“Hoje não se faz quase nada que não envolva estatística e probabilidade, por isso essas áreas têm que figurar com mais força nos currículos de licenciatura e bacharelado, e também no da educação elementar.” Dita de modo enfático, a frase do professor Mario Jorge Dias Carneiro, do Departamento de Matemática do ICEx, integra discurso que defende inovações no ensino da disciplina nas escolas e universidades. Segundo ele, devem ser introduzidos novos temas no lugar de outros que vão perdendo importância relativa, com o objetivo de atrair o interesse dos alunos, incluídos aí os que se preparam para atuar como professores. “Não se pode ensinar como se fazia décadas atrás, precisamos definir quais características da pesquisa atual devem influenciar os currículos”, afirma o pesquisador, que debaterá o tema nesta quarta-feira, 28, em mesa-redonda que integra a 62ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece em Natal, no Rio Grande do Norte. Membro do conselho diretor e da comissão de ensino da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), Carneiro é um dos coordenadores da versão em língua portuguesa do Projeto Klein, que vai reeditar e atualizar a obra Matemática elementar do ponto de vista superior, do alemão Felix Klein. Escrito há 100 anos, o livro em quatro volumes é fruto da preocupação do autor em aproximar a pesquisa e o ensino secundário. Motivado pelo projeto internacional, grupo de pesquisadores já trabalha em iniciativa paralela que congrega as diversas sociedades matemáticas do país. Com recursos da Capes da ordem de R$ 1 milhão e duração prevista de quatro anos, o projeto vai produzir, por exemplo, bibliografia em versão eletrônica para apoiar o ensino da disciplina. O material de suporte terá recursos de hipertexto, para permitir o aprofundamento, de acordo com as intenções de cada usuário. “Entre seis e oito workshops temáticos darão o pontapé inicial para cada um dos tópicos selecionados do currículo da escola básica, discutindo as principais dificuldades e estabelecendo linhas gerais de tratamento”, revela Mario Jorge Carneiro, que é pós-doutor na área de sistemas dinâmicos pelo Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), no Rio de Janeiro, e pela Princeton University, nos Estados Unidos. Realizado no início de julho, no Departamento de Matemática da UFMG, o primeiro encontro tratou de números reais e funções. Do elementar à fronteira Para ilustrar a explicação, Carneiro ressalta que ferramentas como os códigos de barra e as mensagens codificadas para segurança bancária têm a ver com questões básicas da aritmética e da álgebra. “Nossa preocupação é divulgar essas relações. O projeto internacional, que é mais sofisticado, pretende vincular a pesquisa de ponta à didática, e nós vamos além, produzindo textos, livros e material eletrônico que possam ser úteis ao professor e ao estudante, em diversos níveis. Todo esse debate em torno do ensino de matemática promete envolver questões que devem ser tratadas de forma integrada. O problema deve ser atacado, defende o pesquisador, com foco na formação do professor, que deve também receber incentivo por meio de remuneração melhor, produção de material mais adequado – “o professor ainda está muito preso ao livro, que muitas vezes possui sérias deficiências”, diz Carneiro – e na implementação de iniciativas de contato direto com o aluno. Conexões atraentes “Ao contrário da física, que conta com o apelo da atração exercida pela astronomia e pela nanotecnologia, a divulgação da matemática não tem se beneficiado das conexões que existem com o mundo real”, diz Mario Jorge Carneiro. “Normalmente não se faz conexão direta entre os avanços tecnológicos e a matemática. Como então divulgá-la? Uma das maneiras é difundir a ciência por meio de seus métodos, suas questões, do jeito de pensar matemático e sua utilidade.” Esta é uma forma de resumir os grandes objetivos das novas iniciativas que têm unido a comunidade acadêmica na área da matemática. Além da mesa-redonda sobre Licenciatura e bacharelado em matemática: competências para o século 21, nesta quarta, Mario Jorge Carneiro participou ontem (terça, 27), também no evento da SBPC, de encontro sobre o Projeto Klein em Língua Portuguesa e apresentou a conferência de Claudianor Alves, da UFCG, sobre A importância da matemática na tecnologia.
Segundo o professor da UFMG, “não se quer inventar a roda, há muita coisa boa que será disponibilizada”. Porém, o foco inicial será a produção de artigos curtos, de até quatro páginas, que servirão de referência. Eles abordarão problemas elementares e interessantes, que serão desenvolvidos até que se chegue a uma questão de fronteira – a ideia é estabelecer relações entre aspectos da matemática.
Nesse sentido, o pesquisador cita estratégia que pesquisas têm apontado como muito bem-sucedida: a promoção das olimpíadas de matemática. Um exemplo é a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), que desde 2005 premia escolas (com computadores, bibliotecas e quadras de esportes) e concede bolsas de iniciação científica júnior a três mil estudantes de todo o país, que passam a integrar um fórum de discussão via computador.