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Nº 1702 - Ano 36
5.7.2010

Disparo certeiro

Estudo premiado nos Estados Unidos inova com técnica capaz de racionalizar o uso de alarmes industriais

Ana Maria Vieira

Um cão que a todo momento ladra não é o melhor guardião de uma propriedade. Essa é a regra também para os alarmes automáticos. Disparados sem necessidade, reduzem sua confiabilidade e distraem a atenção de operadores responsáveis por verificar anormalidades. Ainda que pareça uma conclusão óbvia, a tecnologia para esses sistemas sofre, em todo o mundo, com acionamentos desnecessários e em grande frequência. Não é um problema trivial. Especialmente a área industrial, a falta de solução mais eficiente cria vulnerabilidade financeira e riscos ambientais e sanitários para empresas e comunidades.

Leandro de Aguiar com o certificado do prêmio recebido nos Estados Unidos
Leandro de Aguiar(à esquerda) com o certificado do prêmio recebido nos Estados Unidos

“Sistemas de alarmes mal projetados ou com funcionamento inadequado já causaram grandes acidentes em plantas industriais ao redor do mundo, com prejuízos econômicos e perdas de vidas”, diz o engenheiro de computação Leandro Pfleger de Aguiar. Em fevereiro, ele defendeu dissertação sobre o tema junto ao programa de pós-graduação em Ciência da Computação (DCC) da UFMG.

Ele propõe nova técnica para identificar alarmes redundantes em modelagem que permite eliminar disparos desnecessários de sistemas instalados em quaisquer tipos de processos industriais. A tecnologia mais avançada para essa detecção, até então disponível, se destinava apenas a processos químicos e petroquímicos e apresentava várias deficiências.

“Tive a oportunidade de conviver com problemas reais do dia a dia da indústria e da automação, e percebi que as ferramentas para a descoberta dos alarmes redundantes são muito elementares, tornando o trabalho dos engenheiros complicado, pouco eficiente e custoso em termos de esforço e tempo”, explica Aguiar.

A observação ganha cores quando dissecada pelo pesquisador. Conforme registra em seu estudo, a norma internacional para gerenciamento de alarmes (EEMUA 191) estabelece que o número de disparos por dia que um indivíduo é capaz de processar não deve ultrapassar 144 alertas, em áreas como as de energia, petroquímica e óleo e gás. Na prática, esses números são maiores, dificultando a tarefa dos operadores de identificar e reagir a eventos relevantes.

No setor de energia, por exemplo, ocorrem, em média, 2 mil alarmes ao dia. Na petroquímica, 1,5 mil. E em indústrias de exploração de óleo e gás a média é de 1,2 mil acionamentos diários.

Prêmio

“Uma das maiores dificuldades neste processo é identificar, dentre arquivos e bases de dados contendo dezenas de milhares de registros diários, padrões que possam indicar alarmes desnecessários”, explica o pesquisador. A complexidade do problema ampliase quando se constata que os padrões a serem extraídos também estão intimamente associados ao tipo de ocorrências temporais que dependem de fatores presentes em processos industriais, como pressão e temperatura.

Para suprimir os alarmes repetidos indevidamente e sem relevância, Aguiar desenvolveu algoritmo capaz de detectar seus padrões de ocorrência, a partir de um banco de 250 mil registros, extraídos de base de dados de uma empresa mineradora. Aplicou então, de modo inovador, três técnicas combinadas: análise de correlação cruzada, mineração de sequências e mineração de regras de associação mínimas não redundantes. A mineração permite extrair, em grandes bases de dados, informações importantes em diversos contextos, esclarece Aguiar.

Pelo método proposto, a primeira etapa transforma os arquivos de logs dos sistemas de alarmes em listas de transações. Na segunda, a técnica identifica os padrões relacionados, informando um índice para a força desta relação. O pesquisador incluiu ainda visualização do processo, por meio de modelagem de redes complexas, propiciando avanços na interpretação dos resultados.

A qualidade do trabalho foi reconhecida internacionalmente, com o prêmio Best Paper, na 19th International Conference on Software Engineering and Data Engineering, realizada nos Estados Unidos, em junho. O artigo apresentado por Aguiar concorreu com outros 31 oriundos da Inglaterra, Alemanha, França, Índia e também dos EUA.

>Denominado Mining redundant industrial alarm occurrences with association rules extraction and complex networks modeling, o estudo, baseado na dissertação, teve coautoria dos professores do DCC Wagner Meira Jr. e Virgílio de Almeida – orientador de Aguiar no mestrado.

Aciona primeiro, pergunta depois

Os alarmes mais conhecidos do consumidor comum são os de proteção patrimonial, mas as aplicações críticas encontram-se nas indústrias. É por meio deles que essas empresas gerenciam, por exemplo, interrupções no fornecimento de energia e vazamentos de substâncias tóxicas ou inflamáveis. Quando mal configurados, emitem registros duplicados ou em cascata.

Com o advento dos modelos digitais, a tarefa de incluir alarmes nos sistemas foi facilitada. “Antigamente, para criar um novo alarme, era necessário instalar botoeiras e luzes em um painel elétrico. Com os sistemas informatizados, bastam mais linhas de código. Por isso, os engenheiros que programam os sistemas acabam instalando alarmes em excesso”, explica Leandro de Aguiar.

Ele lembra, ainda, que muitos eventos que normalmente não exigiriam intervenção, como a abertura e o fechamento de uma válvula ou a interrupção de sensores, são interpretados pelos engenheiros como situações de alarmes, pressupondo equivocadamente a necessidade da ação do operador. “Mas o melhor caminho é a elaboração e implantação de um projeto de gerenciamento de alarmes capaz de assegurar a racionalização de seu uso”, recomenda.