REVISTA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Ano 12 - Número 20 - abril de 2013

tendência

Fluxo em várias direções

Internacionalização se consolida como traço da cultura acadêmica da UFMG; cresce o número de estrangeiros que fazem da Instituição o seu destino

ANA RITA ARAÚJO

Quando as Nações Unidas decidiram apoiar a realização do censo demográfico na república africana de Guiné-Bissau, em 2011, contaram com a ajuda do único demógrafo do país, Bessa Vítor da Silva, que havia concluído mestrado no mais antigo programa brasileiro de pós-graduação em Demografia. A formação de Bessa na Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG só fora possível porque quatro décadas antes um jovem docente havia feito movimento similar, ao buscar novos conhecimentos em outro continente. “Ao seguir para a Universidade de Londres, em 1971, tinha uma missão – com a minha volta se introduziria, no nosso recém-criado Programa de Pós-graduação em Economia Regional, a concentração em demografia econômica”, relembra hoje o professor emérito da UFMG José Alberto Magno de Carvalho.

O caminho percorrido por Carvalho foi comum a toda uma geração de pesquisadores, que sentia a necessidade de trazer para o Brasil elementos que contribuíssem para a criação de um novo patamar de formação acadêmica. “De modo geral, não havia doutorados no país”, rememora Carvalho, que é diretor executivo do Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead). “A partir da minha volta, outros colegas foram para o exterior, e assim começamos o programa com internacionalização, não porque tivéssemos um grande projeto, mas por falta de opção. Aquele era o único caminho possível”, conta o ex-diretor da Face.

Contudo, se a internacionalização começou como via de mão única, hoje possui várias direções, algumas das quais apontam o Brasil como destino até mesmo quando se trata de atividades de pós-doutoramento. O diretor de Relações Internacionais da UFMG, professor Eduardo Vargas, destaca outro forte aspecto desse processo, ao comentar que parte significativa da trajetória das principais instituições de ensino superior brasileiras é marcada pela presença de estrangeiros, a exemplo da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), criadas em torno de missões francesas. “Na história da UFMG, a presença de professores estrangeiros, de passagem ou por longos períodos, é recorrente”, comenta Vargas.

Alto rendimento

Foram justamente a chegada e a permanência de um estrangeiro, o polonês Leszek Antoni Szmuchrowski, seguido após alguns anos por colegas alemães e argentinos, que fizeram florescer o Departamento de Esportes da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Com a instalação do Centro de Excelência Esportiva (Cenesp), o grupo também deu importantes contribuições ao Ministério dos Esportes e ao Comitê Olímpico Brasileiro (COB), em áreas como psicologia do esporte, biomecânica e fisiologia.

Treinador das equipes olímpicas e da seleção nacional polonesa, com mestrado em esporte de alto rendimento, Leszek chegou a São Paulo em 1983, a convite de atletas brasileiros. No ano seguinte, iniciava na UFMG o trabalho como professor visitante do Departamento de Esportes, onde montou laboratório de referência nacional. Sua decisão de retornar ao país de origem, sete anos depois, para fazer doutorado, gerou estresse na Escola. “Muitos não acreditavam que eu voltaria para Belo Horizonte”, lembra.

Segundo ele, embora o futebol seja uma área profissional, e não essencialmente acadêmica, sua pesquisa serviu para dar projeção internacional à Escola, o que resultou em muitos financiamentos e projetos. Sua viagem abriu caminho para que outros professores da UFMG buscassem pós-graduação na Polônia e para a consolidação do doutorado na Unidade. “Hoje temos linha de pesquisa em ciências do treinamento esportivo, mundialmente reconhecida, com grande número de publicações. Só em 2012 tivemos artigos publicados em seis revistas A1, que são de alto impacto”, aponta. Outro estrangeiro que veio para ficar e cuja contribuição à ciência ultrapassou os muros da UFMG é o arqueólogo francês André Prous, como destaca Eduardo Vargas, professor do Departamento de Sociologia e Antropologia. “Ele fundou a arqueologia na UFMG e é referência internacional em arqueologia brasileira”, aponta.

‘At home’

Ao longo dos anos, o doutorado em instituições estrangeiras deixou de ser a única opção, o que, segundo Vargas, resulta de um movimento natural, uma vez que, ao retornar ao Brasil, muitos doutores contribuíram para consolidar a pós-graduação no país. “Boa parte desse fluxo mudou, inclusive porque os recursos para a realização de doutorado pleno no exterior caíram tremendamente, em favor de uma destinação brasileira”, explica. Isso não significa que a internacionalização tenha perdido força – o doutorado pleno no exterior foi substituído pelas modalidades de doutorado-sanduíche, pós-doutorado e outras mobilidades do tipo sênior, que contribuíram para aumentar significativamente o número de pesquisadores brasileiros em contato com instituições de todo o mundo.

“Tenho percebido ultimamente uma aceleração nesse processo. Hoje está se formando uma consciência institucional sobre a importância da internacionalização, até porque, nesse mundo globalizado, qualquer que seja a área, mesmo com excelência, um programa não pode se tornar uma ilha”, avalia José Alberto Magno de Carvalho. Se, durante certo período, a intenção era buscar no exterior competências indispensáveis para a implantação de cursos e programas, hoje o objetivo é fortalecer as iniciativas locais, evitar a endogenia e ampliar a formação, desde o período de graduação. Eduardo Vargas ressalta que a cooperação com instituições estrangeiras também ajuda a pôr em contraste os modelos de educação, e revelar que existem outras formas de lidar com as mesmas situações em outros lugares, pois “a interação com a diferença enriquece, quer destacando os pontos em que somos fortes, quer fazendo sobressair as fraquezas que temos que enfrentar”.

O diretor de Relações Internacionais comenta que, com as novas tecnologias de comunicação e a maior circulação de conhecimento, cresceram as possibilidades não só de manter a conexão com o que acontece no exterior, mas também de interagir e realizar trabalhos conjuntos com grupos de pesquisa de diversos países. “Há um aumento significativo na interação de brasileiros e estrangeiros através da pesquisa e da pós-graduação, que passa pela mobilidade de professores e estudantes, mas que não se restringe a ela”, atesta. No modo tradicional de intercâmbio, alunos ou professores em viagem participam de cursos, estágios, seminários, congressos e outras atividades internacionais. “Há também a chamada internacionalização at home, que é a nossa capacidade de atrair estrangeiros, o que é muito importante e dá um caráter mais cosmopolita ao campus”, informa Vargas. Na terceira via, há circulação de informações independentemente de viagens, já que a instantaneidade das comunicações e a formação de redes internacionais de pesquisa têm fortalecido outras formas de cooperação, que não pressupõem, necessariamente, o deslocamento do pesquisador para outros países.

“A UFMG tem demandado e sido bastante demandada para esse tipo de intercâmbio, porque é crescente sua visibilidade como parceira potencial ou real”, analisa o professor. Ele comenta que a instituição possui vários centros de produção de conhecimento de ponta com reconhecimento mundial, além de grande porcentagem de programas de pós-graduação com conceitos 6 e 7 – no triênio 2007-2009, foram analisados 67 programas da UFMG, dos quais 22 alcançaram o nível de excelência internacional. Tais fatores, em sua opinião, contribuíram para torná-la polo de atração de pesquisadores de diferentes países, sobretudo da América Latina e da África, mas também da Índia e de países europeus e da América do Norte.

Para José Alberto Magno de Carvalho, o papel relevante da UFMG no cenário mundial pode ser constatado tanto na chamada relação Sul-Sul, com formação de estudantes de países em desenvolvimento, quanto na forte presença de seus docentes em pesquisas realizadas em escala global. Um exemplo dessa cooperação entre pares, segundo Carvalho, é a participação dos professores Cássio Turra, Bernardo Queiroz e Eduardo Rios-Neto, da Face, no projeto Population aging and the generational economy – a global perspective, coordenado pela Universidade de Berkeley (EUA). A pesquisa discute transferência intergeracional de renda, em países de todos os continentes, sobretudo diante do fenômeno de envelhecimento das populações, e pretende dar contribuições para políticas sociais e econômicas mundiais. Outro aspecto que compõe o abrangente conceito de internacionalização é a presença em congressos, sociedades e entidades internacionais que têm repercussão local e global, a exemplo da União Internacional para o Estudo Científico da População, com sede em Paris, da qual Carvalho já foi presidente.

Parcerias internacionais relevantes e de longo prazo em geral começam quando docentes brasileiros realizaram pós-doutorado no exterior e, de volta aos seus departamentos e programas, passam a colaborar de forma regular com seus antigos orientadores ou colegas estrangeiros. Foi o que ocorreu no Instituto de Ciências Exatas (Icex) com relação à professora Mildred Dresselhaus, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, primeira mulher a receber o título Doutor Honoris Causa na UFMG, em solenidade realizada em dezembro último. Em 1997, o professor Marcos Pimenta, do Departamento de Física, passou um ano sabático no MIT, onde Dresselhaus o apresentou à física dos nanotubos de carbono. “Este foi o início do empreendimento que culminou no INCT de Nanoestruturas de Carbono, sediado na UFMG, e no atual Projeto do CT-Nanotubos”, comenta o professor Ado Jorio, do mesmo departamento, que foi orientado por Dresselhaus em seu pós-doutorado. Segundo ele, a física norte-americana já escreveu em torno de cem artigos em coautoria com pesquisadores da UFMG. “Ela teve grande papel na internacionalização da ciência desenvolvida nesta Universidade”, conclui Jorio.

Chegadas e partidas

Se a busca por doutorado-sanduíche e outras formas de mobilidade relacionadas à pós-graduação ocorre, sobretudo, por iniciativa dos pesquisadores, o papel das universidades é imprescindível no que se refere à internacionalização da graduação. Na UFMG, a Diretoria de Relações Internacionais (DRI) tem investido em convênios com instituições públicas e privadas, ampliando significativamente o número de alunos no exterior e de estrangeiros em suas salas de aula.

“Não há um modelo único de internacionalização, mas no mundo de hoje não se pode ficar fechado em pequenos núcleos. É preciso circular, transitar, inclusive para se ter elementos de comparabilidade, e isso é muito dinâmico”, pondera Eduardo Vargas. Ele comenta que, se há alguns anos o intercâmbio durante a graduação estava reservado a uma elite diminuta, hoje faz parte da realidade de crescente número de jovens. Ao programa Ciência sem Fronteiras lançado pelo governo federal, somam-se as iniciativas próprias da UFMG, com destaque para o Programa Minas Mundi, que oferece vagas de mobilidade em mais de 20 países a cada ano. Vargas diz que iniciativas do gênero têm tornado a mobilidade internacional mais regular e acessível, embora os números aqui ainda sejam bastante modestos se comparados com instituições de classe mundial.

Enquanto há universidades em países desenvolvidos que adotam como critério que cada aluno passe pelo menos um semestre letivo em instituição de outro país, no Brasil a maior marca é a da USP, que oferece intercâmbio a 3% dos seus alunos de graduação. Embora esteja à frente das outras instituições federais, a UFMG alcança pouco mais de 1% do seu corpo discente com ações regulares de mobilidade internacional. Em 2012, ofereceu pelo programa Minas Mundi 400 vagas, cerca de metade com bolsa concedida pela Universidade. Para 2013, a oferta é de 622 bolsas. Já o Ciência sem Fronteiras levou 298 estudantes de graduação da UFMG para o exterior em 2012.

Há outras modalidades de intercâmbio de alunos de graduação, como o Escala Estudantil, da Associação de Universidades do Grupo Montevideo (AUGM), que permitiu o trânsito, em 2012, de quase 40 estudantes entre a UFMG e mais de uma dúzia de diferentes universidades do Mercosul; e o Programa de Licenciaturas Internacionais (PLI) da Capes, que há três anos tem levado alunos para Portugal e estuda a ampliação para outros países europeus – atualmente 36 alunos da UFMG realizam metade de seus cursos de graduação com bolsas da Capes em diferentes universidades portuguesas. Existem também editais específicos, a exemplo dos lançados pelo Santander, como o Top USA, que visa incentivar o desenvolvimento de pesquisas científicas e parcerias entre pesquisadores de ponta de universidades brasileiras e norte-americanas.

Selecionada no Top USA 2012, a doutoranda de Medicina Luisa Campos Caldeira Brant está desenvovendo, na Universidade de Boston, análise comparativa entre o Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto (Elsa) e o The Framingham Heart Study. O Elsa avalia a saúde de 15 mil brasileiros em busca dos determinantes das doenças cardiovasculares e metabólicas. Já o Framingham, iniciado em 1948, é o mais importante estudo epidemiológico cardiovascular de todos os tempos, na opinião do professor Antonio Luiz Pinho Ribeiro, do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina.

Diretor geral do Hospital das Clínicas e um dos orientadores de Luisa Brant, Antonio Ribeiro comenta que a internacionalização “é fundamental para que a UFMG alcance a excelência, porque permite a troca de experiências entre pesquisadores, o aprendizado de métodos e técnicas e a comparação de resultados”. Luisa Brant afirma que, além dos resultados que a comparação entre os estudos vai trazer, a experiência com o intercâmbio é uma oportunidade ímpar para estabelecer contatos e futuras parcerias com pesquisadores de uma instituição tradicional e renomada, como a Boston University. Para Ribeiro, isso dá uma nova dimensão à sua pesquisa de doutorado: o convênio Top USA tem a vantagem adicional de permitir a visita da equipe dos Estados Unidos ao Brasil. Em maio deste ano, o Elsa receberá pesquisadores de Boston.

Além de enviar alunos para o exterior, a UFMG mantém programas para intercambistas estrangeiros, em parceria com o Ministério das Relações Exteriores, que têm trazido regularmente às suas salas de aula, sobretudo, estudantes africanos e latino-americanos. Atualmente, 92 alunos, de 15 diferentes nacionalidades, estão na UFMG realizando integralmente seus cursos. Abdelasy de Sousa, 30 anos, veio de São Tomé e Príncipe, em 2005, fez sua graduação em Comunicação Social – habilitação jornalismo, e antes de retornar ao seu país, onde trabalha em uma rádio estatal, pretende fazer mestrado em Ciência Política. “Qualquer pessoa que se ausenta do seu país muda sua visão, adquire outros olhares”, diz ele. A maior mudança para Abdelasy talvez tenha sido pensar na perspectiva de dar aula, em paralelo com suas atividades jornalísticas. Há também alunos estrangeiros que vêm realizar intercâmbio de seis meses ou um ano em cursos de graduação e que hoje somam uma centena e meia nos campi da Universidade.

Com relação à estrutura oferecida pela UFMG, Abdelasy de Sousa observa que as grades curriculares deveriam incluir línguas estrangeiras. “Sem isso, esta Universidade vai perder alunos de fora”, adverte. A barreira da língua é, de fato, um dos gargalos da internacionalização, concorda Eduardo Vargas, ao citar Portugal como o destino mais procurado pelos alunos brasileiros que concorrem a bolsas de intercâmbio. “A proficiência em línguas é um problema, até menos dramático hoje do que há duas décadas, mas continua sendo um dos fatores a dificultar a internacionalização”, informa. Segundo ele, o próprio governo federal já percebeu que precisa investir nessa área, por causa do Ciência sem Fronteiras. “Mas a UFMG não está parada”, garante Vargas. Entre as iniciativas implementadas pela instituição para minimizar o impacto desse fator, ele destaca a parceria estabelecida entre a Diretoria de Relações Internacionais (DRI) e a Faculdade de Letras que resultou na criação de disciplinas de Inglês para fins acadêmicos que, no segundo semestre de 2012, atenderam 300 alunos de graduação interessados em realizar intercâmbio no exterior. Para 2013 espera-se a ampliação da oferta de vagas e a inclusão de outras línguas, como francês e espanhol.

Thalita Rodrigues, 24, graduada em Psicologia, é parte da maioria que escolhe Portugal como destino. Embora estudasse inglês e francês desde o início da graduação, no momento em que se inscreveu no programa não se sentia segura para tentar país com outra língua, relata. Em 2010 fez um semestre letivo na cidade de Braga, com disciplinas que não constavam na sua grade curricular, conheceu outros países da Europa e agora, de volta à UFMG, acaba de ser aprovada para o mestrado em Psicologia. Assistida pela Fundação Universitária Mendes Pimentel, Thalita conta que colegas que moram com os pais valorizam muito, no intercâmbio, a experiência de independência. “Como passei a graduação na moradia estudantil, longe da família, valorizo mais outras estratégias de socialização. Busquei principalmente o ganho acadêmico, mas também procurei conhecer outras culturas, um pouco mais da história do mundo, pontos turísticos e museus”, conta. Além disso, considera um dos principais ganhos com a experiência a expansão de horizontes para sua família e amigos. “Isso porque, para eles, até então, estudar em uma universidade federal ou fora do país era algo impensável e inacessível”, justifica.

Dentro do grupo que tem o Brasil como destino, cresce o número dos que vêm para cursos de doutorado e pós-doutoramento, assegura a professora Andrea Mara Macedo, coordenadora do Núcleo de Pós-graduação do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), que reúne 12 programas, metade dos quais com conceitos 6 ou 7. A maior parte ainda é da América Latina, principalmente devido ao idioma, mas tem aumentado o número de pedidos de inscrição de pessoas da França, da Inglaterra, de países africanos e asiáticos, informa a professora, que atribui a procura à qualidade da pesquisa brasileira – que tem recebido mais investimentos, o que se reflete no número de publicações. “O Brasil passou a ser um lugar que as pessoas consideram ao procurar qualificação de alto nível”, pondera, ao informar que o fluxo de estrangeiros levou a pós-graduação do ICB a introduzir disciplinas e seminários em língua inglesa, de modo a atender o novo público, ao mesmo tempo em que treina os alunos brasileiros para falar, ouvir e escrever em uma segunda língua.

Apoio e trabalho

Ao ver as dezenas de estudantes africanos e latino-americanos no campus, a preocupação do professor Magno de Carvalho é de certificar-se se de que esses jovens recebem o necessário apoio para ter o melhor rendimento. “Eles sofrem uma pressão terrível: chegam soltos, em uma cultura diferente, longe da família, com problemas de sobrevivência. Precisam de recepção, orientação, moradia, adaptação, facilidades”, enumera Carvalho, contando com orgulho que todos os 20 africanos que passaram pela pós-graduação em Demografia do Cedeplar retornaram aos seus países com dissertações e teses defendidas.

Já Daniela Junqueira, que fez doutorado-sanduíche na área de Farmácia na Universidade de Sidney (Austrália), aponta a necessidade de maior apoio para a inserção profissional dos estudantes que, como ela, recebem estímulo para formação altamente especializada, seja no Brasil ou no exterior. “Até fui convidada para fazer pós-doutorado na Austrália, mas tenho uma bagagem que gostaria de utilizar para dar retorno ao meu país”, pondera. Daniela é parte do contingente brasileiro de doutores, que cresceu mais de oito vezes nas duas últimas décadas. Em tese defendida este ano na Universidade de Brasília, o coordenador geral de Programas Estratégicos da Capes, Manoel Santana Cardoso, demonstrou que em 1990 o país contava com 1.410 doutores, número que saltou para 12.217 em 2011.

A inserção desse universo no mercado de trabalho tem sido facilitada, segundo Rafael Polidoro, presidente da Associação de Pós-graduandos na UFMG, pela política de expansão das universidades, que absorvem a maior parte dos novos doutores e pós-doutores. Contudo, Polidoro defende mais investimento em programas voltados para jovens pesquisadores e o aumento dos recursos dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), que formam redes de colaboração e também precisam dessa mão de obra especializada. Ele também sugere o estímulo à formação de parques tecnológicos, como o BH-Tec. “Em Oxford e Harvard, que estão entre as mais bem conceituadas no mundo em aplicação de conhecimento, existem mais de 20 centros industriais que contratam os doutores jovens e aplicam conhecimentos que muitas vezes ficam apenas nas bibliotecas e pouco servem à sociedade”, compara. Polidoro também relembra que, embora o governo tenha prometido que o Ciência sem Fronteiras não teria impacto no investimento do Ministério de Ciência e Tecnologia, os recursos aplicados em pesquisa e nos INCTs caíram drasticamente”. Para Polidoro, sem o investimento maciço em pesquisa no Brasil, “seremos exportadores de recursos humanos especializados que não voltarão ao país caso não haja vagas nem boas condições para pesquisa de qualidade”.

Diplomacia acadêmica

Lançado em novembro passado, o Centro de Estudos Africanos da UFMG abre caminho para o fortalecimento da cooperação acadêmica com instituições daquele continente, ao mesmo tempo em que inaugura uma série de iniciativas de internacionalização da Universidade. Nos próximos meses, serão lançados centros de natureza semelhante dedicados à Europa, América Latina, China e Índia. Segundo Eduardo Vargas, outras duas medidas terão forte impacto no processo de internacionalização: a reestruturação da Diretoria de Relações Internacionais e a construção de um novo prédio que vai abrigar, além da Diretoria e dos Centros de Estudos Internacionais, equipamentos como biblioteca especializada, laboratórios de proficiência linguística e espaços de convivência, de discussão e de exibição. “A ideia é que este espaço celebre a diplomacia acadêmica, congregue os diferentes saberes e os diferentes povos, abrigue a excelência e a solidariedade, enfim, sirva como equipamento coletivo que estimule nossa inserção no mundo e a do mundo em nós”, informa.

Para o pesquisador Ricardo Hiroshi Caldeira Takahashi, que há anos estuda os rankings que comparam o desempenho de universidades em todo o mundo, a internacionalização é parte do papel das instituições de ensino, que devem estabelecer vínculos entre a comunidade na qual se inserem e o pensamento universal e o legado cultural de todos os povos. “Há instituições relativamente desconectadas mundo afora, aliás, essas são maioria, mas tais entidades também cumprem um papel, até relevante, ao trabalhar um conhecimento geral e especificá-lo para condições locais”, analisa o professor do Departamento de Matemática. Em sua opinião, outro grupo de universidades – cujo número não ultrapassa 500 ou 600 – “cumpre o papel de a todo momento estar sincronizado com o estado da arte em todos os campos do conhecimento, em todas as áreas em que atua”.

“É impensável que uma entidade esteja sincronizada com o resto do mundo se não houver contato, se as pessoas não viajarem para ver o que se faz lá fora”, diz Takahashi. A UFMG, segundo ele, “está no meio do caminho” nesse processo, pois possui muitas áreas que concorrem em pé de igualdade com grupos de pesquisa internacionais e que exercem interlocução com pares no sentido mais estrito do termo. Em outras áreas, acredita Takahashi, a internacionalização ainda ocorre nos moldes antigos, isto é, na busca de elementos externos para o crescimento local. “Esse meio do caminho?em que nos encontramos já nos qualifica a estar no grupo das 600 entidades que conseguem cumprir esse papel que a internacionalização impõe”, opina o especialista.

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