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Nº 1886 - Ano 41
24.11.2014

Imagens da luta de um povo

Projeto de extensão da UFMG promove oficinas de cinema em aldeias Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul

Anna Luísa Silveira

O registro de imagens representa um trunfo importante na valorização da cultura indígena e da luta pela retomada de seus territórios tradicionais. Ciente da força das linguagens fotográfica e videográfica, um grupo de professores e alunos do curso de Comunicação Social da Fafich estruturou um programa de extensão – Imagem Canto e Palavra no território Guarani Kaiowá – que oferece oficinas de formação em cinema nos assentamentos dos povos Guarani e Kaiowá, próximos aos municípios de Dourados e Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul (MS).

O Programa é coordenado pela professora Luciana Oliveira, do Departamento de Comunicação Social da Fafich. Ela conta que a relação com os Guarani-Kaiowá começou em 2012, no 44º Festival de Inverno da UFMG, em Diamantina. “Recebemos um jovem aprendiz de xamã, Valmir Cabreira, e os Bro Mc’s, grupo de rap indígena. Foi lá que eles nos contaram as histórias do Mato Grosso do Sul, que a gente já sabia pela mídia. No entanto, ouvir relatos de pessoas que estão vivendo uma situação inacreditável de violação dos direitos humanos, de violência simbólica e física, teve para nós um papel transformador”, afirma Luciana.

Em 2013, também em Diamantina, o 45º Festival de Inverno voltou a contar com a participação dos Guarani-Kaiowá em um encontro de realizadores de cinema indígena. Segundo Luciana, a partir daí, a relação com a UFMG foi se consolidando e, no mesmo ano, surgiu a ideia de propor o programa de extensão. “Desde o início, a intenção era que nós, da UFMG, pudéssemos nos deslocar para lá e que eles também viessem para cá. Assim, conseguiríamos concretizar uma formação em audiovisual, colaborando para que os indígenas pudessem mostrar sua cultura e sua luta pela terra.”

Implantado ao longo deste ano, o Programa já realizou duas oficinas no primeiro semestre de 2014: uma sobre produção audiovisual com ênfase em formatos diversificados e outra sobre captação de recursos para organizações sociais. Neste segundo semestre, as atividades também estão divididas em dois módulos. O dever da palavra: produção audiovisual em cinema e blog propiciará a produção de filmes indígenas e a construção de um blog para a Assembleia Aty Guasu. A intenção é trabalhar a produção audiovisual como forma de elaboração de projetos de afirmação da autoestima dos Guarani-Kaiowá, de registro das práticas culturais e de geração de imagens com força política.

O segundo módulo – Resistência e luta política entre os Guarani-Kaiowá – tem o objetivo de estimular a reflexão sobre a histórica luta por visibilidade dos povos e a produção de material videográfico, sobre suas relações culturais e políticas com a terra. Os vídeos serão produzidos com base em imagens já captadas em Mato Grosso do Sul, Belo Horizonte e Brasília. “Temos muitas imagens geradas nos festivais no Mato Grosso e durante a estada das lideranças aqui. Elaboramos o projeto para dar conta desse acervo, tentando transformar o material em pequenos filmes para ampla divulgação na internet”, explica a coordenadora do projeto.

Desde a semana passada, estudantes da UFMG estão nos territórios habitados pelos Guarani-Kaiowá para, junto com os alunos indígenas, aprender a metodologia. Segundo a professora Luciana Oliveira, a ideia é que eles voltem de lá – onde permanecem até 20 de dezembro – com uma formação já consolidada e que os Guarani-Kaiowá estejam aptos a trabalhar sua autorrepresentação no cinema e na mídia. O projeto conta com três bolsistas de graduação da UFMG e mantém parcerias com a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), com a Associação Vídeo nas Aldeias (VNA), com a Associação Imagem Comunitária (AIC), com o Museu do Índio/Funai e com o Conselho Aty Guasu – Grande Assembleia dos Guarani-Kaiowá.

Balançar o chocalho

Neste semestre, Luciana Oliveira aproveitou para realizar um trabalho com os alunos da disciplina de graduação Laboratório de Planejamento em Comunicação, que teve como cliente o projeto de extensão Imagem Canto e Palavra no Território Guarani-Kaiowá. Eles realizaram incursão teórico-conceitual nos campos da comunicação e da relação da sociedade brasileira com os povos indígenas. A imersão resultou em um plano de comunicação direcionado às necessidades do Programa. “Percebemos que isso seria importante dentro da UFMG, porque hoje temos muitos alunos indígenas.

Ao mesmo tempo, existe muito desconhecimento dessa inserção. Apresentei a proposta, e os alunos se mostraram muitos envolvidos no processo”, afirma a professora do Departamento de Comunicação.

A identidade visual proposta pelos alunos é baseada no M’Baraká, espécie de chocalho utilizado pelos povos indígenas. O instrumento representa o universo e, quando balançado em rituais, significa que o mundo está sendo reorganizado, segundo a cosmovisão Guarani-Kaiowá. “Procuramos balançar o chocalho dentro da Universidade para que as coisas se rearranjem e possamos ter uma pluralidade de conhecimentos compatível com a pluralidade de pessoas que aqui convivem”, conclui Luciana Oliveira.