Nos cursos de graduação da área da saúde, não há como abrir mão de atividades presenciais, que são fundamentais para o aprendizado de futuros enfermeiros, dentistas e médicos, por exemplo. Essa posição foi consensual entre professores que participaram ontem (quarta, 24) do 16° Fórum on-line do Programa Integração Docente, que teve como tema Experiências do ensino presencial durante o Ensino Remoto Emergencial (ERE) na graduação da UFMG.

Conforme lembrou o pró-reitor adjunto de Graduação, Bruno Teixeira, em agosto de 2020, quando foi possível iniciar o primeiro semestre letivo daquele ano, o ensino passou a ser 100% remoto devido à pandemia de covid-19, e 92% das turmas que teriam atividades presenciais em situação normal foram migradas para o ensino remoto emergencial (ERE). No final de novembro, quando começou o segundo período letivo, houve a possibilidade de iniciar no formato presencial algumas atividades de ensino não adaptáveis ao ERE.

“Isso permitiu um aumento de cerca de 5% das turmas práticas com relação ao período letivo anterior. Essas turmas reúnem hoje quase 2 mil estudantes de graduação de cursos da chamada ciência da saúde aqui na UFMG”, contou Teixeira, ressaltando quie o objetivo do encontro era tratar das adaptações relacionadas à biossegurança que foram necessárias para que essas atividades pudessem ser ofertadas presencialmente ou semipresencialmente (muitas delas não vêm tendo carga horária integral ofertada de forma presencial) e também das adaptações pedagógicas para adequação a esse modelo híbrido.

Melhor participação

A professora Janaína Matos, do Departamento de Pediatria, falou do trabalho nas disciplinas Pediatria 4 e 5 durante o ERE, com foco na atenção primária e atenção à saúde da criança e adolescente no contexto da pandemia. As disciplinas são ministradas no 7° e no 8° período de medicina e têm lugar em Unidades Básicas de Saúde (UBS) de Belo Horizonte.

De acordo com Janaína, há cerca de cinco anos já era adotado um rodízio entre atividades básicas e teóricas nessas disciplinas, com metodologias ativas, o que possibilitava a presença simultânea de menor número de estudantes nas UBS e um aproveitamento melhor desse período. “Já há algum tempo nós trabalhamos com o conceito de que idas com maior qualidade à UBS equivalem, muitas vezes, a um número maior de aulas presenciais, mas com uma participação melhor dos alunos”, explicou.

Para se adaptar ao momento, explicou Janaína Matos, foi preciso que as disciplinas passassem por alterações como redução de carga horária e limite de alunos por turno e consultório para limitar a exposição cruzada no caso de ocorrer contaminação. O foco passou a recair sobre o essencial, como a forma de o profissional de saúde atuar em períodos de incertezas como o da pandemia e os cuidados com a saúde mental de todos os envolvidos.

Coordenadora do curso de Enfermagem, Fabíola Baroni relatou que inicialmente foi elaborado um plano de ação para o trabalho no contexto da pandemia. Estava claro que não haveria como abrir mão das atividades presenciais, sobretudo para os discentes do último ano, o de estágio obrigatório. Um dos motivos para isso, segundo ela, é que uma das atribuições do enfermeiro é ajudar na organização das políticas e dos serviços de saúde. “Entendemos que era necessária a presença dos estudantes nos locais de prática, não apenas para cumprimento de carga horária, mas em razão do compromisso social que a Universidade tem com esses serviços”, explicou.

Nova rotina
A coordenadora do colegiado da graduação em Odontologia, Carolina Nemésio apresentou as adaptações feitas para possibilitar a retomada de parte das atividades presenciais, limitadas, por ora, ao atendimento na clínica de urgência, na qual atuam os alunos do décimo período, o último do curso.

A nova rotina inclui restringir a ocupação dos espaços a 20% da capacidade, organizar mais turnos de aulas para reduzir a circulação de pessoas, intensificar o uso de equipamentos de proteção individual, testar semanalmente todas as pessoas que frequentam as clínicas para avaliar os protocolos. Também passou a ser oferecido o curso Biossegurança em Odontologia, obrigatório para todos vinculados à Faculdade. Carolina informou que ainda são necessárias outras adequações na infraestrutura, como a elevação das divisórias entre as estações de atendimento e a instalação de filtros no sistema de ar condicionado.

“A gente vive um momento em que as questões da biossegurança na odontologia são urgentes, devido à elevada produção de aerossóis, que são a maior fonte de contaminação pelo Sars-Cov-2”, explicou a professora, acrescentando que a coordenação planeja a manutenção das aulas presenciais, mas seu início foi adiado para o final de março, devido ao alto número de casos de covid-19 em Belo Horizonte. “Uma das disciplinas, a que exigia muito mais habilidade motora dos alunos, tinha 38 matriculados e teve apenas três pedidos de trancamento extemporâneos, então a gente considera que há um avanço na oferta dessas disciplinas adaptadas para o modo de ensino remoto emergencial.”

Vivência sem igual

Médico infectologista e professor de Infectologia da Faculdade de Medicina da USP em Ribeirão Preto, Valdes Bollela relatou sua experiência como supervisor de disciplinas práticas, listando os desafios e as estratégias para conciliar o aprendizado dos estudantes aos cuidados com a sua segurança e a de seus pacientes. O docente defendeu que, apesar das contribuições do ensino remoto, as atividades clínicas presenciais devem ser mantidas porque asseguram o desenvolvimento de competências e habilidades essenciais aos graduandos, especialmente no período de pandemia. “Vivenciar isso que está acontecendo é algo que pode contribuir de maneira imensa, que a gente não consegue nem dimensionar, para a formação da geração futura de profissionais da saúde, o que nós, que estamos decidindo isso tudo, não tivemos. Trata-se de uma oportunidade de aprendizado que não pode ser menosprezada. Encontrar meios de fazer isso com segurança é a nossa obrigação”, argumentou.

Bollela ressaltou a importância de medidas como a elaboração de protocolos de biossegurança, treinamentos sobre prevenção e responsabilidade dentro e fora da clínica, supervisão constante e a inclusão dos alunos entre os grupos prioritários para a vacinação contra a Covid-19. “Apesar de o cenário não estar promissor, temos que lutar para vacinar todos os brasileiros, garantindo que os estudantes sejam tratados com a prioridade que já é dada aos profissionais de saúde”, enfatizou.

Imagem: Raphaella Dias/UFMG