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Nº 1874 - Ano 40
01.09.2014

O desafio de regular

Papel das humanidades na proposição de limites éticos para as biotecnologias é tema de colóquio na Fafich

Luana Macieira

A biotecnologia geralmente é associada às engenharias, às ciências exatas e biológicas, campos responsáveis por estudos que resultam nas mais variadas aplicações para a agricultura, para a pecuária e para o próprio ser humano, visando ao melhoramento do corpo e da mente. Porém, um grupo de pesquisadores do Núcleo de Estudos do Pensamento Contemporâneo (NEPC), da Fafich, tem dedicado seus estudos à necessária relação das biotecnologias com as chamadas humanidades, incluindo o direito, a política, a sociologia, a antropologia e a filosofia.

“Sabemos que as novas tecnologias trazem benefícios para a humanidade, mas a aplicação de tudo que é novo pode trazer riscos e requer cuidados. As ciências humanas e sociais agem a partir do momento em que as biotecnologias demandam normatizações e políticas públicas para regulamentá-las, além de suscitarem questões filosóficas e éticas”, afirma o professor Ivan Domingues, do Departamento de Filosofia da Fafich, e coordenador do III Colóquio Internacional de Biotecnologias e Regulações: desafios contemporâneos, que será realizado de 2 a 4 de setembro, na Fafich.

O debate sobre a contribuição que as humanidades oferecem para a compreensão dos usos e aplicações das diferentes biotecnologias é justamente o principal objetivo do Colóquio, organizado pelo NEPC em parceria com o Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (IEAT), com apoio da Fapemig. “Temos muito a acrescentar quando discutimos as políticas públicas e as normas que regem a produção biotecnológica brasileira”, argumenta o professor. “A regulação tem de ser criada juntamente com a inovação, como ocorreu no caso das normas técnicas da aeronáutica e do controle dos voos. No passado, as descobertas não traziam questões éticas porque o homem inventava instrumentos e os utilizava como prolongamento de seu corpo, sem muita reflexão, apenas ajustando fins e meios”, acrescenta.

No entanto, as tecnologias geradas hoje exigem atenção redobrada, sustenta Domingues. “O melhoramento genético, por exemplo, é algo muito mais poderoso, podendo levar a mudanças profundas na compleição da humanidade, associadas às diferentes eugenias, que tanto terror causaram aos europeus na Segunda Guerra. Para garantir que sejam usadas para o bem, as tecnologias precisam estar regulamentadas, variando, no entanto, de calibre, de acordo com a maior ou menor necessidade de controle”, afirma.

Programação

As conferências, palestras e mesas-redondas que serão ministradas durante os três dias do evento estão estruturadas em três eixos: natureza e poderes do conhecimento tecnológico, risco e percepção pública da ciência e da tecnologia e implicações éticas das biotecnologias. “O primeiro eixo foca as interfaces e o diálogo das tecnologias com as ciências, considerando o modelo homem-máquina. O segundo engloba controvérsias, modalidades de controle e políticas públicas, e o terceiro, a regulação em bioética”, resume Ivan Domingues.

Uma das conferências de destaque é a Changing ideas of personhood: moral and legal implications, que será ministrada pelo pesquisador Tomasz Pietrzykowski, da Universidade da Silésia, na Polônia. Especialista em ética e direito na ciência contemporânea, o pesquisador polonês discorrerá sobre a interferência dos marcos regulatórios e a influência da filosofia e de outros campos das ciências humanas na produção científica mundial.

A questão da biotecnologia na produção de alimentos transgênicos será debatida pelo pesquisador Brian Wynne, da Universidade Lancaster (Reino Unido). Por meio da conferência Agricultural Biotechnologies primarily global risk, or global justice problems? Redefining the biosafety-risk framing of GMOs, ele vai abordar os principais riscos da produção de alimentos geneticamente modificados e a importância da produção desse tipo de alimento para a diminuição de injustiças sociais e combate à fome.

Segundo o Relatório Global divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, em 2013, o Brasil é o segundo maior produtor mundial de culturas geneticamente modificadas, atrás apenas dos Estados Unidos. “Produzimos grandes volumes de soja e milho transgênicos e até hoje as pessoas duvidam da segurança desses produtos. Discutir possíveis riscos para saúde e questões éticas concernentes à transmutação genética são essenciais. Além disso, o crescimento da produção agrícola pode levar alimentos às comunidades que sofrem escassez”, conclui o professor.

As inscrições para o III Colóquio Internacional de Biotecnologias e Regulações: desafios contemporâneos podem ser feitas pouco antes do evento, no auditório Professor Baesse, onde será realizado. Outras informações estão disponíveis na página eletrônica do colóquio: www.fafich.ufmg.br/nepc/site/.