Ficcionistas como Sérgio Sant’Anna, Bernardo Carvalho e Alan Pauls criaram escritores que são narradores ou personagens de suas tramas. Eles contam e vivem histórias diversas, mas para o jornalista Sérgio de Sá foram fonte de uma investigação peculiar: através de suas aventuras, Sérgio tenta desvendar que lugar ocupa o escritor – e por extensão a literatura – em um mundo marcado pela saturação de imagens e eventos. Sergio de Sá acaba de publicar uma resposta, na forma do ensaio A reinvenção do escritor – literatura e mass media, da Editora UFMG. O trabalho é adaptação de tese de doutorado em Estudos Literários, defendida em 2007 na Faculdade de Letras da UFMG. Jornalista “a vida inteira”, com intensa vida paralela na pós-graduação, o autor tem explicação para o interesse pelo tema que faz todo o sentido. “Ele nasceu do cruzamento entre a redação de jornal e a academia, entre a mídia do dia a dia e a literatura como objeto de trabalho e prazer”, ele diz. Estudioso da cultura dos meios de comunicação de massa desde o mestrado, Sergio abre o livro com um texto de contextualização que é sufocante, tal a abundância com que descreve o mundo dominado por essas midias. “Esse excesso é de propósito, para que o leitor entre no clima. Ele nem pretende ser tão crítico, na verdade procuro afastar o preconceito que os estudos literários costumam demonstrar em relação aos meios de comunicação. Eles estão aí, e precisamos aprender a dialogar com eles”, afirma Sergio de Sá, que foi editor de Cultura e crítico literário do Correio Braziliense. Um dos aspectos abordados pelo livro é o desafio da atividade intelectual e literária de lidar com o efêmero. Para o jornalista, a efemeridade não é um mal em si. “É necessário tragar a rapidez e a obsolescência. Só se destrói o clichê olhando-o de perto”, diz. Nas obras que examinou, Sergio encontrou intelectuais que viram franco-atiradores, paranoicos ou melancólicos. Segundo ele, estas são “as saídas para encontrar a lentidão, o incorporar. De alguma forma, portanto, se reencontrar”. Personagem no conflito Ao acompanhar aventuras e desventuras dos escritores da ficção, Sergio descobriu que a literatura busca alternativas para não desaparecer. Concluiu que ela pode se aproveitar do fato de ser “perdedora” no mundo das mídia de massa, um lugar de onde não precisa dar satisfações a quem quer que seja. “Ao mesmo tempo, não pode desprezar a comunicabilidade, mantendo um olho na linguagem e outro no leitor. Equilíbrio com ambiguidade, que tal?”, provoca. Sérgio de Sá acredita que a literatura deve usar a mídia a seu favor. “Dentro da literatura e dentro da mídia”, continua o autor, que em seu texto garante ter encontrado na ficção literária ótimas análises dos meios de comunicação. Em texto de orelha do livro, o escritor José Castello lembra que “a literatura toma a aparência de um instrumento anacrônico, incapaz de resistir ao grande arrastão”, para contrapor logo depois que o livro que apresenta é “prova irrefutável de resistência”. Segundo Castello, “Sérgio de Sá nos sugere que nos agarremos à grande rede mediática (...) não para nela sucumbir, mas para arriscar um grande salto para frente”. (Boletim UFMG, edição 1710)
Sergio de Sá conta que suas leituras para a pesquisa incluíram ficções brasileiras e argentinas que colocam o personagem-escritor na cena contemporânea, no conflito dos valores culturais. Revisitou abordagens teóricas de Silviano Santiago e Beatriz Sarlo. “Para desenrolar o tema, eu ensaio novos formatos, caminhando sobre os fios tênues que separam fato e ficção, verdade e verossimilhança”, revela o autor.