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Nº 1888 - Ano 41
08.12.2014
Ewerton Martins Ribeiro
Quando este semestre começou, o fotógrafo e cientista político Wesley Matheus permitiu-se um período sabático no mestrado que cursa no Departamento de Ciência Política (DCP) da Fafich. Ele pretendia realizar um antigo desejo: percorrer cidades latino-americanas fotografando “os diálogos silenciosos que atravessam a existência na vida das cidades”.
Wesley passou os meses de julho e agosto em trânsito pelo continente: percorreu 16 mil quilômetros em cinco países e fotografou 11 cidades. O resultado está reunido em Cidade de papirus, obra fotopoética que se dedica a inscrições feitas em monumentos públicos, como pichações e grafites.
Wesley empreendeu seu projeto em diálogo com os estudos que realiza no mestrado. “Para o estabelecimento de uma vida compartilhada, a conversação é necessária. No entanto, nas cidades, o desejo de conversar implica disputar espaço com o barulho dos caminhões e das buzinas, implica ir contra os fones de ouvido”, diz. A comunicação, nesse sentido, sugere o autor, surge em última instância como ato de resistência.
Na leitura de Wesley, diante da dificuldade de propiciar os diálogos pela via sonora, a cidade também se oferece como papiro receptivo a inscrições – e que, por sua natureza, comunicam de forma particular. Em contrapartida, essas inscrições revelam o quão áspera é a interlocução no espaço urbano. “Não é fácil escrever na cidade como o é no papel. Essa ‘dureza’ ilustra a aspereza das interações corriqueiras”, diz. “Nas cidades, além dos ouvidos, os olhos são porta de entrada para as conversações.
No posfácio, Ricardo Fabrino Mendonça, professor do DCP, defende que a fotografia repolitiza o passado, jogando “novas luzes sobre o visível e o invisível” e ressignificando o comum da cidade numa nova percepção desse espaço partilhado. “Política e cidade são termos essencialmente relacionados. É justamente na sua visibilidade que cidade e política se reinventam. A fotografia possibilita à cidade gritar politicamente”, diz. “Ou, pelo menos, dá-lhe nova chance para que seus gritos sejam ouvidos”, provoca.
Cidade de papirus reúne 43 fotografias, todas em preto e branco, realizadas em cidades de Argentina, Bolívia, Brasil, Chile e Peru. No entanto, suas imagens sugerem uma curiosa unidade latino-americana: é como se, de alguma forma, algo fosse dito pelas cidades em uníssono.