Sarah Dutra/UFMG |
Pesquisas sociológicas que identificam afinidades e diferenças de costumes entre os povos tendem a ser caras e demoradas. Com o objetivo de facilitar a coleta de subsídios para esse tipo de estudo, o doutorando do Departamento de Ciência da Computação da UFMG Thiago Henrique Silva desenvolveu técnica de mineração de dados que usa informações compartilhadas em redes sociais para descrever hábitos culturais. O trabalho, descrito no artigo The data mining techniques that reveal our planet’s cultural links and boundaries, foi publicado na MIT Technology Review, revista do conceituado Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos Estados Unidos. "Essa técnica permite extrair padrões de grandes volumes de dados. Na minha pesquisa de doutorado, usamos informações compartilhadas pelos usuários do Foursquare, rede social em que as pessoas divulgam os lugares que frequentam fazendo o chamado check-in, para descrever seus hábitos alimentares", diz Silva. Seu artigo é um desdobramento de pesquisa que desenvolve em parceria com os professores da UFMG Antonio Loureiro (orientador no doutorado), Pedro Vaz de Melo e Jussara Almeida, co-orientadores, além de Mirco Musolesi, da Universidade de Birmingham, da Inglaterra. O estudo se baseia no princípio do sensoriamento do ambiente feito por meio dos dispositivos móveis de quem acessa o Fousquare. Partindo da premissa de que hábitos alimentares são capazes de diferenciar culturalmente os povos, Silva coletou 280 mil check-ins relacionados a lugares aonde as pessoas vão para beber, mais de 400 mil associados a restaurantes fast-food e outros 400 mil que faziam referência a idas a restaurantes tradicionais. Os ambientes foram divididos em 21 categorias para bebidas e 80 para comida, como bar, pub, restaurante japonês e restaurante indiano. Segundo o pesquisador, os lugares frequentados pelas pessoas revelam muito sobre sua cultura. "Comparamos os hábitos de um número grande de pessoas separadas geograficamente no globo, uma vez que coletamos check-ins de diversos países. Se essa pesquisa fosse realizada da forma tradicional, com cientistas sociais aplicando questionários, provavelmente os mesmos resultados seriam alcançados, mas de forma muito mais demorada e custosa", explica. A eficácia do método que compara as informações do Foursquare por meio de gráficos foi comprovada quando Thiago Silva comparou os resultados de seu trabalho com os divulgados pela World Values Survey (WVS), pesquisa mundial realizada entre os anos de 1981 e 2008, por meio de entrevistas com mais de 250 mil pessoas de 87 países. “Confrontamos nossos dados com os da WVS e constatamos que os hábitos observados pelos moradores dos diversos países analisados foram muito similares. Isso mostra que, com os dados coletados em uma semana, fomos capazes de chegar praticamente ao mesmo resultado obtido pela WVS, que usou os métodos tradicionais de aplicação de questionários em um trabalho de pesquisa que durou quase três décadas”, exemplifica Silva. Thiago Silva acrescenta que a técnica desenvolvida em sua pesquisa poderá vir a ser de grande utilidade para cientistas sociais e antropólogos. “Ela permite, por exemplo, observar variações culturais de um ano para outro, analisando a mudança de dados em curtos intervalos de tempo”, diz. Para o doutorando, a ”garimpagem” em redes sociais para comparações de hábitos de usuários pode ter outros desdobramentos. Um deles é a criação de aplicativos para smartphones que filtram locais de interesse. “Com o tipo de dado que trabalhamos, temos o poder de entender melhor as cidades. Assim, podemos criar novos aplicativos, por exemplo, para recomendação de regiões, de acordo com as preferências do usuário. Um turista que está em Londres poderia encontrar locais que se assemelham aos que frequenta em Belo Horizonte”, exemplifica. Tão longe, tão perto “Vimos que no Brasil as pessoas costumam ir aos mesmos lugares, nos mesmos períodos do dia. Além disso, os locais visitados por brasileiros têm perfil semelhante aos frequentados pelos habitantes dos Estados Unidos, o que já esperávamos por se tratar de um país que exerce forte influência sobre nós”, aponta o doutorando. O pesquisador destaca, também, afinidades que ligam os brasileiros aos franceses. “Percebemos que os franceses têm muitos mais hábitos parecidos com os dos brasileiros do que com os dos ingleses, de quem estão muito mais próximos geograficamente. Essa é mais uma prova de que a proximidade geográfica não é tão determinante quando se trata de hábitos culturais”, conclui Thiago Henrique Silva. Artigo: The data mining techniques that reveal our planet’s cultural links and boundaries (Luana Macieira/Boletim 1860)
Além de coletar dados de base geográfica do Foursquare, Thiago Silva desenvolveu gráficos comparativos entre as regiões brasileiras e entre o Brasil e outros países, como França, Estados Unidos e Japão. Uma das constatações da análise dos dados é que, apesar das dimensões do país, as preferências dos brasileiros em relação à comida e bebida tendem a ser bem parecidas, não importando se a pessoa mora no Norte ou no Sul.
Autor: Thiago Henrique Silva
Publicado na MIT Technology Review no dia 8 de abril e disponível em http://www.technologyreview.com/view/526261/the-data-mining-techniques-that-reveal-our-planets-cultural-links-and-boundaries/.