Para o professor Dietmar Martin Samulski, do Departamento de Esporte da Escola de Educação Física da UFMG, o acompanhamento psicológico do profissional do esporte é tão importante quanto seu treinamento físico. E isso vale não só para os atletas, mas também para treinadores, dirigentes e técnicos. Doutor em psicologia do esporte pela Universidade de Colonia (Alemanha), Samulski acompanhou a delegação brasileira nas últimas três Paraolimpíadas (Sydney, Atenas e Pequim) e nas Olimpíadas de Atenas, em 2004, na qual o Brasil apresentou seu melhor desempenho na história da competição. Atualmente, é presidente da Sociedade Sul-Americana de Psicologia do Esporte (Sosupe) e desenvolve pesquisas sobre estresse psíquico, qualidade de vida e recuperação de atletas. Nessa entrevista ao Portal UFMG, o pesquisador fala sobre Copa do Mundo e a importância do treinamento psicológico para o desenvolvimento do atleta. Como a psicologia do esporte vem sendo apropriada atualmente na preparação dos atletas? O treinamento esportivo moderno deve ser interdisciplinar, portanto o atleta precisa de uma preparação não só física, mas também mental. Por isso a importância da psicologia do esporte. Ela melhora a motivação do atleta e desenvolve habilidades mentais como autoconfiança e capacidade de concentração. Existem estudos que mostram que, para formar um atleta vencedor em dez anos, são necessárias de 12 a 15 mil horas de treinamento sistemático e aplicado. Ou seja, é um trabalho muito duro. Oferecer assistência psicológica a esses atletas é importante para fazê-los superar os obstáculos, além de contruibuir para sua formação intelectual. Por isso que muitos clubes de futebol já desenvolvem esse tipo de trabalho desde as categorias de base. Falando de futebol, em época de Copa do Mundo, a pressão sobre os jogadores da seleção brasileira é muito grande. Como é o trabalho desenvolvido pela psicologia do esporte com esses atletas? Na seleção brasileira de futebol, podemos destacar o caso do Kaká, que é o grande ídolo da equipe e estava até pouco tempo atrás se recuperando de uma lesão. A pressão que ele sofreu para estar em forma a tempo de atuar bem na Copa foi muito grande. Na verdade, ainda é. Estudos que nós realizamos com pesquisadores da Fisioterapia mostram que o apoio psicológico a atletas lesionados nessa fase de preparação apresentam resultados muito positivos. É o que chamamos de terapia integrada: a combinação de técnicas da fisioterapia e técnicas psicológicas, como relaxamento e automotivação. Os dados mostram que os atletas se recuperam muito mais rápido com esse programa integrado do que fazendo a recuperação tradicional. E no caso dos treinadores? Nessa Copa, já vimos desentendimentos entre o técnico da França e seus jogadores, entre o Dunga e o jornalista da Rede Globo... Como a psicologia do esporte pode agir nesses casos? Nos últimos dez anos, surgiu uma preocupação muito grande com a preparação psicológica dos treinadores. Muitas vezes, os técnicos não estão preparados mentalmente para enfrentar as situações de dificuldades. A psicologia do esporte pode capacitar os treinadores em diversas competências: motivação, liderança, como criar a união de grupo. Além disso, muitos treinadores têm problemas em se comunicar com a mídia. É preciso um treinamento específico nesse campo também. A qualidade de vida desses profissionais pode ser afetada pela pressão psicológica a que são submetidos? Sim. Existem estudos norte-americanos com técnicos profissionais que mostram que a expectativa de vida deles é dois a três anos inferior à media da população por causa do estresse. E não é só a pressão psicológica: muitos técnicos estão fisicamente despreparados, possuem distúrbios de alimentação, não conseguem dormir. Tudo isso influencia negativamente a qualidade de vida desses profissionais. Um dos estudos que eu estou orientando atualmente analisa o fenômeno do burnout em treinadores de diversas modalidades esportivas. Burnout seria um estado de desmotivação pessoal e exaustão emocional do indivíduo. É um fenômeno identificado, por exemplo, em médicos-cirurgiões que trabalham em excesso e sob grande responsabilidade. O que nós percebemos é que técnicos esportivos correm grandes riscos de burnout. No futebol, principalmente, o risco de burnout é muito elevado devido à pressão psicológica e à necessidade de apresentar bons resultados. É preciso entender que a psicologia do esporte não prepara só o atleta. Treinadores, árbitros e dirigentes também sofrem grande pressão e precisam de assistência psicológica.