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Nº 1744 - Ano 37
15.8.2011

SOBRECARGA para o SUS

Pesquisa de mestrado revela que é alto o gasto público com medicamentos para pessoas com plano de saúde

Ana Rita Araújo

Rita da Glória

Quase 40% dos gastos públicos com medicamentos de alto custo em Minas Gerais beneficiam pessoas que possuem plano privado de saúde. O dado é fruto de pesquisa realizada pelo farmacêutico Rilke Novato Públio, que acaba de defender dissertação de mestrado na Escola de Enfermagem. Orientado pela professora Edna Maria Rezende, o trabalho traça um mapa da distribuição dos chamados medicamentos excepcionais entre as 28 gerências regionais de saúde do estado e aponta a necessidade de aprofundar a discussão sobre a política de assistência farmacêutica dos planos de saúde. “Consideramos que os resultados dessa pesquisa podem oferecer importantes subsídios para gestores de serviços públicos e privados de saúde”, comenta Edna Rezende.

O Brasil fornece cerca de 100 medicamentos considerados componentes especializados da assistência farmacêutica – em geral de alto custo –, que são solicitados pelos usuários e distribuídos pelos estados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). “Alguns tratamentos podem ter custo muito elevado, chegando até R$ 25 mil por mês”, informa Públio. Entre os dados levantados na pesquisa, ele identificou que a Gerência Regional de Saúde de Belo Horizonte responde pelo maior número de solicitações (37%), além de receber pedidos de medicamentos mais caros. “Isso provavelmente ocorre porque nos grandes centros há mais informações, tanto entre quem prescreve quanto entre os usuários”, deduz.
A pesquisa de Rilke Novato baseou-se em amostra de 6.733 solicitações feitas à Secretaria da Saúde de Minas Gerais entre janeiro e junho de 2008. “Enviamos os dados dos usuários para a Agência Nacional de Saúde (ANS), que identificou, entre eles, 31% que tinham planos privados”, conta o farmacêutico.

Os dados também revelam que no período estudado a regional de Montes Claros solicitou o maior percentual de medicamentos para tratamento de doenças de pele, enquanto a de Varginha recebeu mais remédios para problemas osteomusculares e a de Juiz de Fora para o sistema nervoso. Segundo o pesquisador, as informações coincidem com dados do censo demográfico e com a literatura. Eles apontam, por exemplo, que a população de Montes Claros tem maior percentual de jovens do sexo masculino que, em geral, fazem tratamento para acne; Varginha tem mais mulheres, segmento que utiliza mais medicamentos para osteoporose; e Juiz de Fora possui população idosa acima da média do país, o que aumenta o consumo de remédios para combater enfermidades do sistema nervoso, como demências.

Custo elevado

Segundo Rilke Novato, os medicamentos distribuídos pelo SUS são divididos em três linhas: os básicos, de responsabilidade dos municípios; os estratégicos, fornecidos pelo Ministério da Saúde; e os excepcionais, cujos custos são cobertos em maior proporção pelo Ministério da Saúde e pelas secretarias estaduais. Os medicamentos básicos tratam as patologias mais comuns, como hipertensão, diabetes e verminoses; os estratégicos são voltados para doenças que podem pôr a população em risco, como tuberculose, hanseníase, leishmaniose e malária; e os componentes especializados da assistência farmacêutica, ou excepcionais, são utilizados no tratamento de doenças raras ou de custo elevado.

O farmacêutico explica que na década de 1980 a lista se compunha de apenas 15 medicamentos, fornecidos, sobretudo, a pacientes transplantados. Ao longo dos anos, outros tratamentos foram incluídos – como as terapias anti-HIV – e em 2008 a relação alcançou o número atual de 107 medicamentos.

O pesquisador conta que em alguns casos o tratamento pode durar anos, o que o torna extremamente caro. “Mas se o paciente deixa de usar o medicamento, o quadro pode se agravar, levando inclusive à necessidade de gastos com internação”, adverte. Tal realidade demonstra, segundo Rilke Novato, que a definição de uma política de assistência farmacêutica – que inclui o custeio de medicamentos estratégicos – é de interesse também dos planos privados de saúde, já que a lei 9.656/98, em seu artigo 12, determina que essas instituições privadas ofereçam cobertura aos gastos com medicamentos para seus pacientes internados em hospitais. O farmacêutico aponta uma contradição na lei, cujo artigo 10 não determina tal cobertura para os mesmos medicamentos quando usados no domicílio do paciente. “Isso é absurdo, porque a necessidade continua, às vezes por vários anos”, comenta.

Embora não proponha que o Estado deixe de fornecer esses medicamentos a pessoas que possuem planos privados, Rilke Novato sugere que haja discussão em torno do tema. Ele comenta que a maioria dos planos privados desenvolve ações de prevenção de agravos e de promoção de saúde, ao estimular os pacientes a fazer caminhadas e a participar de grupos de apoio para determinadas patologias. “O raciocínio deveria ser o mesmo no que se refere aos medicamentos excepcionais, pois é também de interesse dos planos privados que seus associados mantenham o tratamento, para evitar custos mais altos com agravos que possam levar a internações ou mesmo a intervenções cirúrgicas”, afirma.

Dissertação: Análise de solicitações de medicamentos excepcionais prescritos aos usuários de planos privados de saúde no Estado de Minas Gerais
Autor: Rilke Novato Públio
Orientadora: Edna Maria Rezende
Defesa: 20 de julho, junto ao Programa de Mestrado em Enfermagem