Universidade Federal de Minas Gerais

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Wagner Moura em Tropa 2: questionamento

‘Tropa de elite’ mostra realidade e faz refletir, afirma pesquisador do Crisp

terça-feira, 26 de outubro de 2010, às 8h30

O movimento das bilheterias indica que Tropa de elite 2 caminha para disputar o posto de maior fenômeno de público do cinema brasileiro. Além de ir ao encontro do interesse da sociedade pelo tema da segurança pública, o filme é ótimo como obra de arte, segundo o doutorando em sociologia pela Fafich Luís Felipe Zilli, que é pesquisador do Crisp (Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG). “O filme abre uma janela para o espectador, com isenção impressionante”, ele afirma.

Repórter de polícia em Belo Horizonte por seis anos, Zilli esteve no meio de tiroteios e viu cadáveres de perto. Interessou-se pelo assunto e, certo de que a cobertura da imprensa é superficial e de que poderia contribuir mais, resolveu ingressar na academia. Nesta entrevista ao Portal UFMG, o pesquisador parte da abordagem do filme para falar sobre a participação dos jovens no crime e a necessidade do que ele chama de “retomada do território institucional”.

O que significa o fenômeno Tropa de elite?
O fenômeno começa no primeiro filme. Além do mérito cinematográfico, as produções conseguem colocar o tema da segurança pública na pauta do dia. Normalmente ela fica escondida atrás de educação, saúde, moradia, mas é tão ou mais importante. Os filmes mostram com precisão a realidade.

Que efeito têm os filmes sobre a sociedade? Eles esclarecem ou mitificam a questão?
Os filmes são tão bons exatamente porque permitem uma série de leituras. O primeiro foi polêmico porque teria feito uma apologia da forma como a polícia brutaliza as comunidades de favelas. O segundo é mais maduro, com abordagem mais profunda, mais ampla e mais política do tema. Não trata só do enfrentamento entre policiais e traficantes, nem da explicação de que a classe média patrocina o tráfico com seu vício. Achar que o filme mitifica a questão é uma leitura rasa. Ele abre uma janela na frente do espectador. E faz isso sem ser tendencioso, com isenção impressionante. Não é maniqueísta. Quem continuou vendo o capitão Nascimento como herói precisa rever seus conceitos. Ele mesmo não está mais convencido da validade de suas ações. Se o primeiro filme ainda mostra uma oposição simplista entre lado bom e lado mau, o segundo joga isso por terra. Ele é mais ácido, mais incômodo, e por isso mais difícil de ser digerido. Acaba com qualquer certeza que Tropa de elite 1 possa ter provocado. Agora todo mundo é bandido.

Pode-se dizer que o público acompanha o coronel Nascimento e muda também sua forma de ver as coisas?
As pessoas vão ao cinema querendo mais do mesmo. O primeiro filme provocou catarse, o público vibrou com o capitão Nascimento, se sentiu amparado pelo seu heroísmo. Quando se trata de um problema tão grave, quando aparece alguém que não se omite, o público parece não se importar se ele está certo ou errado, há empatia com o personagem. E na hora a de assistir a Tropa 2, o anseio era por mais aventuras do agora coronel Nascimento. As pessoas vibram com o Bope no início do filme, mas a partir de certo ponto, a história destrói esse espírito, porque começa a mostrar a quem e a que propósito serve aquela política de guerra. Continua o processo de identificação e o espectador muda junto com o coronel. O anseio primitivo, de “matar os vagabundos”, e uma chama “higienista” caem por terra e o espectador se sente encurralado. Tanto que as pessoas têm saído das sessões arrasadas, em silêncio. Me fez lembrar da cena final de Tropa 1, quando a arma que vai executar o chefe do tráfico está na verdade apontada para o espectador. Aquele tiro sai do fundo de uma tragédia, aquela morte não era para ser comemorada. E Tropa 2 mostra como a saída é difícil, que a culpa não é só dos bandidos, é de todos nós. Não é à toa que, quando toma posse no Conselho de Ética, o deputado corrupto argumenta que foi “eleito democraticamente”. Ou seja, ele não encontrou uma cadeira vaga e se sentou.

Podemos concluir que também numa área como a da segurança pública uma obra de arte pode provocar questionamento?
Uma obra de arte pega as pessoas por aquilo que elas têm de mais sensível. Penetra de forma mais intensa que uma discussão, por exemplo. O tema da segurança é árduo, complexo, mexe com sentimentos primitivos, porque estamos falando da nossa vida, de violações que sofremos. E a obra fala sem dizer, provoca reflexão sem usar todas as letras. Da forma como foi filmado, Tropa 2 passa a impressão constante de ser um documentário, de que aquela história é real. E por isso não daria margem a contestação. Mas o modo como a direção encaixa as histórias faz que as pessoas reflitam, e esse é o mérito da produção como obra de arte. Eu mesmo saí impactado, ruminei aquela sensação por uma semana. Coisa que só uma obra de arte provoca. Não é da ordem do intelecto, arrebata. Presenciei muita violência como repórter policial, tanto que me perguntavam como eu aguentava aquilo tudo. Eu respondia que tinha que me policiar para não ficar doido ou cínico. Saí quando percebi que estava me tornando as duas coisas. Portanto, o que me atingiu no filme não foi o impacto visual da violência, mas a forma com o diretor articula as histórias.

Tropa de elite 2 fala sobre o Brasil ou retrata apenas a realidade do Rio de Janeiro?
O filme é muito carioca, no que se refere à configuração do tráfico, das milícias, à penetração disso na política e ao nível endêmico da corrupção nas polícias. Pelo que conhecemos de pesquisas e relatos, a polícia, especialmente a militar, é mais perpassada pela corrupção lá que em outros estados. O domínio bélico e territorial das quadrilhas, do modo como acontece no Rio, não se observa com essa intensidade em outras cidades. O Rio é diferente também no aspecto da interlocução fluente das quadrilhas com o sistema prisional.

Suas pesquisas se concentram sobre a relação dos jovens com a criminalidade. O que tem chamado a atenção entre os resultados desses estudos?
Pesquisas, principalmente americanas, têm constatado que, em sentido amplo, o crime perpassa todas as classes, mudam apenas as modalidades. O crime violento, no entanto, principalmente o homicídio, é um fenômeno social tipicamente jovem. Eles são os principais autores e vítimas. Tem-se verificado que o envolvimento desses jovens começa a crescer aos 15 anos de idade, chega ao ápice entre 18 e 24 anos e decai a partir dos 27 anos. As razões disso inspiram diversas teorias, mas não existem conclusões. O homicídio como causa de mortandade de jovens é um dos grandes problemas de segurança pública, e sabe-se que o crime atinge muito mais jovens não brancos, pobres e moradores de favelas. O crime de homicídio é imensamente concentrado, tanto social, quanto espacialmente. As polícias costumam argumentar que entre 70% e 80% dos homicídios têm relação com o tráfico de drogas. Mas não existe qualquer dado ou estudo que mostre isso com precisão. Além disso, sob esse grande guarda-chuva temático que é o tráfico de drogas, há um mundo de situações. Eles não matam e morrem só por motivações econômicas, utilitaristas. Claro que isso acontece numa disputa por território, mas um adolescente armado é capaz de matar também o cara que roubou sua namorada. Muitas vezes, jovens matam porque têm que impor respeito, e não conhecem outra forma de resolver conflitos. E nossas polícias colocam tudo no mesmo saco. Uma carnificina pode começar porque um cara pisou no pé de outro num baile funk. Várias entrevistas que realizamos com jovens envolvidos com gangues e tráfico mostram que muitas mortes não têm qualquer motivação utilitarista ou econômica ligada ao tráfico em si. Muitas vezes são discussões banais, mas nem por isso menos letais, uma vez que os jovens estão armados.

Quer dizer que a violência não pode ser explicada apenas pela pobreza?
De forma alguma. Não existe qualquer relação direta entre pobreza e crime. Se assim fosse, teríamos mais de 100 favelas violentas em Belo Horizonte, quando, na verdade, temos apenas seis ou oito. Além disso, temos que ter bastante cuidado com esta definição geral de “crime”. Como eu disse, existem pesquisas americanas que demonstram que a prática de atos desviantes não apresenta diferenças significativas entre as classes sociais. Todos nós, independentemente de classe social, cometemos atos desviantes. O que muda é a modalidade desse desvio. Em termos de definição, furtar um celular é tão crime quanto sonegar impostos ou subornar um policial para evitar uma multa. Até mesmo para que possamos começar a encontrar soluções para os problemas da segurança pública, precisamos começar a definir melhor o fenômeno sobre o qual estamos falando.

Quando falamos de homicídios, por exemplo, precisamos resistir à tentação de jogar tudo na vala comum do “tráfico de drogas”. Precisamos entender melhor este fenômeno, ver que ele possui outras facetas, que não necessariamente a questão financeira do tráfico. Muitas vezes, o problema do envolvimento de jovens com homicídios passa pelo seu envolvimento em gangues. E as gangues envolvidas com tráfico não atraem este jovem apenas pela promessa de dinheiro rápido. Elas têm poder de atração baseado também no status e na visibilidade social que elas proporcionam. Muitos meninos, antes de entrar para as gangues, se sentem invisíveis e verbalizam isso: uma arma na mão traz mulher, traz respeito. A análise das causas da criminalidade muitas vezes despreza esses elementos simbólicos.

Com tem visto iniciativas de combate à criminalidade como as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), no Rio?
Vejo de maneira bastante positiva porque é inadmissível que, em pleno século 21, ainda existam, dentro do território urbano, zonas sem lei e sem ordem, territórios de exceção em que não vigore o estado democrático de direito. As UPPs são um grande acerto, e os arrastões recentes no Rio são sinais do enfraquecimento do tráfico. Mas o processo ainda é muito difícil. Juntamente com o trabalho de retomada de território geográfico, é necessário que se comece, no Rio de Janeiro, um amplo trabalho de depuração do Estado, com a eliminação de maus policiais, principalmente. A retomada do território que é necessária não é apenas geográfica, mas também política e institucional.

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