Universidade Federal de Minas Gerais

Museu não é só para divertir, diz Ulpiano de Menezes

quarta-feira, 29 de setembro de 2010, às 8h01

O museu ainda não aprendeu a explorar as possibilidades do virtual, segundo o professor emérito da USP Ulpiano Toledo Bezerra de Menezes, um dos mais reconhecidos especialistas brasileiros em museus, com múltiplas atividades dentro e fora do país.


Aline Dacar
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Ulpiano fez conferência no dia 24 de setembro, na Escola de Ciência da Informação, como parte de ciclo que comemora os 60 anos da unidade e o início da graduação em Museologia. Sobre a pergunta que serviu de tema para a exposição – O museu tem futuro? –, ele confessou bem-humorado que foi uma provocação. “Imaginei que os estudantes ficariam preocupados com seu futuro profissional e financeiro.” Ao fim da conferência, ele deu sua resposta. Estes foram alguns momentos da conferência, registrados pela equipe do Boletim UFMG, e que também estarão na próxima edição da publicação.

Museu mortal
Como organismo histórico, o museu é reciclável, mortal. Não é uma instituição universal. “Não existiu sempre, e não existe em todas as sociedades”, afirmou Ulpiano.

Produto do Iluminismo
As coleções existem desde a Antiguidade, mas o museu é recente, do século 18. Surgiu no Iluminismo, com a associação do conhecimento empírico ao conceito de razão universal. “O Museu de História Natural cristaliza a relação do documento com a produção de conhecimento, feita dentro do próprio museu, que então socializa esse conhecimento”, afirmou o historiador. Elementos naturais e artefatos passam a ser tratados como suporte de informação. Daí a ideia de conservação para tornar a informação disponível.

Peso menor
Com o desenvolvimento da genética e da bioquímica, as fontes materiais começaram a perder o brilho. Também com a antropologia, que substituiu a cultura material pelas estruturas e relações sociais. Com isso, o museu perdeu seu peso no campo do conhecimento. “Nem os museus de história natural seguem seu próprio modelo original”, afirmou Ulpiano.

Crise da representação
No século 19, entrou em crise a representação. O professor emérito da USP ressaltou o caráter problemático do conceito de verdade. “A ciência deixou de lado a verdade e busca soluções para problemas”, ele disse. Acabou a relação estável entre a imagem e aquilo a que ela se refere. “Esta articulação está sendo solapada, a imagem virtual é a que não precisa de referente.” O cubismo e o abstracionismo já tinham desprezado o referente. “Precisamos de um movimento pela inclusão do referente”, ele brincou.

Pseudoevento
Chegamos à era do pseudoevento, como um aperto de mãos entre líderes de Israel e da Palestina. É o evento construído pela imagem.

Informação virou commodity
Informação e conhecimento tornaram-se commodities, tanto que se fala em capitalismo cognitivo, e até em injustiça cognitiva – uns têm acesso à informação, outros não. Os museus sofrem a pressão da abundância da informação, e têm que saber como operar nesse contexto. A informática criou nova forma de pensar o conhecimento, e seu uso indiscriminado banaliza o conteúdo. “Há museólogos preocupados apenas com a credibilidade da Wikipédia, mas o problema é que não aprendemos a fazer perguntas”, ressaltou o professor. “Temos respostas demais para perguntas que não sabemos quais são.”

Desmaterialização do sentido
Uma dos aspectos que nos fazem humanos é o contato do eu interior com o universo externo, e isso tem a ver com nossa condição corporal. Mas essa condição está sendo negada, estamos terceirizando nossa percepção, nossas experiências. “O doente é reduzido a um conjunto de dados digitais, por isso de vez em quando se opera a perna errada”, ele exemplifica. O caso do mercado financeiro é cristalino: o capital é transformado em fluxo de informação abstrata. O fenômeno atinge os museus, pois a virtualização anula a fruição estética como experiência sensorial.

Exposição blockbuster
“Já repararam nas semelhanças entre supermercados e museus? Eles têm a mesma estrutura visual. Só que o supermercado é mais organizado e eficiente”, comparou Ulpiano. O museu passou a ser consumidor de produtos feitos fora dele, no chamado mercado simbólico. Os curadores não estão mais nos museus, são escritórios especializados. Fenômeno relacionado são as exposições blockbuster. Na exposição sobre o Monet, há alguns anos, compravam-se cartões-postais, bolsas e até os pratos que ele cozinhava. “Havia até mesmo telas do pintor”, brincou Ulpiano.

Gerentes de espetáculos
Nos anos 1960, os museus começaram a perder especificidade, surgiu a moda dos centros culturais. Passaram a gerenciar teatro, cinema e artes plásticas, em vez de enfrentar a responsabilidade de operar acervos. “As concepções não são excludentes, pode se ampliar e enriquecer a perspectiva de museu”, ressaltou o historiador.

Estética não é a azeitona
Afinal, o que conta: artefatos ou sentidos, peças ou ideias? “Não há sentido imanente nas coisas físicas, nós é que o produzimos”, disse Ulpiano. Uma ideia sem suporte sensorial fica aprisionada na mente. A estética (no sentido etimológico, de percepção) é a base da vida social, “ela não é a azeitona da empada, é a empada toda”. Ao mesmo tempo, um objeto não é só a embalagem, ele significa cultura, que é algo que se vive.

Museu não é só para divertir
O virtual veio para ficar e abre horizontes extraordinários, mas não é bem aproveitado isso no campo dos museus. Diversão é importante, mas esse não pode ser o modelo de museu, como no caso do Museu da Língua Portuguesa (em São Paulo). Não se resolveu nas exposições a questão da retórica sensorial – devem ser criadas condições de interlocução. “O virtual é indispensável no museu, mas adotá-lo como modelo é terceirizar nossa experiência sensorial”, ele alertou.

Diversidade e diferença
Os museus têm condições excepcionais de aguçar o sentido crítico, mas não basta reconhecer a diversidade cultural, é preciso colocar as culturas em confronto para que haja transformação. A França parece resolver essa questão, dentro dos museus. No espaço social, entretanto, não há aceitação da diferença cultural.

Educação
“Trabalhar educação no museu não é levar para lá toneladas de estudantes que copiam as legendas”, afirmou Ulpiano. Museu não é o lugar da palavra escrita, ela já tem seus suportes. O museu tem que transformar a percepção, e os educadores devem explorar o que define a personalidade do museu.

Espaço de ficção
O museu deve ser espaço de ficção, no sentido da origem da palavra, de produzir forma. Ficção é mediação que se estabelece para se conhecer o universo. Ela não se opõe a uma verdade – é uma necessidade em virtude da amplitude do que se quer conhecer e das limitações da inteligência humana. “No museu, posso criar uma forma, como faz o artista, para entender o universo, não para reproduzi-lo.”

O museu tem futuro
A resposta para a pergunta que deu nome à conferência é positiva. “Não há instituição na nossa sociedade que possa desempenhar tão bem a missão de formular perguntas”, concluiu Ulpiano Bezerra de Menezes.

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