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Nº 1306 - Ano 27 - 14.02.2001

Ensaio compara tirano grego

a ditador latino-americano

Murilo Gontijo

epois de décadas guiada pela tirania, a política contemporânea da América Latina dá sinais de que a democracia, inventada pelos gregos há cerca de 2.500 anos, finalmente encontra guarita por aqui, com algumas exceções. Se deve ser atribuída à civilização helênica a criação do regime do povo para o povo, a praga do mundo tirânico também tem suas raízes na Grécia Antiga. Mais: o despotismo latino-americano guarda muitas semelhanças com a tirania grega. "Vários aspectos mostram afinidades entre o tirano grego arcaico e o ditador populista latino-americano", escreve o professor José Antônio Dabdab Trabaulsi, do departamento de História, em seu livro Ensaio sobre a mobilização política na Grécia Antiga, que acaba de ser publicado pela Editora UFMG.

Publicado originalmente na França, no princípio dos anos 90, o estudo de Dabdab, ousada e pioneiramente, estabelece comparações entre a tirania ateniense do século VI a.C. e os governos de Getúlio Vargas e Perón. O autor mostra que as tiranias latino-americanas e gregas são parecidas quanto ao surgimento e modo de agir, além de guardar semelhanças quanto à imagem do tirano. "Em ambos os casos, os tiranos assumem o poder em contextos de ordem oligárquica. Eles são parte de uma elite, mas pertencem a grupo distinto daquele que está no comando. O tirano assume como um contestador da política vigente", explica Dabdab.

Quanto ao modo de ação, tanto os ditadores latinos quanto os gregos instauram um poder de caráter pessoal, contra um governo de ordem coletiva. A imagem que se tenta passar do governante é a de alguém que está ao lado dos mais frágeis. Lutam por aqueles que dispõem de poucos meios para se defender. "É a política para o trabalhador do Brasil, de Getúlio Vargas, ou para os descamisados, de Perón, na Argentina", exemplifica o autor.

Dabdab ressalta que, na Grécia tirânica e no Brasil populista, os ditadores não hesitaram em usar a violência contra seus opositores e desenvolveram a consciência social das camadas populares em função de seus próprios interesses. "Mas é importante verificar que esses períodos de tirania não são como parênteses na História, embora não sejam também modelos de ultrapassagem de uma ordem oligárquica. O poder tirânico transforma a sociedade e estabelece novas relações políticas", defende o professor.

Ostracismo

O livro de Dabdab é dividido em quatro partes. A primeira aborda a política nos escritos de Homero, que são tratados como documentos da cidade grega em fomação. No capítulo seguinte, ele analisa o Arcaísmo, período em que surgiram diversas formas de governo, dentre as quais democracia e tirania. A terceira parte do livro é dedicada ao ostracismo. "Analiso a história do banimento político do território ateniense, seus mecanismos e objetivos", afirma Dabdab, antecipando que os governantes eram expulsos de Atenas por representarem ameaça à democracia, ao contrário do que acontecia nas ditaduras latino-americanas. No quarto capítulo, estão reflexões sobre alguns momentos em que a barreira da escravidão e a cidadania eram parcialmente apagadas. "Isso acontecia quando a cidade ficava desprotegida, e os escravos eram convocados a defendê-la com a promessa de liberdade, ou quando a guerra matava grande parte dos homens, e os escravos eram chamados a reconstituir a civilidade".

Livro: Ensaio sobre a mobilização política na Grécia Antiga

Autor: José Antônio Dabdab Trabaulsi

Edição: Editora UFMG, 144 páginas

Preço: R$ 15