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Um dos principais desafios na elaboração de vacina contra o câncer é fazer com que o organismo reconheça o tumor como algo maléfico que precisa ser combatido. “Por não ser um intruso, mas algo próprio do corpo, o câncer não ativa o sistema imune de maneira eficiente”, explica a bióloga Caroline Junqueira, que conseguiu contornar essa dificuldade ao propor estratégia genética que utiliza o parasito Trypanossoma cruzi como veículo para levar uma proteína do câncer ao interior das células, onde será reconhecida e combatida. A intenção é forçar esse reconhecimento introduzindo parte do tumor em contexto que o associe a outros sinais de perigo, como o T. cruzi, causador da doença de chagas. “É como se fornecêssemos o retrato falado do procurado ao sistema imune, que passa a reconhecer o tumor e, consequentemente, a combatê-lo”, compara a pesquisadora, que ganhou este mês o Grande Prêmio de Teses UFMG 2012, na área de Ciências Agrárias, Ciências Biológicas e Ciências da Saúde. O estudo foi desenvolvido como tese de doutorado, sob orientação do professor Ricardo Gazzinelli. Testada em camundongos, a vacina é profilática e terapêutica e se mostrou eficaz como prevenção em 100% dos indivíduos vacinados, reduzindo o tumor em 65% dos casos, quando usada no tratamento. Atualmente no pós-doutorado, Caroline Junqueira se prepara para iniciar testes em modelo canino. “Já depositamos a patente, mas ainda estamos finalizando a prova de conceito em cães, animais mais complexos e cuja imunologia é muito parecida com a de humanos”, informa, acrescentando que antes de vislumbrar a transposição para pessoas, será possível chegar à vacina contra câncer canino. O trabalho vem sendo desenvolvido nos laboratórios de Imunoparasitologia, da UFMG, e de Imunopatologia, na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ambos coordenados por Gazzinelli. Proteína do câncer Ela pertence à família cancer testis de proteínas, expressas tanto em células tumorais (adultas) quanto nas do sistema reprodutivo, como testículos e placenta. No caso da vacina para cães, a pesquisadora vai introduzir também a proteína tirosinase, presente em grandes quantidades em melanoma canino. Em ambos os casos, ao ser geneticamente modificado, o parasito passa a carregar a proteína e, ao tentar combater a infecção de T. cruzi, o sistema imune induz resposta contra o antígeno do tumor. Tese: Clone não patogênico de Trypanosoma cruzi expressando antígeno tumoral como vetor vacinal contra o câncer (Boletim UFMG, edição 1796/Ana Rita Araújo)
O parasito utilizado por Caroline Junqueira é de uma linhagem de T. cruzi naturalmente atenuado, incapaz de causar infecção prolongada. Já a parte do tumor introduzida no parasito foi a proteína NY-ES0-1, presente em 85% dos tipos de câncer descritos.
Autora: Caroline Junqueira
Defesa: Programa de Pós-graduação em Bioquímica e Imunologia, em 2011
Orientador: Ricardo Tostes Gazzinelli