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Nº 1512 - Ano 32
08.12.2005

Sem lenço nem documento

Pesquisa investiga participação dos jovens brasileiros na vida pública

Ana Paula Ferreira

ondições materiais precárias e pouca experiência em atividades de grupo durante o período escolar explicam porque apenas 28,1% dos jovens brasileiros _ na Região Metropolitana de Belo Horizonte esse índice cai para 20,7% _ estão engajados em ações de participação coletiva. Essas constatações são parte da pesquisa Juventude brasileira e democracia: participação, esferas e políticas públicas, realizada em sete regiões metropolitanas (Porto Alegre, Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, Belém e Belo Horizonte) e no Distrito Federal.

O objetivo do estudo, coordenado pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase-RJ) e pelo Instituto Pólis (SP), foi conhecer o potencial de participação dos jovens brasileiros na vida pública. Na Grande BH, a coleta de dados foi feita pelo programa Observatório da Juventude, da Faculdade de Educação da UFMG.

Ao todo, foram entrevistadas oito mil pessoas, com idades entre 15 e 24 anos, de agosto de 2004 a julho de 2005. Na grande BH, mil jovens participaram da fase quantitativa da pesquisa, respondendo a questionário do tipo Survey. Destes, 122 fizeram parte da segunda etapa, que consistiu na realização de cinco encontros (grupos de diálogos), nos quais eram discutidas questões relativas à participação.

De acordo com professor Juarez Dayrell, um dos coordenadores do Observatório, o baixo índice de participação da juventude brasileira não significa que ela seja alienada ou desinteressada. "A sociedade não tem oferecido condições e estímulos para a participação", argumenta o professor. Para ele, a juventude atual é vítima do que pode ser chamado de nova desigualdade social. "Eles vivem numa sociedade que oferece de tudo em termos simbólicos, mas que não dá acesso. Essa inclusão subalterna interfere muito na construção da identidade e dos projetos de vida da maioria desses jovens", analisa Dayrell.

Causas

A pesquisa revelou que cerca de 70% dos entrevistados na capital mineira se enquadram nas classes econômicas C, D e E. O professor afirma que no Brasil ainda persiste um modelo de estrutura social que reproduz a desigualdade econômica de forma perversa e que impacta diretamente a participação dos jovens.

Outro problema detectado é a pequena oferta pelas escolas de possibilidades de participação em trabalhos coletivos. Segundo Dayrell, a vivência em atividades de grupo, como ações de solidariedade e sociabilidade, campanhas e trabalhos com as comunidades, são fundamentais no processo de aprendizagem para a vida coletiva. Entretanto, cerca de 50% das escolas citadas pelos entrevistados não oferecem esse tipo de atividade, nem mesmo relacionadas ao acesso à informação, como debates e seminários. "Se a escola não oferece ao jovem essa oportunidade, onde ele vai aprender?", indaga o professor.

O que eles querem

Quando questionados sobre o país que gostariam de ter, os jovens apontaram necessidades de mudanças relacionadas a três eixos: trabalho, educação e lazer/cultura. Entre outras coisas, reivindicam melhores oportunidades de trabalho, qualificação profissional, estágios e acesso ao primeiro emprego. Das escolas, os jovens demandam que elas conheçam melhor a realidade de seus alunos e aperfeiçoem suas relações humanas e pedagógicas. Os jovens também reivindicam a criação de mais áreas de lazer, especialmente nas periferias, e de segurança e policiamento que garantam o acesso de todos a esses locais.

De acordo com professor Juarez Dayrell, os jovens reconhecem a importância do trabalho em grupo para atuar na esfera pública. Entretanto, a inserção político-partidária entre aqueles que declararam participar de atividades de ação coletiva é de apenas 3,9%. Para eles, a melhor forma de lutar pelas suas demandas é por meio de agrupamentos voluntários.

O professor atribuiu esse resultado a uma tendência de esvaziamento das instâncias clássicas de participação. Os jovens vincularam o caminho institucional ao governo e às formas tradicionais de fazer política. "Eles fizeram críticas ferrenhas à imagem do político e à impossibilidade de serem ouvidos como sujeitos", conta Juarez Dayrell. Segundo ele, os jovens alegaram não encontrar espaços públicos nos quais possam negociar suas angústias individuais. "A esfera pública encontra-se reduzida, restando poucas alternativas de articulação das demandas individuais com ações coletivas", afirma.

Dayrell explica que o jovem refuta organizações partidárias, porque se sente mais um entre tantos outros e incapaz de controlar um espaço cujas regras são arbitradas pelo mundo adulto. Esta característica, no entanto, é menos marcante nos grupos voluntários, que também apresentam como vantagem a capacidade de gerar resultados mais imediatos, refletindo a tendência da cultura juvenil de viver o presente. "O trabalho voluntário também demanda solidariedade, um traço típico da cultura brasileira e, principalmente, das classes populares", esclarece.

A pesquisa nacional foi lançada em novembro e está disponível para cópia nas páginas eletrônicas do Ibase (www.ibase.org.br) e do Instituto Pólis (www.polis.org.br).

Raio X da participação

De cada 10 jovens da Região Metropolitana de Belo Horizonte, apenas dois estão engajados em ações coletivas. Igrejas e atividades culturais concentram mais de 70% dos jovens que exercem algum tipo de participação.

Atividades
%
Igreja

43,5

Cultura

27,1

Esporte

26,6

Comunidade

7,7

Político-partidária

3,9


Felipe Zig