As bruxas estão à solta: histórias e representações do feminino

Se eu te perguntar o que é uma bruxa, qual é a primeira imagem que vem a sua mente? Vamos nos esforçar nesse exercício de imaginação… Talvez uma senhora corcunda, vivendo reclusa no meio da floresta à espera de alguma criancinha distraída se perder de seu caminho? No seu rosto, um nariz anguloso e pontiagudo, junto a uma ou duas verrugas bem proeminentes? Há quem possa esbarrar também em outras faces: uma mulher jovem e sedutora, sua beleza eternizada com feitiços e poções onde fervem ingredientes incomuns. Teria ela uma varinha de condão, um caldeirão ou uma vassoura? Na janela de sua casa, sob os livros de magia, será que encontraríamos um gato preto ou, quem sabe, um corvo falante? Ou seria ela uma avó ou mãe curandeira, que pode ver e agir para além do véu do suposto “real”?

A caracterização da bruxa, personagem comum nas telas do cinema e da TV, pode assumir formas diversas. Geralmente, repete elementos como a vassoura, o caldeirão e os chapéus pontiagudos.

Bom, sendo esta ou aquela representação (ou tudo mais que pode surgir a partir delas), figuras como estas, mulheres associadas à magia e/ou forças obscuras são parte de uma quantidade considerável das histórias estruturantes do léxico mitológico de culturas por todo o mundo. Seja em contos clássicos como a vilã de quem a princesa foge mas acaba por cair diretamente em suas garras, aceitando uma maçã envenenada ou espetando o dedo em uma roca afiada, ou nos livros de história como vítimas de terríveis perseguições medievais, as bruxas estão sempre por aí. Desde que o mundo é mundo, ou pelo menos desde que o conhecemos enquanto uma ordem social comum ao que é hoje, bruxas, feiticeiras, magas, necromantes e todas as demais denominações existiram habitando o lado oposto daquilo visto como o “bem”.

Mas como essas representações surgiram? Da mesma forma que existem hoje ou foram mudando de rostos, lugares e habilidades ao longo do tempo? Esta é uma história bem longa, mais do que você imagina!

A civilização da Deusa

Por séculos e séculos, muito antes do surgimento da maior parte das religiões monoteístas cultuadas pelo globo, muitas eram as figuras femininas de caráter divino por quais povos inteiros se viam amparados, muitas vezes como a divindade central. Na Antiga Babilônia, por exemplo, Tiamat é uma deusa ancestral ligada ao mar primordial e às águas salgadas, considerada a mãe ou avó de todos os demais deuses. Já Aserá ou Astarte são nomes de uma deusa canaanita adorada pelos antigos hebreus antes mesmo da criação do texto bíblico. A deusa Ishtar personificava as características do amor e da guerra para os babilônios, enquanto, na Suméria, Inanna adquiria todas essas características, acrescida dos aspectos do poder político e de Rainha da Noite ou governante do céu e da terra. Já para os gregos, Gaia é a própria deusa-mãe, o corpo da terra, precedendo qualquer outro deus masculino. 

Estatueta da Vênus de Willendorf, encontrada às margens do Rio Danúbio, na Europa Central. (Créditos: Bjørn Christian Tørrissen).

Essas mulheres-deusas tinham poderes sobre o mundo e a terra, com agência sobre a vida da humanidade e encarnando muitas das características que, com o passar dos tempos, foram atribuídas à condição de feitiçaria e ostracizadas da ordem do sagrado como algo nocivo e condenável pelos novos ordenamentos sociais.

Que tal conhecer um pouco das raízes destas figuras na representação ocidental, especialmente na cultura grega, o início do que identificamos como a literatura ocidental? Ir além da superfície e descobrir as forças e mistérios que estas mulheres, sejam elas de fato temíveis ou meras vítimas de culturas centradas no poder e nas formas masculinas de conhecer, carregam dentro de si? 

Hécate: a magia dos caminhos possíveis e do trânsito entre mundos

Deusa da magia e da noite, sua origem é difusa pela história do mundo arcaico e poucas são as certezas de sua primeira aparição. Em virtude das constantes assimilações culturais derivadas das conquistas de território e subjugação de povos distintos, muitas divindades acabam adquirindo características de outras e tornam-se figuras multifacetadas, com as quais diferentes povos esparsos no tempo e no espaço possuem laços de identificação. Hécate é uma delas. 

A teoria mais aceita localiza sua origem na Cária, a oeste da Ásia Menor, precedendo o que entendemos enquanto cultura grega. Por lá, seu culto era relacionado à cura e aos mistérios da vida e da morte. 

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