Universidade Federal de Minas Gerais

“A fraude pode levar a ciência a uma direção errada”, diz Paulo Beirão

segunda-feira, 9 de julho de 2012, às 10h12


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Foto: Foca Lisboa/UFMG
Uma engenhosa montagem de ossos humanos e de orangotango foi saudada nos primeiros anos do século 20 como o “elo perdido” na evolução da humanidade. O chamado Homem de Piltdown, uma das mais emblemáticas fraudes da ciência, só foi desmascarado em 1953 graças aos métodos de datação com carbono radioativo desenvolvidos na época.

O caso, citado no relatório da Comissão de Integridade na Atividade Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), é uma prova do prejuízo que uma fraude pode trazer para o avanço da ciência, já que tende a induzir pesquisadores a enveredarem por caminhos errados, desperdiçando recursos financeiros e humanos. Somente o Homem de Piltdown amparou a produção de cerca de 500 trabalhos científicos.

No Brasil, a falsificação de resultados de pesquisa preocupa a comunidade científica, e o CNPq instituiu a Comissão de Integridade, que estabelece diretrizes e analisa denúncias de fraudes.

O grupo é coordenado pelo professor Paulo Sérgio Lacerda Beirão (foto), do ICB, atual diretor de Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde do CNPq. “Chegamos à conclusão de que era preciso tomar medidas e elas têm viés preventivo e corretivo no sentido de desestimular esse tipo de prática”, afirma Beirão, nesta entrevista ao Portal da UFMG, na qual fala sobre a preocupação do órgão em assegurar que os trabalhos científicos sejam produzidos em consonância com boas práticas.

Por que o CNPq decidiu criar uma comissão para garantir a integridade da atividade científica?
A preocupação de que trabalhos sejam publicados de acordo com boas práticas é permanente, mas nem sempre isso acontece. Chegamos à conclusão de que era preciso tomar medidas e elas seguem duas direções: a primeira, de caráter pedagógico, vai no sentido de evitar esse tipo de conduta. A ideia é que o CNPq sinalize com clareza o que é ou não aceitável. Outro viés é corretivo e está associado a medidas que possam desestimular esse tipo de prática. Isso é importante porque estamos em ambiente com alta competição por recursos.

Os casos de fraudes no Brasil têm crescido nos últimos anos?
É uma pergunta difícil de responder, porque não tínhamos um acompanhamento sistematizado. E agora é até possível que apareça um número de casos maior do que no passado. Não que tenha aumentado efetivamente, mas porque passaremos a contar com instrumentos para detecção. E um dos objetivos da comissão é desenvolver esses instrumentos. Com ela, as pessoas terão um canal para expor esse tipo de situação.

A comissão já se debruça sobre casos concretos?
Nós temos recebido denúncias e, num primeiro momento, a comissão deve estabelecer um fluxo de como tratar essas informações. Em relação a algumas coisas, poderemos desenvolver ações imediatas, desde que a fraude seja caracterizada, e outras vão depender de um estudo; talvez seja o caso de recorrer a especialistas para avaliar se determinado resultado experimental foi forjado, fabricado ou falsificado.

Percebe-se que a ciência brasileira ampliou sua inserção no cenário mundial nos últimos anos, o que mostra que há um crescimento da produção científica no Brasil em termos de escala. A fraude não seria também consequência dessa escala ampliada? Além disso, ela não poderia ser tomada como um efeito colateral da pressão que se exerce hoje para publicar mais, o chamado “publish or perish”?
Eu acho que essa pressão pode induzir pessoas de má índole a recorrer a práticas indevidas, mas ela não justifica esse tipo de conduta. O que nos preocupa é evitar que as pessoas se beneficiem de tal expediente, principalmente em um ambiente de competição de recursos. Quem infla indevidamente o currículo com fraudes, plágios e resultados falsificados pode se beneficiar dessa má prática. Por isso, é importante que as agências desenvolvam mecanismos para impedir que isso aconteça, mesmo que elas não empreguem os pesquisadores, caso do CNPq.

Até porque o CNPq financia boa parte dessa produção e tem que zelar pelo bom uso do recurso público...
Exatamente. Nós queremos aplicar o recurso público, que é pouco, da melhor maneira possível, ou seja, empregando em projetos desenvolvidos por pessoas capazes de fazer avançar o conhecimento, de gerar novas informações que serão importantes para a sociedade.

Que prejuízos as fraudes trazem para o avanço da ciência?
A fraude pode levar um esforço da comunidade científica a uma direção errada, resultando em desperdícios de recursos humanos e financeiros. Até se provar uma fraude, muito tempo e dinheiro foram gastos. A fraude é muito danosa e deve ser combatida de maneira enfática.

A comissão definiu quatro categorias de fraudes: falsificação, fabricação de resultados, plágio e autoplágio. As duas últimas, plágio e autoplágio, não seriam formas mais sutis e até sofisticadas? Como fazer para detectá-las?
No caso do plágio, ele não induz diretamente ao conhecimento errado. O prejuízo aí é de ordem humana, do reconhecimento do mérito da pessoa que produziu o conhecimento. Mas também há um prejuízo do ponto de vista da agência, que quer investir em pessoas capazes de produzir coisas novas, importantes e verdadeiras. No instante em que uma pessoa comete o plágio e a agência investe, inadvertidamente, nesse plagiador porque julga que ele foi capaz de produzir um conhecimento mais avançado, voltamos àquela questão do investimento do recurso público. E no caso do autoplágio, o problema é inflar um currículo com a mesmice, repetindo coisas já publicadas.

O famoso “corte e cola”...
Claro que precisamos tomar alguns cuidados nessa avaliação. Veja o caso, por exemplo, de um pesquisador que produz conhecimento e o publica em uma revista internacional. É desejável que ele também divulgue essa produção para o público leigo, o que obviamente não configura autoplágio; ele está divulgando a mesma coisa para públicos diferentes. Ou seja, na hora de se identificar um autoplágio não basta só recorrer a um software. O CNPq tem batido muito nessa tecla de valorizar o envolvimento de nossos cientistas na educação e popularização do conhecimento.

Em que medida os softwares são eficientes para detectar essas fraudes? Como usar esse tipo de instrumento sem correr o risco de ser injusto?
É um instrumento importante e valioso, mas não pode ser determinante. Vai ajudar a detectar plágios e autoplágios, mas a comissão dispõe de especialistas, de todas as áreas do conhecimento, para distinguir uma coisa de outra. Na pesquisa experimental, por exemplo, as publicações contam com uma seção que descreve o material e o método utilizados. Os métodos com frequência são os mesmos no mundo inteiro. Se um software é usado para analisar material e método de muitas publicações, vão surgir muitas informações iguais ou semelhantes que aparentemente configurariam casos de plágio e não são. Agora, se a mesma análise é feita na parte de resultados e encontram-se semelhanças, aí nos temos claramente um problema de plágio ou de autoplágio. O software tem que ser utilizado de maneira inteligente.

O senhor falou do foco preventivo, educativo, do trabalho da comissão, mas quando a fraude se confirma, de que tipo de instrumentos o CNPq dispõe para punir seus autores?
O CNPq só atua no seu âmbito. É importante que as pessoas saibam disso porque já recebemos denúncias de gente que não tem nenhuma relação com o CNPq. Aí não temos como agir. Dentro de nossa alçada, podemos advertir, em caráter privado, casos mais leves; inocentar quando a fraude não foi confirmada; cortar a bolsa do pesquisador e, em situações mais graves, pedir a devolução de recursos. Como não somos empregadores, não podemos demitir o empregado, mas a instituição com a qual ele mantém vínculo, sim.

(Flávio de Almeida)

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