditam que a dificuldade em organizar as etapas da ação na sequência correta ou escolher o melhor procedimento em determinada situação são as possíveis causas do transtorno. Dessa forma, conscientizar-se de suas dificuldades pode dar mais suporte e segurança para a criança realizar as tarefas que deseja e conviver melhor com sua deficiência, já que ainda não existe cura para o transtorno. “Com a terapia, não eliminamos o problema, mas o enfrentamos com sucesso”, diz Clarice Araújo.

Atendimento

Os estudos desenvolvidos por Clarice se desdobram em um atendimento gratuito realizado no Departamento de Terapia Ocupacional da UFMG. O tratamento é composto por 13 sessões de uma hora, duas vezes por semana, e utiliza todas as dependências da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional para a realização de atividades e brincadeiras. A terapeuta também realiza sessões nas residências das crianças atendidas. Dessa forma, o estudo colabora com os portadores do transtorno e com a pesquisa na área, que ainda é deficiente em literatura e dados sobre TDC.

DLS, um de seus pacientes, tem oito anos e, segundo sua mãe, tem dificuldade em usar as mãos em atividades que requerem habilidades motoras finas . Ao procurar tratamento, a família descobriu o estudo de Clarice e resolveram experimentar. Embora o tratamento esteja no início, a mãe percebe a empolgação do garoto, que adora jogar bola e pular corda. “A abordagem usada é extremamente motivante. Meu filho adora vir aqui”, enfatiza.