Universidade Federal de Minas Gerais

Luana Macieira/UFMG
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Winkler, Ahl e Werner: moral do herói clássico é complexa e exige reflexão

'O herói nem sempre é alguém que você gostaria de ter por perto', afirma especialista em literatura greco-romana

quarta-feira, 21 de agosto de 2013, às 5h51

O XI Seminário Internacional Archai: Deuses, homens e heróis – entre gregos e baianos encerra hoje as suas atividades na Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, no campus Pampulha. Durante três dias, o evento reuniu pesquisadores, cineastas, escritores e estudantes em conferências, debates e apresentações sobre memória e identidade, tendo como base a figura do herói e do anti-herói na literatura e filosofia greco-romanas.

O Portal UFMG conversou com três especialistas que estiveram no campus para participar do Seminário Archai: Frederick Ahl, professor de Estudos Clássicos e Literatura Comparada na Cornell University, nos Estados Unidos; Martin Winkler, coordenador da área de Estudos Clássicos e Latinos da Geoge Mason University, nos Estados Unidos; e Christian Werner, professor de Língua e Literatura Grega da Universidade de São Paulo (USP).

Os três falaram dos conceitos de herói e anti-herói e da relação dos jovens com a literatura clássica greco-romana.

Como é definido o clássico herói da literatura grego-romana?
Ahl: as pessoas costumam ter uma imagem muito positiva do herói. Nas literaturas romana e grega, um herói é primeiramente associado ao divino, visto como alguém descendente de um deus. O problema é que os deuses não são sempre boas pessoas segundo a tradição grega. Eles costumam, ainda, ter dúvidas sobre suas personalidades, além de apresentarem habilidades sobrenaturais que podem ser usadas tanto para o bem quanto para o mal. Como bom exemplo desse herói com duas faces greco-romano, podemos citar um herói que livrava seu povo de uma praga mas, ao mesmo tempo, massacrava e destruía sua própria família. Esse herói nem sempre é alguém que você gostaria de ter por perto.

Winkler: se montar um quadro dos heróis nas literaturas grega e romana clássicas, você percebe que as pessoas veem o herói como um grande lutador, que se torna famoso e importante à medida que enfrenta o mal. Mas o herói é uma pessoa que muitas vezes está associado a uma existência solitária e isso pode aumentar o seu lado obscuro. Ele acaba possuindo um “dark side” (lado negro). Como esse “lado negro” está ligado ao seu “lado branco”, de pessoa boa, o herói acaba por apresentar características nem sempre positivas.

O herói dos romances clássicos brasileiros se assemelha a esse herói grego-romano?
Werner: O herói na literatura clássica é alguém que está ligado ao passado e é uma figura de alguns gêneros literários. Em outros gêneros, os autores costumam usar o herói de uma forma diferente da que ele aparece na literatura clássica grego-romana. Grande Sertão Veredas, de Guimarães Rosa, por exemplo, é um épico bem clássico, um romance épico com heróis e anti-heróis.

Como estes heróis e anti-heróis clássicos se manifestam no cinema?
Winkler: Os Estados Unidos, por exemplo, fazem filmes que ilustram bem os perfis de heróis e anti-heróis de todos os tempos. Em geral, o cinema americano, como nos filmes de japoneses e samurais, é muito icônico, pois os heróis estão sempre conectados à história do país, à colonização e ao que o país viveu. Ao retratar a história, esse cinema toca em um ponto delicado: qual é a responsabilidade do herói? Ele pode matar? Pode começar uma guerra? Essas questões são complexas, pois têm a ver com o psicológico do herói e com o seu “dark side”, que acaba aparecendo muitas vezes.

Com a história de muitos heróis clássicos sendo contada nos cinemas, muitas pessoas perdem o interesse de ler os livros que relatam suas epopeias. A perda de leitores interessados nesses clássicos chega a preocupar?
Ahl: o herói e o anti-herói estão muito presentes na cultura moderna. Os heróis antigos são usados muito no ensino atual porque são vistos como modelos. Porém, os romances épicos acabam sendo mais lidos na academia mesmo. Os heróis dos clássicos nem sempre são os heróis que você gostaria de ter por perto e que servem de modelo de bom comportamento. O que temos que fazer é mostrar a complexidade da moral do herói nos textos clássicos; eles não devem ser simplesmente lidos pelos jovens, mas sim debatidos e estudados.

Weiner: no Brasil, estamos melhor que há 50 anos. Temos mais traduções dos clássicos e algumas são feitas em uma linguagem que tem apelo aos jovens. As traduções não são mais tão complicadas como costumavam ser e você tem outras mídias que atraem o interesse dos jovens para os clássicos, como quadrinhos e filmes, como o Troia, por exemplo. Traduzir clássicos com uma linguagem mais moderna ajuda bastante nesse processo de criação de interesse por esse tipo de literatura.

(Luana Macieira)

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