Universidade Federal de Minas Gerais

Microscopista alia capacidade de operar máquinas complexas ao espírito investigativo

quinta-feira, 5 de julho de 2012, às 7h39

Os microscópios são ferramentas de trabalho tão ricas e complexas que sua manipulação tornou-se atividade altamente especializada. A formação do microscopista, contudo, não é fruto de um curso de graduação específico. Em geral começa na pós- -graduação, seguindo por caminhos múltiplos e escolhas individuais que exigem anos de dedicação em estudos teóricos e práticos.

Antes restrita a algumas linhas de pesquisa, a microscopia tornou- -se ferramenta multidisciplinar e indispensável em vastos campos do conhecimento. Atrai físicos, químicos, biólogos, engenheiros e outros profissionais que se encantam pelas possibilidades da área, ao utilizá-la inicialmente para pesquisas próprias.

Intermediário entre as complexas máquinas e o pesquisador que necessita ampliar a visualização de objetos e realizar análises quantitativas dos dados, o microscopista não é um mero operador de equipamentos. Além de dominar as técnicas de manipulação das amostras e todos os recursos que os vários tipos de microscópio oferecem, ele precisa manter aceso o espírito investigativo.

Segundo Douglas Rodrigues Miquita, pesquisador do Centro de Microscopia da UFMG contratado por convênio com a Petrobras, o trabalho de um microscopista vai além de apertar botões de um equipamento sofisticado. “Para obter resultados bons e confiáveis, o experimento deve ser conduzido com cuidado a fim de garantir que os resultados sejam interpretáveis, e essa interpretação não é simples”, lembra Miquita. E nessa complexidade reside a diferença entre a fotografia, que tem interpretação direta, e a imagem, cuja leitura exige um mediador especializado.

Ao viabilizar pesquisas de áreas como geologia, metalurgia, física e química, esse profissional torna-se colaborador atento e fundamental em estudos que alimentam o crescente mercado mundial de materiais nas escalas micro e nanométrica, que envolve tanto indústrias siderúrgicas, eletroeletrônicas, químicas, aeroespaciais, farmacêuticas e agrícolas, quanto a aplicação em diagnósticos clínicos.

Diretora do Centro de Microscopia da UFMG, a professora Elizabeth Ribeiro da Silva comenta que os microscópios, assim como os equipamentos para preparação das amostras a serem estudadas, são permanentemente aperfeiçoados para oferecer maior resolução e novas possibilidades de análise. “Continuamente temos que aprender tais técnicas e preparar projetos para adquirir novos equipamentos ou acessórios, porque nossos pesquisadores precisam dessas ferramentas para aprimorar sua capacidade de pesquisa.

Isso exige que o microscopista mantenha o espírito investigativo, sem o qual não será capaz de atender o pesquisador que busca seu trabalho”, explica. Elizabeth Ribeiro da Silva destaca que os técnicos que atuam na área precisam dedicar muito tempo ao próprio aprimoramento, para não se tornarem apenas repetidores de informação.

“Em grande parte das pesquisas em escala nanométrica, a obtenção da imagem é apenas o primeiro passo”, informa a professora Karla Balzuweit, coordenadora técnico-científica da área de materiais do Centro. Segundo ela, as amostras contêm informações que precisam ser lidas e interpretadas pelo microscopista, como estrutura, morfologia, textura, composição química e disposição dos átomos. “Por isso, investir em formação específica, em vez de limitar, amplia os conhecimentos desse profissional”, garante.

Trajetórias
“Fiquei fascinada ao enxergar, em um só instrumento, detalhes da estrutura cristalina da amostra, sua morfologia e, ao mesmo tempo, a composição química”, conta a microscopista Lis Melo, do Laboratório Multiusuário de Nanociências e Nanotecnologia (Labnano), do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio de Janeiro.

Mas para chegar a tal nível de detalhe, é necessário “conhecer bem o instrumento, por meio da sua operação, entender as teorias físicas por trás das técnicas e acessórios utilizados, e, principalmente, conhecer bem a amostra”, enumera a pesquisadora, que se prepara para fazer doutorado no qual pretende trabalhar exclusivamente com a técnica de microscopia eletrônica de transmissão.

Bacharel e licenciado em Física pela Universidade Federal de Viçosa e mestre em Física pela UFMG, onde atua como pesquisador do Centro de Microscopia, Douglas Rodrigues Miquita acredita que a maioria dos microscopistas escolhe essa área de trabalho depois de utilizar a técnica para pesquisas próprias. “Como muitos, fui apresentado a esse instrumento que me auxiliaria a entender meus resultados científicos. Devido à minha formação, pude vislumbrar o quão versáteis e poderosas são as técnicas que podem ser desenvolvidas em microscopia, principalmente eletrônica”, relata.

Se o ingresso na carreira é geralmente despertado pelo uso eventual dessas máquinas, a formação de um microscopista competente exige anos de dedicação. A professora Karla Balzuweit cita o professor Gustaaf Van Tendeloo, do Laboratório de Microscopia Eletrônica da Universidade de Antuérpia (Bélgica), como um dos 50 maiores microscopistas atuantes no mundo, com mais de mil artigos publicados sobre o tema.

Para quem deseja seguir os passos de Tendeloo, não há outro caminho a não ser estudar intensivamente, mas as trajetórias podem variar muito. Enquanto nos Estados Unidos e na Europa há diversos cursos avançados de dois anos, no Brasil a formação ocorre por meio de cursos de curta duração, em geral oferecidos por laboratórios e institutos de pesquisa, ou em workshops que integram congressos da área. Segundo Elizabeth Ribeiro da Silva, há cursos no Brasil considerados muito bons para a formação de microscopistas. Ela cita como exemplo o de microscopia eletrônica do Laboratório Nacional de Luz Sincroton (LNLS), em Campinas (SP).

Como ex-aluno, o físico Rodrigo Andrade, que faz estágio de pós-doutoramento no Centro de Microscopia da UFMG, conta que, apesar da grande carga teórica e da qualidade oferecidas nesse curso, “o estudante não retorna acreditando ser um perito”. O mais importante, diz ele, é que o curso “ajuda a desenvolver a percepção do grande volume de informação que ainda se tem para adquirir em relação à área”.

Na Universidade, alunos de graduação têm acesso a disciplinas básicas que procuram estimular o interesse pela área. “Somos vários professores, em diferentes unidades acadêmicas, atentos à oferta desse tipo de disciplina”, comenta a professora Nelcy Della Santina Mohallem, do Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas e vice-diretora do Centro de Microscopia da UFMG. Também são realizados cursos de curta duração, como o de Difração de Elétrons, organizado no campus Pampulha no final de 2011 no âmbito do programa Escola de Altos Estudos da Capes. O próprio Centro de Microscopia realiza periodicamente cursos de formação, com especialistas convidados de institutos de pesquisa e fabricantes dos equipamentos.

Mesmo oriundo de um país onde a formação de microscopistas já se consolidou, o norte-americano Gregory Kitten não considera ruim a falta de um curso formal. “é bom que as pessoas já tenham graduação e até mestrado antes de entrar na área”, opina. Professor do Departamento de Morfologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, Kitten é um exemplo de que os caminhos que levam à microscopia dependem muito mais de escolhas pessoais do que da oferta de cursos. Antes de se definir pela microscopia eletrônica, em 1974, o professor Greg passou pelo Direito, pela Biologia e pela Química.

“Não tinha certeza do que queria fazer, até que utilizei microscopia eletrônica em estágio durante minha graduação, no qual estudei estruturas de conservação de água nas folhas do algodão”, conta. “Acho que quase ninguém entra direto. Quase todos já têm formação e depois descobrem que gostam de microscopia”, acrescenta.

Da cirurgia ao mar
Extração de petróleo, chips para indústria eletrônica, construção de nanossistemas no vasto mundo da nanociência e uma infinidade de outras aplicações dependem, cada dia mais, da microscopia, mercado em expansão às voltas com a escassez de profissionais. As belas imagens geradas pelos microscópios contêm informações capazes de gerar economia de milhares de dólares ao definir, por exemplo, o melhor material para a construção de equipamentos a serem utilizados para escavar quilômetros abaixo do leito do mar.

Ou, ainda, fornecer dados que vão orientar um médico em delicada cirurgia ou um artista no trabalho de restauração de obras de arte. “A microscopia é hoje fundamento para várias áreas da ciência”, constata Gregory Kitten, que também integra o Conselho Diretor do Centro de Microscopia da UFMG.

De acordo com o biólogo Kinulpe Honorato Sampaio, a microscopia eletrônica pode ser aplicada em duas grandes áreas: ciências biológicas e ciências dos materiais. Na primeira, a ferramenta atende, por exemplo, a Medicina, com análises de biópsias para diagnóstico; a botânica, com estudos de material vegetal; a microbiologia, com análises de vírus, bactérias e das diversas possibilidades na pesquisa básica com tecidos e células.

Já na área de materiais, o microscópio eletrônico permite análises físico-químicas de grande diversidade de nanomateriais, além de revelar suas estruturas cristalinas ou amorfas. “A partir de caracterização bem detalhada, um restaurador pode datar uma antiga obra de arte, além de identificar e restaurar pigmentos que se aproximem daqueles utilizados originalmente”, exemplifica.

O requisitado profissional de microscopia pode encontrar salários invejáveis ou ter oferta de trabalho em empresas multinacionais antes mesmo de completar sua formação. “Recentemente, perdemos um excelente microscopista para uma indústria do ramo automotivo, pois o salário era bem maior do que nossa bolsa de pesquisa”, relata Nelcy Mohallem. Gregory Kitten calcula que a América Latina precisa hoje de pelo menos 500 bons microscopistas.

Formação ajuda
“Minha formação é em Física, o que facilita esse caminho, pois boa parte da base necessária para um microscopista envolve conhecimentos nessa área. Minha formação complementar, até o presente, envolveu cursos de curta duração feitos em congressos de microscopia e workshops, além de treinamentos realizados no Centro de Microscopia da UFMG, todos ministrados por professores e pesquisadores do exterior. Isso remete a outra exigência: o domínio de língua estrangeira, principalmente o inglês, até porque praticamente não há bibliografia na área em português.”
Erico Tadeu Fraga Freitas, funcionário do Centro de Microscopia da UFMG

Compreensão estrutural
“Comecei nessa ‘carreira’ ainda no mestrado, quando fiz uma disciplina de quatro meses em que tive contato com o básico da microscopia eletrônica, depois de varredura e finalmente de transmissão. São técnicas extremamente importantes e, para usufruir melhor dos nossos materiais e dos produtos dessa tecnologia, é essencial entendê-los estruturalmente. Precisamos de mais pessoas habilitadas nessa técnica, e só se consegue isso estudando.”
Lis G. de A. Melo, pesquisadora do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas

Rotina de novidades
“é preciso conhecimento dos conceitos associados ao funcionamento do equipamento, como a interação da radiação com a matéria, do mecanismo de formação da imagem e do modo de operação pelo qual os dados foram obtidos, uma vez que o equipamento é versátil e permite modalidades de trabalho distintas que são utilizadas em função da pergunta a ser respondida. São esses os principais fatores que fazem a vida de um microscopista uma rotina de aperfeiçoamento contínuo, com envolvimento em cursos, seminários e inovações tecnológicas.”
Douglas Rodrigues Miquita, pesquisador do Centro de Microscopia da UFMG contratado por convênio com a Petrobras

Filmes finos e nanomateriais
“Fiz graduação em Engenharia Química, mestrado em Engenharia de Materiais e doutorado em Química, na área de materiais nanoestruturados, todos na UFMG. Meu primeiro contato com a técnica foi no doutorado. Também fiz treinamento e curso de especialização na empresa Asylum Research, nos Estados Unidos, fabricante do microscópio de varredura por sonda que funciona no Centro de Microscopia da UFMG, onde trabalho há dois anos com análise de diversos tipos de materiais nanoestruturados, principalmente filmes finos, nanopartículas cerâmicas, nanotubos de carbono, grafeno e nanocompósitos.”
Luciana Moreira Seara, especialista em microscopia de varredura por sonda

Interesse começou na graduação
“Sou graduado em Ciências Biológicas pela UFMG, onde também fiz mestrado em biologia celular e doutorado em fisiologia. Meu primeiro contato com a microscopia foi na graduação, tanto na iniciação científica quanto em uma disciplina de microscopia eletrônica, ferramenta que utilizei em análises no mestrado. Minha trajetória é um exemplo de que o interesse pela área pode ser estimulado desde a graduação.”
Kinulpe Honorato Sampaio, microscopista concursado do Centro de Microscopia da UFMG

(Ana Rita Araújo)
Fonte: Revista Diversa, nº 19

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