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Mauro Sayar Ferreira: remédios distintos para combater a crise

“Esta é uma crise de confiança”, define o economista Mauro Sayar Ferreira

quarta-feira, 24 de agosto de 2011, às 6h30

Com a experiência de quem já trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI) produzindo análises sobre as políticas fiscal e monetária da Colômbia, o professor Mauro Sayar Ferreira, do departamento de Economia da Faculdade de Ciências Econômicas (Face), enxerga um componente psicológico na recente turbulência que abalou o sistema financeiro internacional. “O fato de uma agência de risco ter rebaixado os títulos americanos não ocorreu à luz de dados novos. É diferente da crise de 2008, quando um banco [Lehmann Brothers] quebrou”, lembra ele, em entrevista concedida ao Portal UFMG.

Especialista em economia internacional, macroeconomia e econometria, Sayar sugere remédios distintos para vencer os efeitos desta nova crise e das que poderão vir na sequência. Para os Estados Unidos, ele recomenda o uso de instrumentos de política fiscal, com aumento de gastos públicos. Para o Brasil, há, segundo ele, ampla margem para reduzir a taxa de juros, enquanto a Europa deverá em algum momento repensar a continuidade de uma moeda única.

Essa turbulência recente pode ser chamada de crise?
É uma crise de confiança, de aversão a riscos. Não houve, na verdade, nenhum dado novo relevante relacionado a fundamentos econômicos que justificasse a queda. O fato de uma agência de risco ter rebaixado os títulos americanos não ocorreu à luz de fatos novos. É diferente da crise de 2008, quando um banco [Lehmann Brothers] quebrou. Agora, não houve anúncio de país dando calote ou de falência de bancos ou de uma grande empresa.

Então é uma crise psicológica?
De certa forma, sim. Mas isso não vem sozinho. Não há dados novos, mas há uma percepção de um ambiente desfavorável. Há bastante tempo, o clima de temor e aversão ao risco é grande no mercado financeiro. E agora a origem não é o setor privado, mas governos. Teme-se um calote dos países europeus e não se sabe se o plano de estabilidade financeira da Europa será suficiente para socorrer todo mundo. Imagina se houver uma quebradeira generalizada de bancos? Já vimos que isso contamina a economia mundial. Se ocorrer algo assim, vai ser muito ruim, pois teremos retração do crédito. Menos dinheiro para emprestar, investir e estimular o consumo. A chamada zona do euro representa 20% do PIB mundial. Essa é uma crise de confiança, sim, mas lastreada nos péssimos fundamentos das contas públicas na Europa. Já nos Estados Unidos houve o problema do teto da dívida que foi resolvido, mas o mundo ficou conhecendo a outra face do país. Descobrimos, de uma hora para outra, que lá há risco político. Em 2002, o Brasil estava com os fundamentos ruins, mas o que desencadeou a crise foi uma incerteza política provocada por uma eleição. O Obama [o presidente norte-americano Barack Obama] deu uma declaração que me parece correta. Os EUA foram rebaixados não por causa de uma suposta incapacidade de pagar, mas por uma questão política. Ficou a impressão de que disputas políticas podem levar os Estados Unidos a darem um calote. Somando tudo isso, os americanos enfrentam um problema de crescimento. Sua economia que já vinha enfrentando um processo de desaceleração sofrerá impacto adverso adicional, porque a elevação da dívida foi condicionada à redução de gastos.

A crise de agora não tem nada a ver com a de 2008?
Há uma relação entre elas.

É um rescaldo?
Sim, é um rescaldo. Para contornarem os efeitos da crise de 2008, os países europeus se endividaram muito na tentativa de evitar uma depressão ainda maior de suas economias. No caso americano, houve algo semelhante com a elevação da dívida. Se naquela época estivessem com o nível de endividamento registrado hoje, Estados Unidos e Europa não poderiam ter adotado medidas como redução de impostos e injeção fiscal. É obvio que há países que adotaram essas medidas, mas não estão com tantos problemas. Os que estão em situação pior possuem dívidas mais elevadas e apresentam problemas estruturais em suas economias que dificultam sua saída da crise, como são os casos da Irlanda, Grécia e Portugal. E na Europa há outros complicadores, como a rigidez do mercado de trabalho. Bem diferente dos Estados unidos, cuja economia é ágil e dinâmica.

Para países como Estados Unidos, o endividamento nunca chegou a ser problema por causa do perfil de longo prazo. E agora passa ser problema?
Um governo não consegue a bel-prazer alongar o perfil de sua dívida. Dificilmente alguém vai comprar o título de uma dívida de um país que a cada mudança de governo passa a impressão de que vai dar um calote ou não cumprir compromissos. A dívida nos EUA é longa e grande e consegue ser vendida no mercado porque está lastreada em um estoque de 250 anos de credibilidade, independentemente dos governos.

Mas agora há um ponto de interrogação...
Sim, mas quando estourou a crise de 2008, para onde os investidores correram? Para os papéis dos Estados Unidos. Era uma crise na economia americana, o medo era generalizado, mas todo mundo comprou título da economia americana. E o mesmo ocorreu nas últimas semanas. Houve uma grande corrida por títulos americanos, apesar do rebaixamento. Talvez falte outro título de dívida capaz de substituir o dos Estados. Que outro papel deixaria os investidores tão seguros e confortáveis? É certo que estamos vendo alguns ativos subindo muito, como o ouro, ou moedas, como o yen ou o franco suíço, que estão se valorizando.

Como enfrentar melhor essas crises? Medidas conjunturais são suficientes ou é preciso uma maior intervenção no mercado financeiro?
Há duas linhas de ação. Uma de caráter conjuntural e outra estrutural. Vamos, primeiro, analisar do ponto de vista conjuntural. No caso dos EUA, a melhor medida seria lançar mão de instrumentos de política fiscal, fundamentada em redução de impostos. Eventualmente, direcionar gastos para certos setores da economia com a finalidade de tirar o país da recessão. Mas o remédio ministrado nesse episódio de elevação do teto da dívida é oposto e impedirá o governo americano de fazer política expansionista. O Congresso americano determinou uma política de contração, obrigando o país a caminhar na contramão. Por isso, os mercados estão apreensivos com a recuperação.

A receita então seria elevar o gasto público para aquecer a economia, a exemplo do que fez o Brasil em 2008?
É, mas aqui foi exacerbado. Poderíamos ter aproveitado melhor os instrumentos de política monetária. Deu certo porque a economia brasileira vinha bem, a exemplo das outras emergentes. Foi bom, mas o uso do mix política monetária-política fiscal poderia ter sido mais eficiente, com custos menores do ponto de vista da dívida pública. A sociedade terá que pagar mais impostos e juros para arcar com essa conta. Já os Estados Unidos esgotaram os instrumentos de política monetária – as taxas de juros estão muito baixas – e precisam lançar mão de uma política fiscal expansionista. E também adotar uma estratégia para sinalizar reformas para o mercado. Exemplo: anunciar um plano de longo prazo para reduzir a dívida, com aumento não imediato e gradual de impostos no futuro ou medidas de estruturação de gastos também no futuro para garantir menos impostos no presente. Seria uma boa estratégia. Ao mesmo tempo em que não se penaliza o consumo presente, sinalizaria com a estabilidade da dívida em longo prazo. O caso europeu é mais complicado. Recentemente, o Banco Central Europeu comprou títulos da dívida dos países endividados e essa é uma tendência daqui para frente. Isso não estava previsto na constituição do banco, mas me parece inevitável. É o que chamamos de união fiscal, mecanismo em que o sistema, com sua moeda única, bancaria as dívidas de todos os países associados. Seria como se no Brasil a União resolvesse assumir a dívida de estados.

Já existe um fundo para isso?
Ele está sendo construído, nem todas as regras foram definidas. Um dos problemas pendentes diz respeito ao volume de recursos que esse fundo teria que dispor para comprar títulos de dívida dos países europeus. Fala-se em 250 bilhões de euros, com sinalização que poderá chegar a 400 bilhões de euros. É um recurso que poderia cobrir dívidas de países menores, como a da Grécia, mas não daria conta de um país do porte da Itália. Ainda teremos muitos problemas em países como Grécia e Espanha. A própria Espanha, a Itália e a Irlanda anunciaram pacotes, mas o montante da dívida é muito elevado, e as medidas não são suficientes para gerar superávit orçamentário; os números são muito ruins. Economias deprimidas não geram receita. E também estão endividadas. Se fossem empresas teriam quebrado há muito tempo. Do ponto estrutural, a Europa terá que pensar em mudanças profundas, como a continuidade ou não de uma moeda única.

O euro está ameaçado?
O custo para os países periféricos da zona do euro é muito elevado. Eles não conseguem acompanhar a Alemanha. A Europa não é, por assim dizer, uma área monetária ótima, conceito que se traduz em certa homogeneidade entre os vários países. Ou seja, em caso de desemprego alto na Alemanha e em outros países, seria mais fácil aplicar mecanismos de política monetária, por meio de um único banco central alterando a taxa de juros, para reverter a situação.

A realidade lá é bem diversa...
Na Europa, não dá para ministrar o mesmo remédio. As situações são muito diferentes. E aí as decisões acabam sendo tomadas em função da Alemanha e da França, por exemplo, que têm peso maior na determinação da inflação e do PIB da região. Creio que a continuidade do euro entrará em discussão em algum momento, a não ser que os países mais desenvolvidos decidam pagar a conta, sustentando reformas nos países periféricos, para deixarem, por exemplo, o mercado de trabalho mais flexível e diminuindo a benevolência de seus estados de bem-estar social.

E o que fazer com o sistema financeiro?
Algumas reformas precisam ser feitas, com a revisão de certos mecanismos, como os de proteção contra calotes de países ou empresas. É um seguro que o investidor compra para se proteger de um calote. Na Europa, a preocupação é a seguinte: se houver um calote, os bancos vão ter que arcar com valores absurdos. Mas o que ocorre é uma transferência de custos. Existe uma proteção, mas no frigir dos ovos, considerando a escala elevada de endividamento, os bancos não pagariam o seguro. E eles realmente não teriam como pagar, sob pena de não apenas quebrarem, mas também de contaminar o sistema de uma forma geral. É preciso pensar mecanismos que permitam aos bancos quebrarem, afinal o capitalismo também envolve prejuízo. Nesse cenário, há uma discussão em torno do Basileia 3, que prevê o aumento, pelos bancos, de seus níveis de capital, para que possam arcar com tais custos em caso de perdas.

Seria uma espécie de compulsório?
Exato. Nos momentos de prosperidade, em vez de emprestar todo o recurso disponível, deixa-se uma parte dele indisponível para liberar em situações adversas. Mas é preciso reconhecer que esse tipo de medida é difícil, pois o lobby do sistema financeiro é muito forte, além de encarecer o custo do recurso a ser entregue aos tomadores.

O Brasil vai voltar a surfar na ‘marolinha’? É possível blindá-lo de futuras crises?
Isso exigiria um custo fabuloso, um forte endividamento. Em termos líquidos, a nossa dívida já representa 40% do PIB, muito alta para os padrões de países emergentes. No nosso caso, o ideal talvez seja usar instrumentos de política monetária em vez de política fiscal. É melhor mexer na taxa de juros. Se os instrumentos fiscais não tivessem sido tão ativados em 2008, haveria mais espaço para atuação de mecanismos monetários. O Banco Central poderia ter reduzido mais as taxas de juros. Está na hora da política monetária fazer o seu serviço. Há margem para isso. Mexer na política fiscal é muito mais difícil porque é preciso eleger os setores que serão beneficiados. Em compensação, a política monetária atinge todo mundo por igual, é mais horizontalizada.

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