Busca no site da UFMG




Nº 1359 - Ano 28 - 25.07.2002

Nos porões da memória

Mostra fotográfica do Festival de Inverno expõe as feridas da ditadura argentina

Pablo Pires*

 

atos longínquos, pessoas desaparecidas, imagens de um tempo quase esquecido são objetos da pesquisa e do trabalho do fotógrafo argentino Marcelo Brodsky. Os chamados "anos de chumbo" constituem um período amargo, violento e comum a quase todos os países da América Latina. Pois as fotografias de Brodsky revolvem imagens e fatos desses tempos em que o silêncio era a palavra de ordem.

As fotos de Brodsky, que abordam o sofrimento imposto pela ditadura argentina, estão reunidas na exposição Buena Memoria/Nexo, uma das atrações do 34º Festival de Inverno da UFMG, em Diamantina, e que chega ao Centro Cultural UFMG, em Belo Horizonte, no dia 22 de agosto.

A vida e o trabalho de Brodsky são inseparáveis. A memória evocada em suas fotografias são também parte da sua trajetória pessoal. Nos primeiros anos da ditadura, após uma tentativa de seqüestro, Brodsky fugiu e radicou-se na Espanha, onde estudou fotografia e economia. Retornou à Argentina em 1984, quando o país passou a respirar ares mais democráticos. "No começo não havia espaço para a arte, havia outras preocupações e urgências", explica.

Tempos depois, voltou à Espanha, onde constatou que "as ausências não haviam passado". Por isso, embora bem-sucedido profissionalmente em terras espanholas, Brodsky decidiu mergulhar em busca de sua identidade. Voltou definitivamente a seu país, em 1995, atrás do que considera "o fato mais marcante da história argentina do século 20": a experiência do desaparecimento. Foram 30 mil mortos durante a ditadura.

Ele procurou seus antigos colegas e notou ausências. A foto de sua turma, ponto de união de uma geração, sofreu intervenções com frases que comentavam a vida dos que sobreviveram. Tornou-se um ícone da luta pelos direitos humanos e emblemática de uma memória que quase foi apagada. A idéia foi sendo desdobrada. Buscou imagens dos desaparecidos, fotografou sobreviventes, escreveu textos e também aprofundou o trabalho na sua própria e mais dolorida lembrança: o desaparecimento do irmão, Fernando. O resultado compôs a exposição Buena Memoria, aberta em 1998.

O tema continuou instigando o trabalho do fotógrafo. Em Nexo, ensaio concluído em 2001 e inédito no Brasil, Brodsky volta a abordar o tema de maneira mais simbólica e até abstrata. Recordações de várias épocas, imagens de pessoas no exílio, de arquivos policiais (foto), livros enterrados, formam o trabalho que considera "o mais reflexivo" sobre a questão da memória. A fotografia de Brodsky é embaçada pelo tempo, largada em algum ponto distante da mente. Por outro lado, parece carregada pela urgência do tempo presente.

Exposição de fotografias Buena Memoria/Nexo"
Autor: Marcelo Brodsky
Visitação: Em Diamantina, até o dia 25 de julho, de 9h às 18h, no Mercado Velho
Em Belo Horizonte, abertura no dia 22 de agosto, às 20h, no Centro Cultural da UFMG. Visitação de 23 de agosto a 15 de setembro, de segunda a sexta, de 9h às 21h, aos sábados, domingos e feriados, de 9h às 18h


* Jornalista da equipe do 34º Festival de Inverno da UFMG