Publicações e profissionais dedicados ao jornalismo científico devem adotar postura mais crítica diante das fontes de informação, segundo Marcelo Leite, colunista da Folha de São Paulo. Também escritor de livros básicos de ciência e de ficção juvenil, Marcelo Leite participa nesta quarta-feira de mesa-redonda sobre divulgação de ciência que integra a Semana do Conhecimento e Cultura da UFMG. O evento será realizado no auditório da Reitoria, das 8h30 às 10h. Nesta entrevista ao Portal UFMG, Marcelo Leite fala de seu relacionamento com assessorias de instituições de pesquisa e defende a educação científica nas escolas. Você acha que temos mercado para criticar a ciência, ou falar sobre seu making of, ao invés de apenas divulgar inventos e descobertas? Como vê o relacionamento da mídia com as assessorias de universidades? E como você procura pautar seu relacionamento com fontes desse gênero?
Talvez seja uma questão de capacidade do público de absorver um jornalismo científico um pouco mais sofisticado do que a mera narrativa de descobertas. Eu procuro realizá-lo, mas sempre enfrento a dificuldade do didatismo, assim como tantos colegas. Talvez falte um pouco mais de empenho, no Brasil, para tornar o jornalismo científico um pouco mais crítico diante das fontes, como deve ser todo e qualquer jornalismo.
É um relacionamento escasso e difícil. Algumas universidades profissionalizaram bastante suas assessorias de imprensa, afastando-as de atividades meramente promocionais para fazer realmente divulgação de pesquisas e estudos relevantes ali produzidos, mas não é a regra no Brasil. Para o meu trabalho de colunista, é uma fonte de menor utilidade, porque raramente resulta em temas e ideias.
Pode-se falar em monopólio das agências especializadas internacionais na circulação das informações? Elas dispensam tratamento diferente para pesquisas no Brasil e fora do país?
Acho que não dá para falar em monopólio, pois hoje qualquer jornalista que leia inglês tem acesso direto pela internet a publicações e fontes científicas – as mesmas que são consultadas por repórteres de ciência do mundo inteiro, em agências de notícias ou publicações. Como só uma pequena parte da pesquisa produzida no Brasil tem qualidade e impacto internacional, ela raramente aparece em despachos de agências internacionais – cabe aos repórteres brasileiros, portanto, lutar para encontrar as boas pesquisas que são feitas por aqui, independentemente das agências de notícias internacionais.
Como está o espaço para jornalistas nesse segmento? O fim da obrigatoriedade do diploma tende a alterar significativamente o perfil dos profissionais, talvez especialmente nessa área?
Não acredito em mudança significativa do perfil, pois não são muitos os profissionais com formação científica e talento e disposição para se mudar de mala e cuia para o jornalismo. Mas, se isso ocorrer, vai ajudar o jornalismo científico no Brasil, com certeza.
Fale sobre sua trajetória no jornalismo científico e como escritor de livros sobre ciência.
Faz 30 anos que me formei em jornalismo, a maior parte dedicada ao jornalismo científico – do que não me arrependo nem um pouco, embora não seja a área mais promissora, na profissão, para fazer carreira. De 2000 para cá comecei a me dedicar também a livros básicos, como maneira de ampliar um pouco meu público e de apresentar algumas questões – como a da Amazônia – de forma mais abrangente do que pode ocorrer em notícias e colunas de jornal.
O que destacaria quanto ao que se faz (e o que poderia ser feito) em termos de divulgação científica fora do jornalismo?
Acho que o Brasil precisa de mais museus de ciência, por exemplo, mas mesmo isso de nada adiantará se não melhorarmos urgentemente a educação científica, nos bancos escolares, mesmo. Sem isso, as vocações continuarão a ser sufocadas no berço e a maior parte das pessoas enfrentará enorme dificuldade para adentrar esse mundo intrigante da pesquisa científica, com enorme perda cultural para elas.