A crise econômico-financeira global acentuou padrões que marcam o sistema bancário brasileiro, focado em estratégias que buscam o lucro e concentram crédito nas regiões mais desenvolvidas. Por isso, é fundamental que os bancos públicos (e regionais) atuem nos espaços econômicos marginais, de forma distinta das instituições privadas e com administração diferenciada de riscos. No caso da Espanha, a segmentação do mercado bancário com presença de bancos regionais atenuaria os efeitos da crise, mas o recente processo de reestruturação bancária, marcado por fusões, aquisições e intervenções, tem provocado maior concentração do mercado e, consequentemente, redução do crédito para as regiões periféricas. Essas são algumas das constatações de pesquisa realizada no Centro de Estudos em Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar). O estudo será apresentado nesta quinta-feira, dia 30, às 8h, pela pesquisadora Fernanda Faria Silva, em sessão de trabalhos do 18º Encontro Nacional de Economia Política, realizado esta semana na Faculdade de Ciências Econômicas. “Sob nosso ponto de vista, a crise financeira instalada na Espanha não deverá ser resolvida com a reestruturação e o saneamento do setor bancário. A retomada do crescimento sustentável depende do resgate de projetos empresariais e de um sistema bancário eficiente e comprometido com uma economia de longo prazo”, afirma Fernanda Silva, que integra o Laboratório de Estudos em Moeda e Território (LEMTe). Neste trabalho, ela atua com o professor Marco Aurélio Crocco, a pesquisadora do Cedeplar Fabiana Santos e o economista Marco Duarte Filho. O objetivo do projeto, que gerou o artigo Crise financeira e sistema bancário: implicações e efeitos regionais para Brasil e Espanha, é analisar os desdobramentos da última crise financeira nos sistemas bancários brasileiro e espanhol. Segundo a pesquisadora, esse trabalho se justifica não apenas pela abrangência do fenômeno nos dois países, mas também porque a maioria dos estudos já divulgados não incorpora a dimensão regionalizada. “A escolha desses países se deve também às suas características semelhantes e às suas diferenças. Em comum, Brasil e Espanha apresentam grandes heterogeneidades regionais e, sob o ponto de vista do desenvolvimento do sistema financeiro, ambos têm economias do tipo bank based, na qual o setor bancário tem peso maior e o mercado de capitais é relativamente menos desenvolvido”, diz Fernanda Faria Silva. “Há também diferenças institucionais importantes (regime monetário, relações salariais e com o Estado, inserção internacional) e relacionadas à regulação, entre outras”, acrescenta a pesquisadora. Mercados segmentados “No caso espanhol, por outro lado, a segmentação favorece maior integração do sistema bancário com o desenvolvimento local em função da presença dos bancos regionais (como as cajas de ahorro). Essas instituições são essenciais sob o ponto de vista funcional, porque atendem às necessidades da economia real, através de empréstimos, por exemplo, sem pôr em risco o sistema econômico”, comenta Fernanda. Como decorrência da última crise financeira, o modelo espanhol está passando por processo de reestruturação, o que vem aumentando a concentração e reduzindo as cajas de ahorro. Como esse processo está ainda em curso, não estão claros seus impactos sobre as comunidades autônomas espanholas, mas já é possível inferir, segundo Fernanda, que as regiões periféricas poderão sofrer ainda mais com a retração na oferta de crédito. Embora, como lembra a pesquisadora, a agenda de investigação ainda esteja em aberto, já se pode trabalhar com fortes indícios de que o aumento de restrições no controle regulatório e a redução do número de instituições bancárias prejudicarão a oferta de recursos para as regiões menos desenvolvidas. Fernanda Faria Silva defende a necessidade de “resgatar negócios relacionados ao setor imobiliário e às outras atividades produtivas que sejam importantes nas regiões menos desenvolvidas, além de atentar para a maior preocupação com o financiamento das pequenas e médias empresas, que têm peso importante para a economia espanhola”. Entre os próximos passos da pesquisa, Fernanda Silva cita avanços na parte empírica, principalmente visando à melhoria de alguns indicadores, e a intenção de fornecer subsídios para novas discussões sobre a importância das instituições financeiras de atuação local para o desenvolvimento regional. “Pretendemos também aprofundar a inserção internacional do LEMTe, intensificando as relações de pesquisas com universidades iberoamericanas, em especial as espanholas”, conclui. (Itamar Rigueira Jr.)
Existem diferenças relevantes também quanto à segmentação do mercado bancário, segundo Fernanda Faria Silva. No Brasil, predominam grandes bancos múltiplos (públicos e privados), que atuam em escala nacional, sendo escassas as instituições regionais, o que dificulta o envolvimento do sistema com o desenvolvimento local. Fernanda observa também que as inovações financeiras não têm gerado estímulo à ampliação da oferta de crédito para as regiões economicamente menos desenvolvidas.