A magia dos cantos e o mistério das falas da cultura negra ecoaram na Casa Chica da Silva nesta terça-feira. Como primeira atividade da série de seminários Os saberes e o bem comum, a Casa exibiu o documentário Terra deu, terra come, de Rodrigo Siqueira. O longa, vencedor de diversos prêmios nos anos de 2010 e 2011, como o É tudo verdade, um dos mais importantes no Brasil, e o Young Talent Competition - Generation DOK, tradicional festival de documentários da Europa. O filme acompanha a trajetória de Pedro de Almeida, garimpeiro de 81 anos, que comanda como mestre de cerimônias o velório, o cortejo fúnebre e o enterro de João Batista, que morreu aos 120 anos. O ritual se passa no Quilombo Quartel do Indaiá, distrito de Diamantina. A história parte da observação dessa situação para a compreensão da cultura desses cantos africanos conhecidos como vissungos, tradição herdada da África, que podiam ser ouvidos nos serviços de mineração nas cidades de Diamantina, São João da Chapada e Serro. Remanescentes Ivo Severino, conhecido como Seu Ivo, amigo de Pedro de Almeida, é outro remanescente dessa tradição. Ele esteve presente no seminário (na foto acima) que se seguiu à apresentação do documentário e junto com os professores César Guimarães, coordenador do Festival, e Sônia Queiroz, diretora de Ação Cultural, debateram a cultura dos vissungos enquanto prática cotidiana. Os cantos não são associados à música, mas a uma espécie de fala, praticada diariamente por homens e mulheres que insistem em preservar essa prática singular da cultura africana.
As cantigas também eram entoadas durante os rituais fúnebres da região, muito comuns nos séculos 18 e 19. A tradição, porém, está morrendo. Pedro de Almeida é um dos últimos conhecedores dos vissungos. Em 1943, o pesquisador Aires da Mata Machado Filho publicou o livro O negro e o garimpo em Minas Gerais, no qual já identificava apenas 65 vissungos na região.