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Nº 1782 - Ano 38
2.7.2012

Sabor verde

Pesquisa da engenharia de produção constata que preparo artesanal de queijo e doce de leite causa menor impacto ambiental

Itamar Rigueira Jr.

Os consumidores que preferem alimentos produzidos de forma artesanal, nem que seja pela ideia associada de charme e bom gosto, têm mais um forte motivo para investir nesse hábito. Produtos típicos da culinária mineira, como o queijo minas e o doce de leite, preparados artesanalmente causam menor impacto ao meio ambiente que suas versões industriais.

A constatação foi feita em pesquisa de mestrado na área de engenharia de produção da UFMG. Por meio do método conhecido como Análise do Ciclo de Vida, Elbert Müller Nigri identificou e comparou as etapas de produção dos alimentos em estabelecimentos pequenos e tradicionais e nas grandes fábricas.

“Além de sua importância pela forte identificação com uma cultura regional, o queijo minas e o doce de leite são consumidos em volume cada vez maior, e as pessoas têm preocupação crescente com a escolha de produtos por critérios éticos e ecológicos”, afirma Nigri, justificando a opção pelo caminho da pesquisa. Ele acrescenta que estudos do gênero podem também contribuir para identificar oportunidades de melhorias relacionadas aos aspectos ambientais nas várias fases de um processo de produção.

Lenha de eucalipto

No caso do queijo minas, os dados coletados e processados por Elbert Nigri indicam que a maior vantagem da produção em pequena escala reside no gasto menor de energia, já que não há necessidade de pasteurização (o que exige aquecimento e resfriamento) do leite nem refrigeração para armazenamento de grandes quantidades, como acontece com a fabricação em larga escala. “O impacto do transporte, contrariando parte de nossas expectativas, é menos relevante que o da energia”, conta o pesquisador.

Ele informa também que não há diferença entre os modos artesanal e industrial quanto à etapa que gera maior impacto, a de produção do leite. Ela envolve fatores como desmatamento para formação de pasto, emissão de gás metano pelo gado, utilização intensiva de água e ração. O emprego de lenha por cooperativas, apesar de implicar desmatamento e emissão de CO2 e material particulado (que pode gerar doenças respiratórias), é menos impactante que o uso de óleo diesel ou energia elétrica – considerando todo o ciclo da escala produtiva do combustível – pela maioria das fábricas de grande porte. “Muitas cooperativas têm à disposição uma plantação de eucaliptos, ou que diminui o efeito desmatamento”, observa Elbert, acrescentando que outra vantagem do queijo artesanal é o aproveitamento do soro na alimentação de animais na propriedade onde o alimento é produzido – diversas indústrias descartam esse subproduto de forma inadequada, contaminando o ambiente.

O processo da fabricação do doce, por sua vez, não inclui a pasteurização do leite nem em grandes indústrias, já que fase de aquecimento posterior cumpre função similar. A diferença mais importante é que o doce feito em pequena escala usa em geral gás de cozinha, enquanto grandes fábricas preferem lenha. A superioridade do impacto ambiental gerado pelo doce industrializado se deve, principalmente, a diferenças entre gastos energéticos nas etapas de produção. O consumo de água também é menor no caso do doce artesanal, pois não há tantos equipamentos a serem lavados.

Software

Na graduação o grupo de pesquisa sobre análises do ciclo de vida realizou estudos qualitativos sobre produtos típicos mineiros, com o objetivo de informar o consumidor sobre o impacto desses produtos. “Como são alimentos conhecidos pelo processo peculiar de produção, baseado em conhecimentos e métodos tradicionais, pensamos então em comparar os impactos da produção artesanal com a industrial”, conta o professor Eduardo Romeiro Filho, do Departamento de Engenharia de Produção, coordenador do grupo de pesquisa e um dos orientadores do trabalho.

A preocupação da pesquisa de mestrado de Elbert Nigri foi ir a campo para quantificar os impactos dos processos ligados ao queijo minas e ao doce de leite. Para isso, foi obtida licença do software Simapro e quantificado o impacto ambiental gerado valendo-se do método Ecoindicator 99, que discrimina categorias como aquecimento global, extinção de recursos naturais renováveis e não renováveis e eutrofização (depósito na água de carga orgânica que causa redução de oxigênio e da população de peixes, entre outras consequências).

A equipe envolvida nas pesquisas defende a relevância de trabalhos como o de Elbert Nigri com base na necessidade de que se criem soluções técnicas e equipamentos para reduzir o impacto ambiental de processos nas pequenas e nas grandes fábricas. “Quanto mais se conhecem as diferenças entre os processos, melhor se pode interferir. De um lado, os grandes produtores podem adotar soluções inspiradas nos métodos artesanais e, de outro lado, os pequenos tendem a descobrir práticas mais eficientes, sem comprometer a qualidade e as características de processos tradicionais”, explica Eduardo Romeiro.

Dissertação: Análise comparativa do ciclo de vida de produtos alimentícios industriais e artesanais da culinária mineira
Autor: Elbert Müller Nigri
Orientador: Paulo Eustáquio de Faria
Co-orientadores: Eduardo Romeiro Filho e Sonia Denise Ferreira Rocha
Defesa:16 de fevereiro de 2012, no Programa de Pós-graduação em Engenharia de Produção