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Nº 1847 - Ano 40
02.12.2013

Voto comparado

Livro reúne pesquisadores de instituições ibero-americanas interessados em compreender comportamento do eleitor e comunicação política na América Latina

Itamar Rigueira Jr.

Democracias recentes, que vivem, cada uma a seu modo, processos de institucionalização no campo político-eleitoral – mas onde também não é difícil encontrar resquícios de comportamento autoritário, com lideranças neopopulistas e conduta permissiva à corrupção. A convicção de que os países da América Latina possuem cada vez mais características em comum motiva pesquisadores a deixar um pouco de lado as comparações com as realidades da Europa e dos Estados Unidos e inspirou a coletânea Comportamento eleitoral e comunicação política na América Latina: o eleitor latino-americano (Editora UFMG). A previsão é que a obra chegue às livrarias ainda este ano.

“Sentimos falta de um olhar que considere, na análise do caso brasileiro, as semelhanças e diferenças com relação aos latino-americanos. Até hoje, contamos com obras que abordam predominantemente processos históricos, ou preferem a comparação com as eleições na Europa, que tem democracias mais avançadas, e nos Estados Unidos, marcadas pelo bipartidarismo, e outras características institucionais e culturais distintas das nossas”, afirma a professora Helcimara Telles, do Departamento de Ciência Política (DCP) da UFMG, que organizou a obra junto com Alejandro Moreno, do Instituto Tecnológico Autônomo do México e presidente da World Association for Public Opinion Research (Wapor).

Para Helcimara Telles, este é um momento propício para se estudar a América Latina. Em geral, os governos deram um “giro para a esquerda” e estão mais preocupados com a justiça social. “Esta é uma fase de transição, em que políticas públicas reduzem a desigualdade e tiram parcelas significativas de eleitores da linha de miséria. Maior estabilidade reduz o peso econômico do voto e introduz novas pautas, de fundo político, na decisão do eleitor”, ela explica.

Para refletir sobre uma questão crucial – existe um novo comportamento político na América Latina? –, Mara Telles mirou, para elaborar o capítulo que assina no livro – em coautoria com Pedro Mundim (UFG) e Nayla Lopes (mestranda em Ciência Política da UFMG) –, o universo dos perdedores nas últimas eleições presidenciais brasileiras. “Nada menos que 40 milhões de eleitores ficaram fora da polarização natural entre Serra e Dilma. Esses cidadãos avaliam positivamente o desempenho da economia, mas são bastante críticos com relação à política, e parecem possuir código de valores diferenciados. Além disso, aparecem condutas orientadas pela adesão a valores religiosos pentecostais”, avalia a organizadora do volume.

Passo importante

O livro reúne 19 autores vinculados a instituições localizadas em seis países ibero-americanos, o que permite cobrir parte da diversidade institucional, metodológica e teórica dos estudos sobre voto e comunicação política na América Latina. Os autores, que fazem análises com foco no continente ou se debruçam sobre os casos de Brasil, Chile, Argentina, Venezuela, México e Portugal – “em alguns aspectos Portugal está mais próximo de nós que do restante da Europa”, justifica a professora –, foram reunidos por iniciativa do Grupo de Pesquisa Comunicação Política e Comportamento Eleitoral, vinculado à Associação Latino-americana de Ciência Política (Alacip).

Ainda que tenha contado com fontes comuns, como o Latino Barômetro e o Barômetro das Américas, a produção do volume careceu, como reconhecem os organizadores em seu texto de apresentação, de maior unidade na coleta de dados e de integração conceitual e empírica. “Mas é um primeiro e importante passo no estudo do eleitor latino-americano”, ressalta o mesmo texto.

Comportamento político-eleitoral é o tema dos primeiros oito capítulos do livro, com a inclusão do caso da Venezuela, país que chama a atenção dos analistas em função do recente fenômeno do “chavismo”; a segunda parte é dedicada à comunicação política e às novas tecnologias da informação. “No cenário latino-americano, em que os partidos têm pouca definição ideológica, a campanha eleitoral na TV tem grande relevância para estudos nesse campo”, comenta Helcimara Telles. Um dos textos trata do papel da mídia no processo que elegeu Fernando Collor de Mello; outro aborda as percepções do eleitor sobre os debates na televisão durante as eleições de 2002, que levaram Lula ao poder.

Casos de Brasil, México e Chile servem de pano de fundo para análises do uso de blogs e redes sociais. “O ambiente web é diferente do da televisão”, salienta Mara Telles. “É nas redes digitais que acontece a campanha negativa. Ali interage um público reduzido, mas que tem argumentos sofisticados, que não são usados apenas para persuadir, mas para desqualificar. Por isso, em um continente marcado por menor fidelidade a legendas, a internet conta muito mais. Temos que estar atentos à televisão, ainda relevante, e às redes sociais, que têm ampliado significativamente sua importância.”

Livro: Comportamento eleitoral e comunicação política na América Latina: o eleitor latino-americano
Organizado por Helcimara Telles e Alejandro Moreno
Editora UFMG