Busca no site da UFMG

Nº 1712 - Ano 37
27.9.2010


BAMBAS na academia

Batuque na Cozinha, programa da UFMG Educativa que toca e fala de samba, quer chegar ao interior de Minas

Itamar Rigueira Jr.

Chris Okamoto
Carlinhos Visual e Bobô da Cuíca: harmonia entre gerações

 

E o samba – quem diria, até alguns anos atrás? – chegou à universidade, para ficar. Um dos pioneiros da programação da rádio UFMG Educativa (104,5 FM), o Batuque na Cozinha comemora este mês, junto com a emissora, cinco anos de divulgação do samba autêntico, incluindo uma força especial para os compositores mineiros.

O programa é apresentado em perfeita harmonia e com muito bom humor por uma dupla que une gerações: o jovem instrumentista Bobô da Cuíca – nome artístico de Rafael Domingos de Oliveira – e o ex-músico da noite e atual produtor Carlinhos Visual.

Idealizado para dar ênfase à história do samba, o Batuque foi se tornando “mais musical”, na expressão de Bobô, até porque outros programas da emissora – como o Decantando a República e o Lá da Música – trabalham a partir de contextualizações diversas.

A permanência do programa é coerente com movimento percebido em Belo Horizonte a partir da década passada. “O samba passou a atingir outro público, universitário, de classe média, que se juntou ao pessoal dos morros para encher os bares em diferentes locais”, reflete Bobô da Cuíca, historiador formado na UFMG. “Candeia já disse, em Dia de graça: ‘Cante o samba na universidade’”, lembra, por sua vez, Carlinhos Visual. Criado na Favela da Serra (“na minha época ainda não era aglomerado”), ele está sempre pronto a ilustrar a conversa com trechos de samba.

Samba da terra

Exibido de segunda a sábado, entre 13h e 14h, o Batuque na Cozinha evita tendências como o que a dupla chama de “pagode comercial” para privilegiar o “samba de verdade”: partido alto, samba-enredo, de quadra, samba corrido. Ao fim de cada edição, Bobô apresenta uma música de acordo com temas como “a voz do compositor” (envolvendo autores pouco conhecidos como cantores), lançamentos e samba instrumental.

Os programas de sábado são dedicados exclusivamente ao samba produzido em Minas Gerais. Os apresentadores recebem um músico para conversar no estúdio e tocar ao vivo. “Um dos grandes objetivos do Batuque é fortalecer a cena autoral, contribuir para aumentar a autoestima dos compositores mineiros e vender nosso peixe”, revela Bobô, ele próprio autor de sambas e ex-integrante da banda Clã do Jabuti. Carlinhos Visual, responsável pela produção das entrevistas de sábado e pela divulgação da agenda diária do samba em Belo Horizonte, informa que eles têm arquivados CDs de muitos autores e intérpretes mineiros. “Recebemos aqui na rádio Gervásio Horta, Cabral, Fabinho do Terreiro e Irmãos Saraiva”, ele enumera.

Calangueado

Bobô da Cuíca acha difícil falar de uma clara identidade do atual samba mineiro, mas comenta que uma das marcas históricas do ritmo no estado é o “samba calangueado”. “O estilo do Martinho da Vila e do Almir Guineto tem um pé em Minas. E o Nei Lopes, sambista e pesquisador, já afirmou que o samba carioca deve muito ao calango mineiro, talvez porque morros como Salgueiro e Mangueira foram ocupados por muita gente de Minas Gerais”, conta o sambista e historiador, que utiliza sua experiência acadêmica para escolher repertório, avaliar artistas e pensar novos projetos.

Além de colaborar para unir diferentes grupos em torno do samba, Bobô da Cuíca e Carlinhos Visual querem agora levar o tema para mais longe. Com a imagem do Batuque consolidada – o que não se traduz em remuneração, eles trabalham apenas “pelo amor à camisa” –, os dois planejam espalhar a ideia pelo interior de Minas, por meio da transmissão por rádios comunitárias.

Bobô e Visual esperam patrocínio para o projeto, que contará com apoio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura. “Os recursos vão permitir desde um diagnóstico da receptividade do programa no interior até a realização de eventos caprichados de divulgação do samba em que poderemos pagar cachês aos músicos”, explica Bobô da Cuíca.