Cercados pelo cuidado de equipe multiprofissional de saúde, os pacientes do Ambulatório da Criança de Risco (Acriar) do Hospital das Clínicas (HC) contam, desde maio do ano passado, com um estímulo a mais para superar os efeitos da prematuridade: a música. Pesquisa da professora Maria Betânia Parizzi investiga se os sons musicais podem acelerar o desenvolvimento de bebês nascidos muito cedo, e os resultados iniciais levaram à criação do projeto de extensão Música para a Saúde do Bebê, no Centro de Musicalização Infantil (CMI) da Escola de Música, no campus Pampulha. “É um desdobramento da pesquisa e oferece a crianças de baixa renda a possibilidade de continuarem seu processo de desenvolvimento por meio da música”, explica Betânia, que também coordena o CMI. Ao mesmo tempo, a pesquisa tem continuidade no Ambulatório Acriar do HC, com previsão para trabalhar com, no mínimo, 52 bebês. Até o momento, 18 pacientes participaram da iniciativa. Resultados preliminares, avaliados por três jurados, confirmam as expectativas da pesquisadora. O rápido desenvolvimento e a boa coordenação motora dos bebês são ganhos apontados pelas mães. “Não tenho dúvidas de que esse trabalho ajudou muito minha filha. Agora, com um ano e cinco meses, seu desenvolvimento é normal”, relata Gilmara Gonçalves, mãe de Maria Vitória, que nasceu com 900 gramas, aos seis meses de gestação. Betânia Parizzi explica que o trabalho é inédito no país, “não apenas pela natureza do estudo, mas também por seu alcance transdisciplinar e utilidade prática, tanto no âmbito da música como no das ciências da saúde”. Ela acredita que os conhecimentos gerados pelo projeto de extensão e pela pesquisa têm aplicação imediata em disciplinas dos cursos de Licenciatura em Música e Musicoterapia e, provavelmente, em cursos na área de saúde. Ouve o rosto e vê a voz Tanto no Acriar quanto no CMI, as sessões de música seguem prática determinada pelas professoras Betânia Parizzi e Aline Carneiro. As crianças são estimuladas mediante interação vocal, corporal e instrumental, o que lhes propicia experiências auditivas e visiomotoras. Tal abordagem metodológica foi idealizada por ambas no final da década de 1990, no Núcleo Villa-Lobos de Educação Musical, com bebês nascidos a termo. Um dos principais fundamentos do trabalho é a Teoria do Desenvolvimento Cognitivo, de Jean Piaget. Ao partir do pressuposto de que o bebê “ouve o rosto e vê a voz”, as professoras oferecem a ele “quadros sonoros”, sob a forma de performances instrumentais e vocais. Betânia Parizzi explica que nesse momento é fundamental que o bebê visualize o rosto e os gestos da professora, os quais devem ser extremamente expressivos, pois o recém-nascido tem percepção visiossonora. “Ele é muito estimulado com ações interativas ‘ao vivo’, diferentemente da música gravada, muito menos eficaz”, esclarece. A professora também estimula os bebês ao imitar e modificar seus balbucios, com variações de timbre, altura e intensidade. Tambores, chocalhos, guizos, carrilhões e instrumentos musicais tradicionais são oferecidos, como “provocações sonoras” que levarão à formação de memórias dos parâmetros do som e da relação som-silêncio. Leia aqui a reportagem completa. (Boletim UFMG, edição 1736)
Pela natureza das técnicas utilizadas, o trabalho não tem conotações terapêuticas. “A abordagem é pedagógica e visa estimular o desenvolvimento normal da criança na época em que a plasticidade cerebral é máxima”, explica a professora, ao destacar que a iniciativa não tem o caráter de reabilitação, nem parte de um déficit anatômico ou funcional da criança. Ela lembra que a promoção da saúde é uma linha ideológica recente que procura deslocar o olhar da doença para a saúde. Assim, a ênfase está nas possibilidades de desenvolvimento e prazer, e não nas patologias.