Desenvolvido em parceria com pesquisadores do National Institute of Allergy and Infectious Disease (NIH), Bethesda (EUA), o estudo demonstra que em situações de perda do equilíbrio entre a flora intestinal e o organismo, as chamadas células T do sistema imune deixam de ignorar a existência de micróbios normalmente presentes nessa flora. Esse reconhecimento leva esse tipo de célula a se multiplicar para gerar novas células e produzir citocinas – proteínas responsáveis por induzir ou conter a inflamação. “O aumento do número de células e a produção de citocinas constituem a reação do sistema imune contra as bactérias da microbiota”, explica Liliane dos Santos. A bióloga, que atualmente realiza pós-doutorado sob a orientação da professora Leda Quercia Vieira, no Instituto de Ciências Biológicas (ICB), da UFMG, participou da pesquisa quando esteve no NIH em programa de Doutorado sanduíche, de 2009 a 2011. Sua tese de doutorado foi desenvolvida no Departamento de Bioquímica e Imunologia do ICB, com orientação da professora Yasmine Belkaid, do NIH. Tratamento O estudo utilizou camundongos especiais, como a linhagem transgênica Cbir1, na qual todas as células T reagem a apenas um tipo de bactéria da flora intestinal. O trabalho demonstra que a resposta imune a bactérias do intestino é importante porque pode ajudar a proteger o organismo contra parasitas. Tal resposta é ativada não apenas nesse momento, mas todas as vezes que a célula T entra em contato com a bactéria, devido à chamada resposta de memória, semelhante ao efeito produzido no organismo pelas vacinas. A pesquisadora também explica que, quando o organismo perde um tipo de bactéria intestinal devido ao uso de antibióticos, toda a resposta imune se modifica. Um tratamento alternativo deveria ser muito específico, porque se a reação do sistema imune contra a bactéria fosse retirada, o organismo perderia também parte da resposta protetora contra infecções causadoras do desequilíbrio. O estudo abre caminho para pesquisas que buscam, por exemplo, terapias eficazes contra doenças inflamatórias do intestino. “É possível que no futuro se consiga pensar uma maneira de impedir que a resposta imune aconteça, para evitar doenças inflamatórias intestinais, sem deixar de combater as bactérias”, comenta Liliane dos Santos, destacando que a pesquisa realizada no NIH não propõe terapias, apenas revela os mecanismos das infecções gastrointestinais. Artigo: Acute Gastrointestinal Infection Induces Long-Lived Microbiota-Specific T Cell Responses Autores: Timothy W. Hand (1), Liliane M. Dos Santos (1,2), Nicolas Bouladoux (1), Michael J. Molloy (1), Antonio J. Pagán (3), Marion Pepper (3,4), Craig L. Maynard (5), Charles O. Elson III (6) e Yasmine Belkaid (1). (1) Mucosal Immunology Section, Laboratory of Parasitic Diseases, National Institute of Allergy and Infectious Disease, NIH, Bethesda, USA
Foca Lisboa/UFMG
O reconhecimento anormal, pelo sistema imune, de bactérias presentes no intestino é uma das causas de doenças inflamatórias intestinais como a colite, afirma a pesquisadora da UFMG Liliane dos Santos, coautora de artigo publicado na edição de agosto da revista Science.
Na pesquisa, foi possível perceber que quando o equilíbrio é rompido – por uma infecção intestinal causada por um parasita, por exemplo -, as bactérias normalmente contidas no intestino se deslocam para outros órgãos. A partir daí, células chamadas apresentadoras de antígeno, como as dendríticas e os macrófagos, carregam partículas das bactérias até as células T, que fazem o reconhecimento.
(2) Laboratory of Gnotobiology and Immunology, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
(3) Microbiology, Immunology and Cancer Biology Program, University of Minnesota, Minneapolis, USA
(4) Department of Immunology, University of Washington, Seattle, WA 98195, USA
(5) Department of Pathology, University of Alabama-Birmingham, Birmingham, USA
(6) Mucosal HIV and Immunobiology Center, University of Alabama-Birmingham, Birmingham, USA