Intervenção Teatro&Cidade celebra artesanato e cultural local na primeira semana de dezembro

 

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Embalados por acordes de sanfona, os floristas passeiam delicadamente pelas ruas e praças da cidade de Tiradentes, criando os mais diferentes arranjos de cores e de formas. Já Dona Juta brinca desembestada pela cidade, dando notícia de tudo que se passa ao seu redor de maneira tão absurda quanto a realidade que nos cerca. As intervenções Os Floristas e Dona Juta são as mais novas criações do Teatro&Cidade – Núcleo de Pesquisa Cênica do Teatro Universitário da UFMG.

Durante o segundo semestre de 2018, uma equipe coordenada pelos professores Rogério Lopes e Tereza Bruzzi percorreu boa parte das ruas de nove bairros da cidade, realizando experimentos criativos que resultaram nas duas intervenções teatrais. O diálogo com elementos do artesanato tradicional da região do campo das vertentes em Minas Gerais, como a cestaria, a tecelagem manual e a fibra de juta, foi o ponto de partida dessas criações, cuja temporada de estreia ocorrerá entre os dias 27 de novembro e 9 de dezembro em Tiradentes e São João Del Rey.

As intervenções são resultado de um dos projetos selecionados pelo Programa Professor Residente no Campus Cultural UFMG em Tiradentes, da Diretoria de Ação Cultural da UFMG (DAC).

Artesanato como fio condutor

O artesanato, para muitas cidades do interior do Brasil, tem historicamente papel de destaque, seja como fonte de renda ou como fortalecimento da cultura e de identidades locais. Se em alguns contextos pode sofrer certa pasteurização e ter seu sentido esvaziado em função de demandas mercadológicas, em outras situações a produção artesanal pode se apresentar como locus de manutenção de técnicas e conhecimentos muitas vezes ancestrais. Como é o caso da cestaria e da tecelagem, encontradas em Tiradentes e nas cidades ao seu redor, notadamente em Resende Costa.

A tecelagem manual fora, em tempos não muito remotos, uma importante atividade econômica de Tiradentes e região, mantendo-se presente na economia local. Bem como os cestos, que guardam uma forte herança indígena. Já a fibra de juta é frequentemente utilizada no artesanato da cidade. Foi por isso que, dentre os inúmeros itens do artesanato desta região, a cestaria, a tecelagem e a fibra de juta foram escolhidos como material de trabalho criativo para a produção de Os Floristas e Dona Juta.

Criadas em parceria com o Barração UFMG, núcleo de pesquisa em cenografia e outras práticas cênicas espaciais, as intervenções partem da pesquisa desses produtos artesanais, promovendo o deslocamento do seu uso original ao transformar colchas em indumentária e a fibra de juta e a cestaria em máscaras. Somado a esses elementos, juntaram-se paninhos de bandeja portugueses, porta-copos mexicanos e aventais ingleses – coletados pelo grupo em viagens – que ajudaram a compor uma caracterização que coloca em diálogo elementos do artesanato regional e internacional.

Dar foco ao artesanato foi uma das formas encontradas pela equipe de criação para abordar a relação entre a cidade, o patrimônio cultural e o turismo a partir de uma perspectiva teatral. Os artistas do Teatro&Cidade, oriundos de Belo Horizonte, ao entrarem em contato com a realidade local de Tiradentes, encontraram um Centro Histórico tomado pelas atividades ligadas ao turismo que, se por um lado, garantiram a revitalização da cidade, por outro, acabaram fazendo com que os moradores nativos fossem cada vez mais empurrados para habitações localizadas na periferia da mesma. O artesanato foi percebido como um ponto de interseção entre turistas e tiradentinos por ser onde o turista pode não só ter contato com o potencial criativo dos artesãos, como acabam por levar consigo parte deste universo local ao adquirir uma das peças das mais variadas lojas espalhadas pela cidade.
Um convívio criativo

O fato de o processo de criação ter se dado na rua foi outra maneira de favorecer a relação com a cidade, pois fez com que a população local pudesse ter contato com os criadores desde o início, já que a maior parte dos ensaios fora realizada nas ruas dos diferentes bairros de Tiradentes. Isso fez com que Os Floristas e Dona Juta sejam intervenções que dialoguem com um espectro de público amplo, atingindo desde crianças a adultos, numa articulação entre os visuais coloridos dos figurinos com a musicalidade da sanfona e de pequenos objetos percussivos, viabilizando sua adaptação para os mais variados espaços de diferentes cidades.

Agora, na temporada de estreia, serão distribuídos cartões postais em que os personagens das intervenções aparecem fotografados nos mais diversos bairros da cidade, buscando valorizar e dar a conhecer outros aspectos e paisagens de Tiradentes pouco conhecidos pelos turistas.
Residência teatral em Tiradentes

Os Floristas e Dona Juta são realizações do Teatro&Cidade – Núcleo de Pesquisa Cênica do TU, coordenado pelo professor Rogério Lopes, que elaborou e propôs o projeto Aqui Nesta Casa Chega: Residência Teatral na Cidade de Tiradentes, aprovado numa chamada pública da Diretoria de Ação Cultural para ser realizado no Campus Cultural UFMG em Tiradentes. Essa é a segunda vez que Lopes, também ator e diretor de teatro, realiza uma residência teatral. A primeira vez se deu no bairro Lagoinha, em Belo Horizonte, no ano de 2011, com intervenções durante nove meses pelas ruas do bairro, o que resultou no espetáculo Naquele Bairro Encantado. Assim como outros trabalhos em repertório do Teatro&Cidade, como a Trilogia Andarilha, a principal característica do trabalho do grupo é o desenvolvimento de processos abertos na presença da comunidade dos locais escolhidos para o desenvolvimento de suas criações.

Este projeto de residência contou ainda com a colaboração do Barracão UFMG que, por meio da professora Tereza Bruzzi, foi responsável pelo figurino e por objetos cênicos. Houve também a parceria com o projeto TU: Produção e Memória que, sob a coordenação do técnico administrativo Jefferson Góes, realizou com uma equipe de bolsistas o registro de fotografia e vídeo e a programação visual. A atuação ficou a cargo de estagiários oriundos da graduação e do mestrado da UFSJ, das áreas de teatro e da música. Houve também a colaboração do professor Carlos Falci, da Escola de Belas Artes, outro residente do Campus Cultural UFMG em Tiradentes, por meio de depoimentos de moradores e registros fotográficos realizados pela equipe do projeto Lugares Imaginários.