Itamar Rigueira Jr. |
Descobertas da área da saúde e de outras áreas do conhecimento têm inspirado estudos e reportagens sobre as fórmulas que aumentam a longevidade e permitem o envelhecimento saudável. Mas a responsabilidade pela saúde do idoso ainda é atribuída de forma muito predominante ao próprio indivíduo. E não é bem assim, de acordo com Fabiane Ribeiro Ferreira, uma das contempladas pelo Prêmio UFMG de Teses de 2011. A pesquisa que valeu à fisioterapeuta destaque na área de saúde pública levou à conclusão de que, além do investimento em saúde para garantir a funcionalidade do idoso, é necessário também cuidar de infraestrutura e segurança na área de moradia. “As condições físicas e sociais do lugar em que vivemos têm grande importância para uma vida saudável e para a inserção do idoso na sociedade”, garante Fabiane. Ela destaca que a infraestrutura da vizinhança explica 17% – taxa considerada muito relevante – da variabilidade da performance funcional dos idosos entrevistados ao longo do trabalho que resultou na tese Envelhecimento e urbanização: o papel da vizinhança na funcionalidade do idoso na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Segundo Fabiane Ferreira, as pessoas com mais de 60 anos serão, em 2050, 25% dos habitantes urbanos dos países em desenvolvimento. Em menos de dez anos, o Brasil terá 13,8% de sua população formada por idosos, e a maior parte deles vivendo em áreas urbanas. “O país vive processo de urbanização acelerado e as cidades não estão preparadas. Os moradores enfrentam desde condições de saneamento do século 19 nas vilas – que atingem mais gravemente a saúde de crianças e idosos – até pouca disponibilidade de serviços, calçadas irregulares e ameaça de assaltos, fatores que inibem a inserção social dos mais velhos”, salienta a pesquisadora. Vizinhança e residência A pesquisa encontrou 13,7 de idosos analfabetos, e apenas 31,7% com o ensino fundamental completo (ou mais). Quase 70% deles se revelam sedentários nos horários de lazer e 72% fazem uso regular de medicamentos. Nada menos que oito em cada 10 pessoas com mais de 60 anos chegam a deixar de sair de casa por medo de assalto e quase metade delas por medo de quedas no passeio público. “A questão das condições de manutenção das calçadas é grave. Os cruzamentos estatísticos revelam que o idoso com essa preocupação tem três vezes menos chance de ser independente do que aquele que sai de casa sem medo”, explica Fabiane. Os dados sobre saúde utilizados na pesquisa foram coletados pela Fundação João Pinheiro, em parceria com o Instituto Oswaldo Cruz e a Faculdade de Medicina da UFMG, onde Fabiane Ferreira cursou o doutorado. De acordo com a pesquisadora, mesmo considerando que um percentual baixo (13,5%) de idosos se diz insatisfeito com a vizinhança, foi possível estabelecer relação entre esse fator e as dificuldades com as atividades cotidianas. As pessoas menos satisfeitas têm mais problemas com as funções mais comuns de todos os dias. “Isso confirma estudos que garantem que a impressão de uma pessoa sobre sua qualidade de vida sofre impacto maior da opinião a respeito da vizinhança do que da própria residência”, informa Fabiane Ferreira. Ela lembra, a propósito, que o contato com o ambiente próximo tende mesmo a ganhar relevância com o envelhecimento, uma vez que a rede familiar e social vai diminuindo. A interação com vizinhança tem a função de cooperação para a promoção e proteção da saúde, de acordo com Fabiane. “A pesquisa nos deu indícios de que o capital social evita o isolamento e afeta positivamente as condições de funcionalidade do idoso, embora a coleta de dados não estivesse vinculada diretamente a esse aspecto.” Mudança de cultura Tese: Envelhecimento e urbanização: o papel da vizinhança na funcionalidade do idoso na Região Metropolitana de Belo Horizonte
O objetivo da pesquisa de Fabiane Ferreira foi, sobretudo, conhecer a situação de funcionalidade de idosos que envelhecem na capital mineira e identificar fatores relacionados à independência para a realização de atividades da vida diária. A pesquisadora lançou mão de dados do Índice de Qualidade de Vida Urbana (IQVU), que rege a distribuição de recursos do orçamento para as Unidades de Planejamento de Belo Horizonte. Constatou que os idosos que vivem em áreas com infraestrutura igual ou maior a 0,8 (numa escala de 0 a 1) têm chance 4,2 vezes maior de independência com relação às atividades cotidianas na comparação com com os que vivem em áreas com índices menores.
Envolvida há muitos anos com saúde pública – participou de projetos no Mato Grosso do Sul e nos Estados Unidos, entre outros locais –, a fisioterapeuta ressalta que os idosos têm contribuído cada vez mais com o sustento das famílias e o cuidado com os netos. “Esse é mais um motivo para que o poder público providencie infraestrutura e serviços que viabilizem a vida social dos mais velhos, fazendo que eles sejam participantes ativos da sociedade. Mas não basta prover de condições materiais, é preciso que a cultura se transforme, para essas pessoas se sintam à vontade para sair às ruas e utilizar os equipamentos”, salienta a pesquisadora. “Ou seja, não adianta o ônibus estar adaptado às limitações dos mais velhos se o motorista não espera que ele entre com segurança e sociedade não compreende que ele precisa de um pouco mais de tempo para realizar essa tarefa.”
A análise dos números e das respostas dos idosos segundo as regiões da capital mostra que as diferenças são significativas na comparação entre bairros mais ricos e pobres. “O pano de fundo é, mais uma vez, a desigualdade social, que tem a ver com a falta de oportunidades de educação para todos”, opina Fabiane, que agora investiga o que motiva e o que permite que os idosos se mantenham no mercado de trabalho. A pesquisa esta relacionada ao pós-doutorado no Departamento de Fisioterapia da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Educacional da UFMG.
De Fabiane Ribeiro Ferreira
Orientador: Fernando Augusto Proietti
Programa de Pós-graduação em Saúde Pública