Volume 02

Editorial:

Apesar de ter sido o quadro de importantes achados arqueológicos desde o século XIX (cabe aqui lembrar os trabalhos de P. W. Lund na região de Lagoa Santa,desde 1832 até 1879), o Estado de Minas Gerais até pouco tempo atrás não dispunhade pesquisadores profissionais com a devida formação técnica e metodológica. As numerosaspesquisas oficiais foram, porém realizadas por cientistas vindos de fora (MuseuNacional do Rio, Projeto Internacional americano-Brasileiro, Missão Franco-Brasileiradesde 1971 ), enquanto amadores dedicados, entre os quais podem ser mencionadosA. Mattos, H. V. Walter, A. Cathoud, J. Penna e M. Rubinger, tentavam juntarinformações sobre a arte rupestre do estado (os dois últimos citados particularmente)ou realizavam escavações. Infelizmente, a fàlta de recursos técnicos e materiaisprejudicou muito estas tentativas locais.
Em 1974, a Universidade Federal de Minas Gerais e o Instituto Estadual do Patrimônio .Histórico e Artístico, motivados pelos trabalhos da Missão FrancoBrasileiraem Lagoa Santa, formaram o projeto de criar um centro de pesquisas e ummuseu em Belo Horizonte. Um setor de arqueologia foi criado nos últimos meses de1975, e, no dia 30 de abril de 1976, o Governo do Estado de Minas Gerais, o Institutodo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e a Universidade Federal de MinasGerais, com a interveniência da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa, assinaramum convênio para implantação de um Museu do Homem com sede em Belo Horizonte,e cuja finalidade será coletar, preservar e expor todo o material etnográfico,paleontológico e arqueológico que resulta das pesquisas, escavações e estudos realizadosdentro do Estado de Minas Gerais. O Setor de Arqueologia passou então a sero primeiro núcleo em funcionamento do Museu do Homem.
Atualmente, o Setor de Arqueologia, lotado no Museu de História Natural da UFMG conta com a presença de 4 pesquisadores, dos quais 3 estão completandosua formação. A Universidade está organizando paralelamente vários laboratórios para datação, estudo polínico de sedimentos e petrografia, trabalhando em colaboraçãocom o Setor de Arqueologia, que teve também a oportunidade de atuar juntamentecom os Setores de Paleontologia e de Filmagem da UFMG.
Em consequência do apoio dado pelos órgãos responsáveis da Universidade, podemos esperar que daqui a pouco tempo o Setor de Arqueologia contará com umquadro completo e bem treinado. Já vários dos nossos jovens colaboradores puderamescavar junto à Dra. A. Laming-Emperaire, responsável científica pela Missão FrancoBrasileira,e com o Dr. A. Bryan, arqueólogo da Universidade de Alberta (Canadá).
Nesta primeira publicação, o Setor de Arqueologia apresenta tanto trabalhos realizados pelos membros da equipe como estudos de pessoas que trabalharam com ele.
Iniciamos com dois estudos sobre sambaquis. O primeiro, de autoria do Dr. Alan Bryan, sobre o sítio de Forte Marechal Luz, cuja cuidadosa escavação permitiudefinir uma evolução tecnológica mais completa que a reconhecida nas publicaçõesdisponíveis, e cujas etapas são datadas pelo carbono Í4. O Dr. Bryan é pesquisadorda Universidade de AIberta (Edmonton, Canadá) e se especializou no estudodos sítios pleistocênicos da América. Iniciou em 1976 uma série de trabalhos decampo em Minas Gerais, em colaboração com a UFMG. O segundo estudo trata dossambaquis fluviais do Estado de São Paulo. Esta categoria de sítio é ainda praticamentedesconhecida, apesar do trabalho pioneiro de Tiburtius, Bigarella e Bigarella em Itacoara,mas ainda em ambiente marítimo, enquanto os sambaquis de ltaoca são jábem afastados da planície baixa. Os autores são G. C. Collet, da Sociedade Brasileirade Espeleologia, que dirigiu as pesquisas de campo e cuja atuação mostra o quantoa arqueologia pode ser beneficiada pela colaboração de amadores esclarecidos. C. M.Guimarães, Professor na UFMG e lotado no Museu de História Natural, Setor de Arqueologia.
Os dois artigos seguintes tratam da arte rupestre em duas regiões de MinasGerais, que estão sendo estudadas pela Missão Arqueológica Franco-Brasileira. O primeiroevoca os trabalhos em Lagoa Santa, que permitiram datações mínimas, asprimeiras obtidas para arte rupestre no Brasil e talvez na América Latina. Pretendetambém mostrar quanto o estudo pode revelar sobre a organização das obras pré-históricas.O segundo é o resultado de uma prospecção rápida mas sistemática na região de Montalvânia.
O trabalho da Dra. M. Alvim (responsável pela matéria de Antropologia Física do Museu Nacional – UFRJ) é uma síntese dos estudos morfológicos realizadossobre o Homem de Lagoa Santa, incluindo dados de várias coleções até entãonão estudadas, e somando os restos de quase 200 indivíduos. A chamada raça de LagoaSanta pode, provavelmente ser agora considerada como uma das mais bem conhecidasentre as populações pré-históricas sul-americanas.
O Dr. Ch. T. Snow, linguista especializado em Quéchua, é Professor na Universidade Estadual de Califórnia, onde foi coordenador dos Estudos Latino-Americanos.Em 1976, foi Professor visitante na UFMG, quando realizou o estudo sobrecerâmica cabocla, juntamente com José Eustáquio Teixeira de Abreu, então formando em Ciências Sociais.
A próxima publicação do Setor será dedicada às prospecções e escavaçõesrealizadas no Estado de Minas Gerais, e a pesquisas sobre o paleoambiente.
Desejamos agradecer aqui a todos os que permitiram a criação e o Desenvolvimentodo Setor de Arqueologia, particularmente ao Dr. Eduardo O. Cisalpino,magnífico Reitor da UFMG, ao conselho de Pesquisas e à Administração da Universidade,à Fundação de Desenvolvimento de Pesquisa, ao Dr. Wilson Mayrink, Diretordo Museu de História Natural, a todos os pesquisadores funcionários, estagiáriose estudantes voluntários que nos ajudam desde há um ano.

ANDRÉ PROUS,
Responsável científico pelo Setor de Arqueologia UFMG.


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