A criação de um mercado lícito e regulado pode ser alternativa para solucionar o problema da escassez de órgãos e tecidos humanos destinados a transplantes, defendem alunos da Faculdade de Direito, em trabalho premiado no evento XIX Jornadas de Jovens Estudantes do Grupo Montevidéu, realizado em outubro no Paraguai. O artigo, desenvolvido por Daniel Mendes Ribeiro, Mariana Alves Lara e Nara Pereira Carvalho, integra as atividades do Grupo Persona, coordenado pelo professor Brunello Stancioli. Os autores destacam que transplantes de órgãos e tecidos são tratamentos terapêuticos cada vez mais recorrentes para diversas doenças, enquanto cresce também o número de pessoas que aguardam nas listas de espera. A comercialização de órgãos e tecidos é vedada no ordenamento jurídico brasileiro, com pena prevista de multa e detenção de até oito anos, pois o país adota sistema baseado exclusivamente em doações, tanto entre vivos quanto na retirada de órgãos após a morte. Para Mariana Lara, um dos motivos da proibição é o culto à sacralidade do corpo, e qualquer forma de monetarização dele seria considerada indigna. “Partindo do pressuposto de que a dignidade é a autorrealização da pessoa, a possibilidade de ela ser autônoma e fazer o que quiser com o próprio corpo não pode ser considerada como algo indigno”, acrescenta. Restrições ao livre mercado Além disso, os autores afirmam que a criação de um mercado para comércio de órgãos deve respeitar critérios de justiça e equidade, com restrições de práticas de “livre mercado”, fixação de preços e subsídios para os mais pobres e estabelecimento de critérios médicos de prioridade. “Não há razão forte o suficiente para proibir a venda de órgãos. Essa restrição é baseada em concepções morais de cunho religioso”, diz Mariana Lara, ao acrescentar que “em um Estado laico e democrático como o brasileiro, não se poderia limitar a possibilidade de ação das pessoas, com a imposição de uma visão moral”. Nara Pereira Carvalho, mestre em Direito pela UFMG e coautora do trabalho, destaca a importância de estabelecer o diálogo e de divulgar a consistência das ideias e da argumentação do artigo. “O interesse do grupo é levar essa discussão para a sociedade”, reforça. Trabalho: Um mercado lícito regulado como alternativa para o problema da escassez de órgãos e tecidos – Desafios e propostas (Boletim UFMG, edição 1758)
Outro argumento bastante utilizado para a defesa da proibição, segundo os autores, é a possibilidade de exploração de pessoas carentes, que poderiam ser coagidas ou compelidas a venderem seus órgãos como forma de sobrevivência. O trabalho, porém, sustenta que a pobreza não implica perda da autonomia e da capacidade de fazer escolhas. Além disso, argumentam, tais escolhas seriam condicionadas pela obrigatoriedade do consentimento informado e a existência de critérios de risco para seleção e filtragem dos potenciais vendedores.
Autores: Daniel Mendes Ribeiro, Mariana Alves Lara e Nara Pereira Carvalho
Orientador: Brunello Stancioli