Artigo publicado na edição eletrônica de 11 de abril da Nature Neuroscience, de autoria da ex-doutoranda da UFMG Ana Cristina Ribeiro Magalhães, demonstra que comportamentos de estresse e depressão possuem maior interação do que se imaginava. De acordo com a pesquisadora, o elo entre eles ocorre por meio da interação dos reguladores do hormônio cortisol (estresse) e do neurotransmissor serotonina (depressão). Intitulado CRF receptor 1 regulates anxiety behavior via sensitization of 5-HT2 receptor signaling, o estudo foi desenvolvido em pesquisas de pós-doutorado de Magalhães, na University of Western Ontario, London, em Ontário, Canadá. Em seus experimentos com ratos modificados, ela observou que o "segredo" dessa interação "está em receptores, 'fechaduras' na superfície das células (como os neurônios do cérebro) que desencadeiam efeitos em seu interior diante dos sinais dos hormônios e neurotransmissores", conforme descreve o jornalista Marcelo Leite, em artigo sobre o trabalho divulgado na Folha de S.Paulo no último domingo, 25. Ana Cristina Magalhães finalizou o doutorado em Farmacologia Bioquímica e Molecular pela UFMG em 2005. Na mesma instituição, ela se graduou em Ciências Biológicas (1998) e obteve grau de mestre na área de fisiologia e Farmacologia. Leia o artigo de Marcelo Leite sobre o trabalho da pesquisadora: Estresse, ansiedade, depressão - De uma maneira ou de outra, é raro o cidadão do século 21 que não experimente na vida diária uma das três condições que o definem -estresse, ansiedade e depressão. Cada um responde como pode, com as armas deixadas pela evolução da espécie e pela própria biografia. Anos atrás, causou espanto a revelação numa festa: em meio à dúzia de parentes e amigos, só uma pessoa não se medicava com ansiolíticos ou antidepressivos. É uma epidemia. Com a ajuda de uma bióloga brasileira no Canadá, Ana Cristina Magalhães, pode surgir um novo meio de combatê-la. Nos vales da África antiga, eram inimigos de carne e osso, animais ou humanos, e o fantasma da fome. Nas megacidades do presente, o que oprime são os atrasos no trânsito, insegurança profissional, violência imaginária e afetos embaralhados. Raros, contudo, são os que hoje ameaçam, de fato, nossa sobrevivência. A evolução dotou os humanos com um sistema complicado para enfrentar perigos, reais ou de fantasia. No centro está o hormônio cortisol. Entre outros efeitos, ele aumenta a pressão arterial e o nível do açúcar no sangue. Resumindo, trata-se de energia para correr, ou brigar. Como nem sempre dá para fugir do engarrafamento ou esmurrar o patrão, o estresse se torna crônico. O sistema legado pela evolução darwiniana se desregula e dá origem ao mal-estar da civilização: ansiedade. Nos casos mais graves, a medos irracionais e incontroláveis -as fobias- ou ao abismo escuro da depressão. Existe, portanto, uma ligação e uma gradação entre estresse, ansiedade e depressão. Não se conhecia bem, no entanto, como se encaixam as peças do quebra-cabeça bioquímico que fornece o combustível do sofrimento. Com o trabalho de Ana Cristina Magalhães, agora se conhece um pouco mais. O estudo foi publicado em formato eletrônico pelo periódico "Nature Neuroscience" no dia 11. Ela o desenvolveu em London, Ontário (Canadá), como pós-doutoranda no laboratório de Stephen Ferguson. Seu grupo descobriu um elo entre reguladores do hormônio cortisol (estresse) e do neurotransmissor serotonina (depressão). O segredo está em receptores, "fechaduras" na superfície das células (como os neurônios do cérebro) que desencadeiam efeitos em seu interior diante dos sinais dos hormônios e neurotransmissores. A equipe do Instituto de Pesquisa Robarts, em London, usou camundongos artificialmente ansiosos. Com a ajuda deles, conseguiu revelar uma interação direta, junto à membrana das células, entre dois tipos de receptores específicos, ambos envolvidos no processamento do hormônio e do neurotransmissor. Ferguson e Magalhães também criaram um composto químico capaz de bloquear essa interação e já estudam a possibilidade de patenteá-lo. "A ideia é que esse inibidor bloquearia a resposta ao estresse que gera um estado ansioso", explica a brasileira. "Sendo assim, poderia ser usado para o tratamento de distúrbios de ansiedade e até mesmo depressão." A bióloga não sabe ainda se retorna ao Brasil. Está em situação parecida com a vivida em 2005, depois do doutorado na UFMG: "No Canadá, caso consiga emprego, haveria condições de estabelecer o meu próprio grupo de pesquisa, o que não é fácil no Brasil". É deprimente. (FSP, 25/04/2010)
Contra o estresse não há remédio. Trata-se da condição humana por excelência, nos 100 mil ou 200 mil anos da espécie. E a mais animal delas: a boa e velha reação do medo, que prepara o organismo para fugir, ou lutar, diante de uma ameaça.