Compromisso coletivo

Karin Ellen von Smigay*

 

tentativa de assassinato de uma estudante do curso de História, ocorrida no campus da UFMG, nos põe diante de indagações e angústias, exigindo-nos uma nova postura face às questões da segurança e da violência a que estamos sujeitos, enquanto membros da comunidade universitária.

Expostos a riscos crescentes, reflexo da violência urbana, cabe retomar alguns pontos para refletir e agir. Desde o desaparecimento da Beth (a funcionária Elizabeth Pinheiro, do ICEx), um desconforto insistente nos incomoda permanentemente, mesmo se não falamos dele. Suspeito que não tenhamos ultrapassado o estágio da perplexidade e da queixa - esse hábito de nos sentirmos vítimas do destino, dos descuidos da instituição, de imputar ao outro a responsabilização pela nossa segurança.

O trágico acontecimento dos últimos dias nos repõe a indignação, mas agora nos compete "sair da queixa" e buscar alternativas, de forma que as condições de produção - trabalhar e estudar - continuem sendo ações prazerosas e não intimidantes.

É lógico que concerne à Reitoria o compromisso com a segurança, enquanto parte das condições de produção, e é justo que esperemos ações criativas, adequadas à realidade urbana. Ações que, a nosso ver, não serão mais eficazes se nos isola com cercas, cancelas, filmadoras e guardas nas entradas do campus. Ao contrário, o isolar-se da cidade, da comunidade externa, é, justamente, o grande equívoco. Se o campus estivesse aberto à população, integrado à paisagem urbana e ocupado, nos fins de semana, por crianças e adolescentes, para brincar, praticar skate, fazer cooper e pedalar, fosse lugar de piqueniques e espetáculos musicais e artísticos, produzidos pela própria Universidade, já haveria redução dessas áreas propícias a cadáveres e estupros.

Se o campus, nos moldes das universidades norte-americanas, fosse local de moradia estudantil, de professores e de pesquisadores visitantes, passaria a ser um centro de movimentação permanente, não esse imenso espaço morto, tão sujeito a esconderijos e ataques impunes. Teria vida, teria sentido, integraria-se à "normalidade" que o espaço urbano requer e demanda.

Já se sabe que a exclusão não gera proteção, ao contrário. Por que insistir nesse caminho? Como nos proteger de riscos, inclusive de morte, como os que aconteceram nas imediações e agora no interior do campus?

A violência urbana não se dá no vazio: nesta cultura falocêntrica, mulheres, homossexuais e os "insubmissos da virilidade triunfante" - homens que recusam o modelo masculino dominante e são doces, afetivos e não agressivos - tornam-se objetos preferenciais de menosprezo, estando mais sujeitos a diferentes graus de violência. Da mesma forma, negros também estão mais sujeitos à violência - são os vieses de gênero e de etnia, que compõem um quadro onde a exposição é maior, exigindo mais proteção.

Para contrapor-se a esse quadro, uma saída é divulgar com detalhes todo e qualquer abuso - quando, como e por quem foram cometidos - ajudando-nos a identificar possíveis agressores e a nos precaver, em certa medida. Se sabemos quem podem ser eles, como agem, quando e onde, cada um de nós passa a ser mais vigilante. Nesse sentido, a Divisão de Segurança do campus deve ser sempre comunicada e tem obrigação de manter a comunidade informada dos riscos e das providências tomadas.

O compromisso com a segurança também é responsabilidade de cada um de nós - consigo mesmo e com o outro. Está na hora de criarmos uma nova cultura no interior da Universidade, para nos tornarmos solidários com os colegas. Devemos evitar deslocamentos solitários, criar horários coletivos de entrada/saída, instaurar a prática da carona ou partilhar custos das viagens cidade-campus e, sobretudo, ampliar, de fato, o número de ônibus em circulação, para que não sejamos obrigados a caminhar por lugares ermos. Também é preciso criar "milícias" (inclusive femininas), que circulem permanentemente no campus, e manter debates ou seminários, estabelecendo um diálogo aberto com a comunidade, pois, certamente, muitas soluções interessantes devem estar represadas, sem canal para exposição. Estas podem ser alternativas viáveis e de baixíssimo custo.

* Professora de Psicologia Social da UFMG. Especialista em violência de gênero

 

Quem deve zelar pela segurança do campus?

 

"Cuidar da segurança é um dever da Reitoria. É a direção da Universidade que recebe recursos do Governo Federal e pode repassá-los para áreas importantes como essa."

Marisa Affonso Vasconcelos, aluna de Ciência da Computação

 

"Oficialmente é a Reitoria. Acho, no entanto, que todos devem zelar pela segurança. É preciso fazer um trabalho de conscientização e manter vigilância intensiva. Os vigilantes devem ser municiados de informações sobre o campus e treinados para agirem em situações de perigo."

Geraldo Robson Mateus, professor do Departamento de Ciência da Computação

 

"Deve haver uma divisão de responsabilidades entre a Universidade e a polícia. Além disso, não há como ter segurança, se cada pessoa não tomar cuidados no dia-a-dia. Determinadas situações não podem ser evitadas, a não ser que alunos, professores e funcionários estejam permanentemente atentos."

Jacyntho José Lins Brandão, ex-vice-reitor da UFMG e professor do departamento de Letras Clássicas da Fale

 

"Seria interessante a realização de um trabalho conjunto entre a segurança da UFMG e a PM. Acho também que alunos, professores e funcionários precisam se prevenir e, em caso de situações estranhas, recorrer a algum telefone de plantão da Universidade."

Frederico Godinho Cunha, aluno de Engenharia Metalúrgica e Materiais