Universidade Federal de Minas Gerais

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Proposta de Código Penal moderniza e corrige distorções na legislação brasileira, diz professor da UFMG que ajudou a elaborar documento

sexta-feira, 29 de junho de 2012, às 7h32

Concluído e entregue formalmente na última quarta-feira, 27, ao Senado Federal, o anteprojeto do novo Código Penal brasileiro moderniza definições de crimes e de penalidades, além de reunir, em um único documento, leis atualmente esparsas. A comissão que elaborou o anteprojeto identificou 119 leis penais fora do Código, que passam a compor um único sistema.

Integrante da comissão responsável pela proposta, o advogado criminalista Marcelo Leonardo afirma que o anteprojeto corrige distorções, surgidas ao longo dos anos nas leis brasileiras, já que o arcabouço vigente tem nada menos que 72 anos.

Segundo ele, o grupo de juristas procurou dar orientação uniforme para a legislação e observar um princípio de proporcionalidade entre crimes e penas. “Em um sistema em que a legislação é toda esparsa, há algumas aberrações, frutos das reformas pontuais”, explica.

Professor da Faculdade de Direito da UFMG, Marcelo Leonardo cita o caso da pena de dez anos para falsificação de cosméticos, enquanto a mínima para homicídio é de seis anos. “Esse é um dos exemplos das distorções que a comissão procurou corrigir”, comenta.

Em entrevista ao Portal UFMG, o professor fala sobre o trabalho da comissão, cita crimes impensáveis na década de 1940, quando o Código foi criado, e diz esperar que o Congresso Nacional consiga chegar a um consenso e entregar ao país um sistema de leis condizente com a atual realidade. Contudo, pondera: “Ninguém pode fazer uma previsão de que o projeto será acolhido ou aprovado, porque já tivemos várias experiências anteriores de tentativas de reforma da legislação penal brasileira que foram frustrantes”.

Qual o papel de um código penal?
Na sociedade politicamente organizada, temos um conjunto de regras a que damos o nome de Direito, que regula a vida em sociedade. Em geral, os outros ramos do Direito, fora do Direito Penal, devem ser suficientes e adequados para permitir uma coexistência social pacífica. Mas às vezes as regras e as sanções previstas nesses outros ramos– direito civil, comercial, trabalhista, etc – não são suficientes para permitir que as pessoas cumpram as regras para garantir a paz social. E aí, em último caso, como última ratio, em relação aos bens jurídicos considerados mais importantes para a paz social e para a convivência humana em sociedade são violados ou ameaçados de lesão, vem o Direito Penal exercer a sua tutela.

Ele estabelece o que é crime e qual a respectiva pena, para advertir as pessoas de que aquela conduta não deve ser praticada e, se o for o caso, está sujeita àquela espécie de sanção. O Direito Penal está reservado para os casos mais graves, porque em geral os outros ramos do Direito é que devem regular a vida em sociedade.

O ideal seria, então, que ele fosse pouco utilizado?
Melhor seria que não se precisasse do Direito Penal.

O Código Penal brasileiro é da década de 1940...
O vigente Código Penal é de 1940 – foi editado por Getúlio Vargas, por meio de decreto-lei no período da ditadura. Desde a década de 1960 uma nova edição vem sendo pensada. Em 1984 houve uma reforma da parte geral do Código, que abrange os 120 primeiros artigos, que contêm as regras gerais aplicadas a todos os crimes. Quanto à parte especial, que é o catálogo de crimes e penas, nunca se conseguiu um consenso para a reforma. Tivemos comissões constituídas para rever a parte especial do Código Penal nas décadas de 70, de 80, de 90, comissões presididas pelos ministros Francisco de Assis Toledo, Luiz Vicente Cernicchiaro, Evandro Lins e Silva, com a participação de diferentes professores e outros operadores do Direito. Mas os temas são extremamente polêmicos, e o que se espera é que o Congresso Nacional procure o consenso ao discutir as propostas desse anteprojeto.

Por que o consenso é tão difícil?
Porque na definição de crimes e penas há opções de natureza filosófica, ideológica, religiosa e econômica. Basta imaginar algumas situações polêmicas como disciplina sobre aborto, eutanásia, drogas. Isso gera polêmica sempre. Por isso, nas tentativas anteriores de reforma – todas por iniciativa do Ministério da Justiça, isto é, do Poder Executivo – não houve consenso e elas não foram aprovadas. Agora, a iniciativa partiu de dentro do Congresso Nacional, porque o Senado Federal é que aprovou requerimento propondo a criação de comissão de juristas para preparar um anteprojeto do novo Código. Essa comissão teve sete meses para realizar seu trabalho, foi dividida em três subcomissões – uma para revisar a parte geral, outra para estudar a parte especial e a terceira para cuidar da legislação penal especial ou extravagante, isto é, a que está fora do Código Penal.

A criação de leis esparsas ocorreu devido às dificuldades de se fazer uma reforma profunda no Código?
O que aconteceu no Brasil nos últimos 40 anos foi a edição de várias leis especiais, tratando de determinados casos, a exemplo das leis antidrogas, de crimes ambientais, tributários, contra o sistema financeiro, e assim por diante. A análise feita pela comissão identificou 119 leis penais fora do Código Penal no Brasil. E uma das propostas da comissão foi incluir esses temas no texto do documento, para que ele fosse o centro do sistema, e também para assegurar duas coisas que afetam muito a legislação penal: orientação uniforme para a legislação, e o princípio de proporcionalidade entre crimes e penas. Em um sistema em que a legislação é toda esparsa, há algumas aberrações, frutos das reformas pontuais e sem uma unidade de sistema.

Que tipo de aberrações?
Houve uma alteração no Código Penal por conta de um caso concreto – e esse é outro problema seríssimo do parlamento brasileiro, que faz a reforma por conta da repercussão na mídia de um determinado caso concreto –, e o Congresso alterou a punição pela falsificação de medicamentos para a pena mínima de dez anos. E, descuidadamente, o dispositivo tratava não só da falsificação de medicamentos como de outras substâncias medicinais ou industriais. Com base nesse texto, a pura e simples falsificação de um xampu, de um cosmético, tem pena mínima de dez anos, superior à de um crime de homicídio – de seis anos –, que atinge a vida, o bem jurídico mais relevante das pessoas. Esse é um dos exemplos das distorções que a comissão procurou corrigir.

Qual o critério para definição de penas?
Na linguagem da Constituição de 1988, temos infrações penais de menor potencial ofensivo, punidas hoje com pena máxima de dois anos. A criminalidade de média gravidade tem pena máxima de quatro anos. E uma penalidade mais grave, de quatro a oito anos, ao lado daquilo que a Constituição chamou de crime hediondo. Em função dessa classificação, deve-se manter um princípio de proporcionalidade na fixação das penas. E ainda há uma questão: alguns benefícios somente podem ser concedidos dentro de determinados limites. Então, às vezes fixa-se uma pena para viabilizar que aquela infração esteja dentro de um rol que tem direito a um certo beneficio, ou não.

Que crimes eram impensáveis na década de 1940 e que agora são imprescindíveis no Código Penal? O anteprojeto elaborado pela comissão prevê capítulo destinado a crimes cibernéticos ou de informática. Nada disso existia em 1940. Alterar ou invadir um banco de dados de informática, captar senhas de acesso a banco de dados bancários para violar direito de correntista, nada disso existia naquela época e hoje é algo grave, que representa milhões de reais de prejuízos ao sistema financeiro como um todo, quer aos bancos, quer aos particulares. Essa é uma nova conduta reprovável que precisava estar criminalizada.

E quanto ao direito autoral? Em tempos de internet, o que muda?
Há previsão, no anteprojeto, de violação de direito de autor, de invento, de direito autoral. Isso já existe em legislação fora do Código, que agora está sendo incorporada ao anteprojeto.

Em sua opinião, o Brasil entra em outro patamar ao reorganizar essas leis?
Temos agora a possibilidade de reedição do Código Penal, reclamo que vem desde os anos 60. O novo Código põe o Brasil em novo patamar, de avanço, no sentido da modernização de seus principais códigos. O Senado Federal, particularmente na atual legislatura, está exercendo papel de protagonista na reforma dos principais códigos do Brasil. O Senado nomeou uma comissão para fazer um novo Código de Processo Civil. A comissão, presidida por um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, à época ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), preparou um anteprojeto, que o Senado converteu em projeto de lei, aprovou, e mandou para a Câmara dos Deputados. O Senado fez a mesma coisa com um projeto de Código de Processo Penal: nomeou comissão, que foi presidida pelo ministro Hamilton Carvalhito, do STJ. Essa comissão discutiu, debateu, preparou anteprojeto, cujo projeto de lei foi aprovado pelo Senado, e enviado para a Câmara, para votação. Foi constituída também no Senado uma comissão para fazer a revisão do Código de Defesa do Consumidor, presidida pelo ministro do STJ, Herman Benjamin, e a comissão já entregou o anteprojeto ao Senado. E há também uma comissão para elaborar o novo Código Eleitoral, presidida pelo ministro José Antônio Dias Toffoli, do STF.

Após a entrega do anteprojeto ao Senado, qual será sua tramitação?
Se o presidente do Senado, José Sarney, o converter em projeto de lei, ele tramitará primeiro no Senado e depois na Câmara dos Deputados. Mas estamos enfrentando uma realidade que é própria da política brasileira: o fato de que, na Câmara dos Deputados, esses projetos não estão tendo a mesma tramitação que tiveram no Senado. Porque tradicionalmente, mesmo depois da Constituição de 1988, a Câmara dos Deputados, que é a casa maior, atua muito em função das propostas apoiadas pelo Poder Executivo. O Ministério da Justiça infelizmente ainda não se posicionou sobre essas reformas, e elas estão tramitando lentamente na Câmara dos Deputados. Ninguém pode fazer uma previsão de que o projeto será acolhido ou aprovado, porque já tivemos várias experiências frustrantes.

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Como o senhor se sente ao participar da elaboração do novo Código?
Eu, pessoalmente, como advogado criminalista mineiro e professor da Faculdade de Direito da UFMG, onde leciono há 33 anos, fiquei extremamente honrado de ter sido convidado pelo presidente do Senado Federal para participar dessa comissão, sendo o único representante da comunidade acadêmica de Minas Gerais. E pessoalmente senti uma satisfação especial de, praticamente 30 anos depois, participar de reforma do Código Penal que, em 1984, foi objeto de uma reforma parcial por comissão de que fez parte o meu pai, Jair Leonardo Lopes, professor titular emérito de Direito Penal da Faculdade de Direito da UFMG. Ele tem mais de 60 anos de militância na advocacia e foi professor dessa Casa por mais de 35 anos, e hoje é o decano dos professores de direito penal do Brasil, porque graças a Deus ele está vivo e ativo profissionalmente e foi examinador e professor da maioria dos professores de Direito Penal que hoje militam no país e particularmente em Minas Gerais.

(Ana Rita Araújo)

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