Processo de aquilombamento na mídia foi debatido em mesa do Novembro Negro
Com o tema Aquilombando pela comunicação, a mesa que encerrou a penúltima semana de atividades do Novembro Negro na UFMG foi realizada na tarde desta sexta-feira, dia 24, no auditório da Reitoria. Jornalistas e pesquisadores falaram sobre os avanços — ainda insuficientes — da negritude brasileira em termos de representatividade, do papel da comunicação no processo de aquilombamento da sociedade e da necessidade de a pauta antirracista ocupar lugar central na arena pública e ser assumida por toda a sociedade, inclusive pelas pessoas brancas.
O jornalista Acácio Jacinto, do Canal Futura, lembrou que os negros ainda estão na base da pirâmide social e compõem, por exemplo, “a maioria entre as pessoas em situação de cárcere ou de rua, os que passam fome, os exterminados, as empregadas domésticas, os desempregados e quem está evadindo da escola”. De acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança, em 2020, um negro foi assassinado no Brasil a cada 15 minutos.
“Não foram os negros, nem os indígenas, que criaram o racismo. Portanto, todos precisamos abraçar o movimento antirracista e, efetivamente, trabalhar por um país melhor. A representatividade tem crescido, mas nossa sociedade tem estrutura muito racista. Sabemos que o racismo está em todos os ambientes, por isso, a pauta da igualdade racial deve ser permanente”, argumentou.
Também do Canal Futura, o apresentador Leonne Gabriel pontuou que “ainda há muita estrada a se percorrer num país onde morrem tantos jovens”. “É triste perceber que, apesar de mais da metade dos brasileiros serem negros, um perfil como o meu, profissional formado em duas faculdades, cursando o mestrado, é exceção”, lamentou.
Leonne destacou, no entanto, que hoje são colhidos alguns bons frutos pela negritude, em decorrência da luta travada por gerações anteriores. “Somos continuidade e precisamos reconhecer o que já foi feito. Minha geração se coloca como revolucionária, mas desconhece boa parte do que foi construído”, disse.
Em relação ao papel dos profissionais de comunicação na luta antirracista, Leonne propôs o que chama de revisão do vocabulário. “Nossa língua carrega o passado escravista, e as redações perpetuam os privilégios da branquitude”, afirmou.
Significado
O quilombo é um espaço de reconexões identitárias e reconstrução política e estratégica, em que as ações são coletivamente pensadas dentro de uma horizontalidade, definiu Vivi Coelho, articuladora política e institucional da Agência de Iniciativas Cidadãs (AIC).
“No quilombo, a sabedoria dos mais velhos é importantíssima, e a noção de pertencimento está fora de padrões coloniais e racistas. O quilombo é o espaço de fusão de saberes emancipatórios e não dominadores. Quando a gente propõe o aquilombamento dentro da universidade, precisa pensar sobre o que isso significa. Como a gente consegue, a partir das nossas discussões, praticar a filosofia do quilombo?”, provocou Vivi Coelho, que ainda recorreu a uma frase do sociólogo Clóvis Moura para reafirmar a centralidade do quilombo: “O contrário de casa grande não é senzala, é o quilombo.”
A pró-reitora de Assuntos Estudantis, Licínia Correa, salientou que o quilombo não foi somente uma tentativa de rebelião contra os escravocratas, mas “uma forma de vida, um sistema de organização social”. “Falar de aquilombamento é falar de um importante movimento por emancipação afrodiaspórica. É trabalhar o território da memória, reafirmar aquilo que é apenas recordação. Estamos tratando de uma construção simbólica, feita pelo coletivo, que revela e atribui valores à experiência do passado. Nossa ancestralidade tem valor fundamental no processo de aquilombamento e resistência”, disse.
Academia tensionada
A diretora do Centro de Comunicação (Cedecom) da UFMG, Fábia Lima, afirmou que, durante o Novembo Negro, “foi muito interessante e rico promover atividades e refletir sobre como os profissionais de comunicação podem atuar com o compromisso de produzir uma sociedade antirracista. A pauta da negritude é central no nosso trabalho”.
O professor Pablo Moreno apresentou o grupo de estudos Coragem, do Departamento de Comunicação Social da UFMG, e avaliou as transformações pelas quais passou o ensino superior desde o início das políticas afirmativas. “Qualquer departamento de qualquer universidade brasileira tem maioria de professores brancos. A presença de alunos negros passou a crescer, especialmente, quando foram implementadas as cotas. A academia tornou-se tensionada, de forma mais consistente, e abriram-se espaços para outras biografias e abordagens”, disse.
Após o encerramento da mesa, os participantes e a plateia aderiram a um cortejo do bloco de carnaval Seu Vizinho nas imediações do prédio da Reitoria.
A programação do Novembro Negro na UFMG segue até o dia 30.