Diferentemente do que a distribuição dos espaços de circulação permite supor, a maioria das pessoas não utiliza veículo particular para fazer os seus deslocamentos nas cidades. Segundo dados da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), apenas 30% das pessoas se valem de carros e similares para se deslocar. Outros 30% utilizam o transporte público para ir de um ponto a outro da cidade. O dado mais surpreendente, no entanto, é o que representa numericamente os cidadãos que se deslocam a pé: eles somam 40% da população. “A distribuição das vias e espaços da cidade não reflete essa realidade. São dados que demonstram desequilíbrio na forma como a cidade é estruturada em relação a cada sistema modal”, ressalta Natália Garcia, do projeto Cidades para Pessoas. Natália Garcia, que visitou diversas cidades do mundo para colher experiências urbanas positivas e inovadoras, participou do Encontro Temático sobre Mobilidade Urbana, realizado na manhã desta terça-feira no auditório da Reitoria. Ela dividiu o palco do auditório com representantes de outros movimentos que trabalham em favor de mudanças na forma como as cidades se estruturam em relação à mobilidade e ao urbanismo. Representantes do BH em Ciclo (associação dos ciclistas urbanos de Belo Horizonte) refletiram sobre o uso da bicicleta na cidade e fizeram balanço preliminar sobre a experiência de uso das bicicletas compartilhadas durante o Festival. Outro coletivo representado foi o Basurama, de atuação internacional, que realiza projetos de arte e design com resíduos dos processos de produção da sociedade de consumo. Inclusão social Júlia lembrou uma realidade muitas vezes desconhecida das periferias e regiões menos abastadas das cidades. “Mais de 5% da população das grandes cidades do Brasil não utilizam o transporte público simplesmente porque não têm como arcar com os custos da tarifa. Portanto, no que diz respeito ao direito à cidade e à inclusão social, é crucial que o usuário deixe de pagar o transporte no momento em que usa”, afirma. Para ela, o custo da tarifa limita o direito de ir e vir. Em sua pesquisa para o projeto Cidades para Pessoas, Natália Garcia buscou investigar justamente outras possibilidades de construção do urbano mundo afora, de forma a superar a dedicação prioritária ao trânsito de veículos. “No decorrer da história, para que as vias destinadas a veículos ganhassem linearidade, as vias reservadas, por exemplo, ao deslocamento a pé perderam linearidade. E o pior é que sai mais caro para a cidade que as pessoas andem de carro que por outros meios de locomoção, como bicicletas, ou a pé. É preciso repensar essa engrenagem”, pontua. As conversas do Encontro Temático sobre Mobilidade Urbana foram mediadas pela professora Rita Velloso, da Escola de Arquitetura da UFMG, que coordena o Observatório das Metrópoles e pesquisa questões relacionadas a política e ocupação do território.
Integrantes do movimento Tarifa Zero BH, de Belo Horizonte, também participaram do Encontro Temático. Júlia Nascimento, mestranda em Arquitetura na UFMG e integrante da iniciativa, participou da mesa de debates e falou sobre a necessidade de mudança na compreensão do transporte público no contexto das cidades. “Precisamos deixar de entender o transporte como mercadoria e passar a encará-lo como direito, tal como saúde, educação, o que de fato ele é. Essa é a pauta do Tarifa Zero.”