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Nº 1611 - Ano 34
26.05.2008

A história que as árvores contam

Afonso Pena

Pesquisa resgata trajetória da arborização em Belo Horizonte

Glauciene Lara*

Não existe um ambiente natural intocado. Essa é a premissa que envolve a história ambiental, campo que estuda a interação dos homens com o ambiente. Para reunir os estudos da área, a Sociedade Latino-Americana e Caribenha de História Ambiental (Solcha) realiza seu 4º Simpósio, entre os dias 28 e 30 de maio, na UFMG.

Frente à expansão das metrópoles, a História Ambiental urbana discute os problemas do lixo, dos esgotos, da poluição dos rios e da arborização. Em mesa dedicada a este último tema, será apresentado o projeto Árvores da Cidade, coordenado pela professora Regina Horta, do departamento de História da UFMG. Seu objetivo é construir a história das políticas de arborização em Belo Horizonte, desde a criação da cidade, em 1897.

O projeto começou em 2006 a partir da observação da professora de como as pessoas se relacionam com as árvores. “A arborização ameniza a vida na cidade, tem valor estético, equilibra o calor, é fator de sobrevivência da fauna urbana. Mas há pessoas que usam as árvores como lixeiras”, observa Regina Horta. A relação com as árvores mudou de acordo com os acontecimentos que a cidade vivenciou ao longo das décadas. Por isso, é possível construir a história da capital mineira e dos seus habitantes sob a perspectiva das árvores da cidade. “Até porque Belo Horizonte é chamada de cidade jardim, desde a época da criação da cidade”, ressalta Regina Horta.

Na inauguração da capital, o modelo de cidade jardim importado da Europa foi adaptado aos ideais da república recém-fundada, sob a promessa de uma cidade higiênica, sombreada, de ampla qualidade de vida. Segundo a historiadora, o conceito é sempre retomado pelos governos municipais. “É uma construção frágil, porque, em alguns momentos, o discurso difere da prática de depredação de algumas ações da administração pública”, explica Regina Horta. De acordo com a professora, a identidade construída a partir dessa afirmação é reforçada pela população, pela imprensa e por escritores como Carlos Drummond de Andrade, Pedro Nava e Mário de Andrade.

As políticas públicas voltadas para a arborização não apresentam uma evolução linear. Mas existem paralelos possíveis entre essas políticas e os valores que predominam na sociedade em uma época. Nos anos 1950 e 60, a arborização passa a segundo plano em nome do desenvolvimentismo. A população adquire carros e as ruas são alargadas. Símbolos da cidade, os fícus da avenida Afonso Pena foram arrancados em 1962. O episódio foi estudado por Regina Horta, que procura construir a história da arborização por meio de temas. “O perigo de se construir uma história inteira é o de fazer generalizações que não dão conta da complexidade da questão”, avalia.

A professora também estudou as comemorações do Dia da Árvore ao longo do século 20 e a arborização dos campi da UFMG. A história das árvores da UFMG dará origem a um livro com textos de Regina Horta e de outros professores, além do agrônomo Geraldo Motta, responsável pela gestão das áreas verdes da Universidade. O trabalho será organizado pela vice-reitora Heloisa Starling e deverá ser lançado ainda este ano pela Editora UFMG.

A arborização é estudada sob o aspecto político. “A forma como os homens lidam com os elementos naturais está associada aos valores cultivados pela sociedade”, explica Regina. De acordo com a professora, é possível fazer uma associação entre o modo como as
pessoas se relacionam com as árvores – bens públicos – e a relação que mantêm com o mundo público. “O objetivo dos estudos é orientar políticas públicas, ajudar as pessoas a reparar o que existe em torno delas e a desejar uma cidade melhor do que a que temos hoje”, conclui a historiadora.

O grupo inicia o estudo da história dos quintais, um elemento rural dentro das cidades. “Quando menina morava no bairro Floresta. No meu quintal tinha um pé de mamão, um de goiaba, uma parreira”, lembra Regina. Posteriormente, os prédios passaram a ser construídos sem quintais, mas a tendência é retomá-los em edifícios sofisticados, que têm o bosque como promessa para a venda de apartamentos.

A pesquisa é financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e pela UFMG. Fapemig e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) financiam o Simpósio, também apoiado por vários setores da UFMG. Além de Regina Horta, participam dos estudos sobre a história da arborização de Belo Horizonte alunos de graduação, pós-graduação e o professor da Escola de Veterinária da UFMG e historiador José Newton Coelho Meneses.