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Uma escultura de Nossa Senhora da Conceição, que adorna os jardins do Palácio da Alvorada, residência do Presidente da República, em Brasília, está em processo de recuperação no Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (Cecor), da Escola de Belas-Artes da UFMG. Radiografias e análises laboratoriais revelaram dados sobre o estado de degradação da peça, além de informar sobre o período em que foi esculpida, técnicas construtivas empregadas e o material utilizado. Detalhes que passariam despercebidos a um leigo fornecem valiosos indícios sobre a história da imagem. "Estudos indicam que a peça é da escola baiana, provavelmente da segunda metade do século 19", explica o conservador e restaurador Mário Sousa Júnior, responsável pelo trabalho. O uso de pregos para afixar partes da madeira indica que a obra é do período industrial, posterior à época em que se usavam cravos, feitos por ferreiros. A presença de uma massa avermelhada, em conexão com a madeira, é também uma datação histórica. "Esta massa é típica de um período de transição, em que a madeira foi substituída por gesso", afirma Sousa Júnior, ao ressaltar a importância da peça, representante deste período de transição. Já os resquícios de folhas de ouro são marca quase inquestionável da procedência da escultura. "A Bahia, que era grande produtora de imagens, empregava fortemente esse material", informa. Degradação Os testes microquímicos revelaram também que a imagem foi pintada pelo menos três vezes, alterando as características originais da obra. Agora, essas camadas de tinta começam a ser cuidadosamente retiradas, após a fixação dos blocos de madeira que compõem a peça. "Antes de iniciar a restauração, promovemos diversas reuniões com a equipe de restauradores do Cecor, para discutir as formas mais adequadas de intervenção", diz Sousa Júnior, que pretende concluir o trabalho em julho. Embora seja impossível resgatar a aparência exata que a peça tinha ao ser esculpida, Mário Sousa Júnior diz que o trabalho ressaltará aspectos originais preservados da obra. "O ornamento em dourado, infelizmente, se perdeu. Vamos direcionar nosso trabalho para o que escontrarmos por baixo das repinturas", comenta. A escultura tem cerca de 60 cm de altura. Ao devolver a imagem restaurada ao governo federal, Sousa Júnior deve enviar um dossiê recomendando que a peça seja instalada em ambiente climaticamente adequado. "Vamos sugerir a compra de uma imagem semelhante, de gesso, para substituí-la nos jardins", adianta. Cooperação técnica Em contrapartida, o Cecor espera que o governo apóie a participação de Mário Sousa Júnior em congresso internacional de restauradores, em setembro, na Espanha. Sousa Júnior, que apresentará trabalho sobre proteção de arte moderna e contemporânea, ressalta a importância de divulgar as pesquisas brasileiras em fóruns internacionais.
O nicho ao relento, nos jardins do Palácio da Alvorada, oferecia pouca proteção à imagem, que chegou ao Cecor, em setembro do ano passado, em adiantado processo de degradação. O repetido movimento interno dos materiais, provocado pela variação climática através dos anos, alterou profundamente a estrutura da peça, causando trincas e descolamento. Além disso, encharcada pela chuva, foi alvo da ação de fungos e sofreu oxidação nas proximidades dos pregos.
A imagem de Nossa Senhora da Conceição é a segunda peça do acervo da Presidência da República trazida ao Cecor no governo Lula: a primeira foi a imagem do Cristo morto, do gabinete do Presidente, restaurada em 2003. As obras, que chegaram à Universidade por intermediação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), originaram um convênio de cooperação nesta área entre a UFMG e o governo federal.