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Nº 1486 - Ano 31 - 2.6.2005

UFMG e Fiocruz recebem financiamento para estudar varíola bovina

Pesquisa inclui desenvolvimento de vacina e de tratamento contra
a doença

Andréa Hespanha

partir do final da década de 90, propriedades rurais de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Goiás foram atingidas por surtos epidêmicos de uma doença conhecida como varíola bovina. A enfermidade, que atinge o gado leiteiro e seres humanos, apesar de não ser fatal, preocupa os fazendeiros pelos danos econômicos provocados na produção de leite. Atentos ao problema e em busca de soluções para esse mal que vem se alastrando nos últimos anos, pesquisadores da UFMG e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) desenvolverão pesquisa para estudar a varíola bovina. O projeto, gerenciado pela Fundep, foi selecionado entre 13 propostas para receber financiamento de 100 mil dólares do Nacional Institute of Health (NIH), dos Estados Unidos.

A varíola bovina, causada pelo vírus vaccinia, caracteriza-se por lesões nas tetas das vacas e na boca dos bezerros que mamam em animais doentes. O vírus é transmitido em contato com as feridas, o que também pode provocar lesões nas mãos e antebraço dos ordenhadores. Ainda não existe um tratamento para combater o vírus, apenas uma terapia de suporte que ataca os sintomas da doença, que dura de 15 a 20 dias.


Varíola bovina provoca lesões nas tetas dos animais e nas mãos dos ordenhadores
Foto: Zélia lobato

Segundo a professora Zélia Lobato, do Laboratório de Virologia Animal da Escola de Medicina Veterinária, as lesões são muito doloridas e podem gerar infecções secundárias na vaca. "Mesmo com as feridas, o produtor não deixa de utilizar os animais na ordenha. Eles sofrem com as dores e diminuem a produção de leite. Com isso, podem contrair mamite, doença que faz o leite pedrar", explica a professora. Ela acrescenta ainda que o ordenhador contaminado deixa de trabalhar por alguns dias, o que aumenta o prejuízo do produtor.

O projeto, coordenado pelo pesquisador Flávio Guimarães, da Fiocruz, deverá começar ainda este mês. Na UFMG, as pesquisas ficarão a cargo das equipes das professoras Zélia Lobato, da Veterinária, e Erna Kroon, do Laboratório de Vírus do ICB. O objetivo é desenvolver amplo estudo sobre todos os aspectos da varíola bovina, incluindo pesquisa de desenvolvimento de vacina e tratamento direto para o vírus. Em todas as amostras de animais infectados já analisadas pelos laboratórios da UFMG, foi identificada a presença do vaccinia como causador da varíola bovina. Trata-se do mesmo vírus usado na formulação de vacina contra a varíola humana, doença grave erradicada na década de 70. "Há mais de 25 anos, não há mais vacinação contra a doença. Vamos tentar descobrir porque e como o vírus vaccinia voltou a circular", diz Zélia Lobato. A intenção, segundo ela, é isolar o vírus causador e fazer sua caracterização genética, além de desenvolver estudo imunológico das vacas atingidas pela doença e levantar dados sobre ocorrência, formas de transmissão e comportamento da doença no organismo do animal.

"Também tentaremos descobrir se há reservatórios para esse vírus que teriam favorecido sua permanência na natureza", acrescenta Zélia Lobato, esclarecendo que a varíola bovina nada tem a ver com a temida varíola humana, já erradicada. "É importante não confundir para não causar pânico nas pessoas. O vaccinia não causa a varíola humana, apenas foi usado para a vacinação da doença", salienta.

Experiência

As equipes das professoras Zélia Lobato e Erna Kroon trabalham, desde 2000, com pesquisas sobre a varíola bovina. "A doença já era conhecida, com casos registrados nas décadas de 60 e 70, mas começou a preocupar mesmo nos últimos anos com a ocorrência de surtos como o da Zona da Mata, em 2001", explica a professora.

Desde então, a UFMG envolve alunos e pesquisadores em estudos sobre a doença. "Já temos muitas informações sobre a patologia, como isolamento, caracterização viral, propriedades atingidas e dados epidemiológicos", aponta Zélia Lobato.

Para ela, esse novo trabalho em parceria com a Fiocruz promete avanço nas pesquisas. "Juntar pessoas com diferentes visões para estudar um mesmo tema dá outra dimensão ao problema", declara Lobato. A pesquisadora acrescenta que todas as informações já existentes trazem novas perguntas, às quais os estudos pretendem responder. "Sabemos que o vírus é transmitido pelo contato com a ferida, mas há casos em que os produtores garantem não ter adquirido vacas novas e que o ordenhador não manteve contato com animais doentes. Mesmo assim, a doença chegou à fazenda", aponta.

A pesquisadora afirma que a informação sobre a doença e os cuidados que devem ser tomados são as principais medidas de controle da epidemia. "Depois que o produtor nota a presença da doença na fazenda, já não há muita coisa mais a fazer. Não há como evitar que ela se alastre", afirma Zélia Lobato.

A equipe da Universidade realiza paletras regulares com produtores e profissionais de saúde das regiões acometidas pela varíola bovina. "É preciso criar uma rede de comunicação, pois não adianta ficar só dentro do laboratório pesquisando se a população não tiver acesso a informações sobre a doença", diz Lobato.