Universidade Federal de Minas Gerais

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Jorge Pinto: problemas mais sutis, como aceitação do diagnóstico e adesão ao tratamento

Grupo de pesquisa da Faculdade de Medicina reduz a zero índice de transmissão do vírus HIV de mãe para filho

quarta-feira, 12 de novembro de 2014, às 7h46

Portadora do vírus da imunodeficiência humana (HIV), Alessandra, de 23 anos, foi infectada pela própria mãe na chamada transmissão vertical – que ocorre durante a gravidez, o parto ou a amamentação – e planeja ter filhos, com a segurança de que não transmitirá o vírus a eles. Sua convicção está amparada na experiência de 25 anos do grupo de pesquisa da Faculdade de Medicina no qual Alessandra e outros 540 pacientes soropositivos recebem acompanhamento sistemático.

“Estamos na terceira geração do HIV. Algumas das meninas que chegaram ao ambulatório pediátrico já tiveram filhos, felizmente com zero índice de transmissão”, informa o coordenador do projeto, professor Jorge Andrade Pinto, do Departamento de Pediatria.

O trabalho, que começou de forma assistencial em 1989 – seis anos após a descrição do primeiro caso de aids em criança no mundo –, ampliou a atuação para ginecologia e obstetrícia, tornando-se um dos fortes aliados do Ministério da Saúde e da Organização Mundial de Saúde (OMS) para o estabelecimento de consensos terapêuticos nacionais e internacionais que definem a atualização das recomendações de tratamentos, diagnósticos, modelos de expansão de testagem e políticas públicas.

“Trata-se certamente de uma das coortes mais antigas e numerosas do Brasil”, observa o coordenador, consultor do Ministério da Saúde, desde 1993, e da OMS, há dez anos.

Até agosto passado, Jorge Pinto havia orientado ou coorientado 29 dissertações de mestrado e 15 teses de doutorado, além de dezenas de artigos publicados em revistas científicas, produzidos com base na estrutura de coorte sistemática. “Isso favoreceu uma avaliação histórica de tendências temporais e de evolução do processo de uma epidemia que começou com a identificação dos primeiros casos em 1981”, comenta o professor.

Ele destaca que, em cerca de 20 anos, a comunidade científica mundial partiu “do tempo zero de uma doença desconhecida”, identificou o agente etiológico, estabeleceu teste diagnóstico e formas de tratamento, chegando à redução drástica de mortalidade.

Desafios
Jorge Pinto explica que a aids é hoje uma doença crônica, como diabetes e nefropatias, e pondera que uma série de dificuldades já foram ultrapassadas.“Sabemos como bloquear a transmissão vertical, como tratar essas crianças precocemente, quais drogas utilizar, como lidar com elas do ponto de vista nutricional e de imunização. Agora temos problemas mais sutis, que dizem respeito a comportamentos, como aceitação da revelação diagnóstica e adesão ao tratamento”, avalia.

Ele destaca que esses pacientes terão de tomar medicação para o resto da vida e vê com naturalidade a postura contrária ao tratamento demonstrada por adolescentes. “São problemas próprios do jovem que vive uma condição crônica, não da doença em si. Mas estamos buscando novas drogas e intervenções que facilitem a adesão”, diz.

Alessandra, que perdeu a mãe quando tinha quatro anos, conta que aos 12 passou por essa fase e parou de tomar os medicamentos. “O que me ajudou muito foi a participação em grupos de apoio a adolescentes mantidos pelo Hospital das Clínicas. Lá, percebi que era difícil não apenas para mim, que morava em abrigo, mas também para os que tinham família estruturada”, relata.

Em estudos ­colaborativos como os que o grupo mantém com o Instituto Nacional de Saúde (National Institutes of Health), dos Estados Unidos, os pesquisadores buscam opções terapêuticas para os pacientes que não mais respondem às medicações atualmente disponíveis.

“Outro aspecto importante diz respeito a como estamos preparando esses adolescentes para a vida adulta, para uma inserção produtiva na sociedade”, afirma Jorge Pinto. De natureza multidisciplinar, o grupo de pesquisa também investiga os aspectos psicossociais dessa população, com o intuito de ajudá-la a lidar com as comorbidades psiquiátricas e metabólicas derivadas do uso prolongado de medicação.

Um desses trabalhos, coordenado pelo professor Vitor Haase, do Departamento de Psicologia, procura identificar o desempenho neuropsicológico de crianças e adolescentes brasileiros infectados verticalmente e que foram submetidos à terapia antirretroviral (leia abaixo).

Ganhos
Embora o trabalho tenha obtido êxito completo com as jovens que participam continuamente do estudo, a taxa de transmissão vertical registrada pelo grupo ainda é de 2%, devido aos casos de mulheres identificadas como portadoras no final da gestação, e até em trabalho de parto, que não passaram pelo pré-natal no Sistema Único de Saúde. “São usuárias de drogas e moradoras de rua. É muito importante melhorar o acesso dessa população ao serviço”, adverte o pesquisador.

Para Jorge Pinto, o manejo adequado, que reduziu a taxa de transmissão, se configura como uma das medidas mais efetivas do processo. Segundo ele, na ausência de intervenção, a transmissão vertical gira em torno de 25%. “Um dos artigos que publicamos há alguns anos mostra que a tendência temporal de transmissão na nossa coorte caiu daquele índice para 2%, em cerca de oito a dez anos, e permanece baixa na última década”, relembra.

O bloqueio da transmissão vertical da infecção é composto basicamente por três medidas: terapia antirretroviral para a mãe desde o primeiro trimestre de gestação, com a finalidade de assegurar que ela chegue ao parto com carga viral baixa ou negativa; manejo da via de parto, optando-se pelo normal apenas se a viremia plasmática estiver indetectável; e oferecimento de fórmula láctea artificial para o bebê, para evitar a ingestão do leite materno.

“Essas três medidas combinadas resultam na potencial erradicação da transmissão vertical. E é isso o que estamos vendo: nosso número de pacientes novos infectados caiu drasticamente, e por isso nossa coorte envelheceu. A mediana de idade agora é de 11 anos”, explica o professor.

Apesar do preconceito, a experiência com o HIV e com a aids trouxe ganhos sociais nunca antes experimentados, afirma Jorge Pinto. Como exemplo, ele cita o forte lobby empreendido pelos portadores, que inspirou a organização de movimentos reivindicatórios relacionados a outras doenças, como as hepatites.“O grupo de usuários assume um papel fundamental, o que é um subproduto positivo da epidemia”, avalia.

Ele também cita o avanço da imunologia, contribuindo para que sejam mais rápidas as respostas a novas epidemias. “A estrutura de pesquisa nacional e internacional foi muito fortalecida pelo investimento em HIV. Isso permite que os investigadores possam se valer dela na busca por respostas para uma nova infecção, seja qual for, mesmo a de um vírus completamente diferente, como é o caso do ebola”, opina Jorge Pinto.

Terapia elimina transtornos cognitivos
Reconhecidos desde o ­início da epidemia, os transtornos cognitivos em bebês verticalmente infectados com o HIV têm sido suprimidos pelo uso correto de medicamentos, constata pesquisa coordenada pelo professor Vitor Haase, do ­Departamento de Psicologia, ao avaliar as funções neurológicas de crianças da coorte coordenada pelo professor Jorge Pinto.

O pesquisador explica que, antes da adoção de terapia antirretroviral eficaz, grande número dessas crianças apresentava quadros graves de comprometimento neurológico, como microcefalia, alterações motoras, crises convulsivas e retardo mental. “Casos assim hoje são bem mais raros. Esses pacientes estão evoluindo bem e se desenvolvendo”, atesta, lembrando que alguns, já no início da vida adulta, vêm sendo acompanhados desde o início da década de 2000, quando foram introduzidos, no programa brasileiro de aids, medicamentos antirretrovirais altamente eficazes.

Tais resultados instigaram a equipe a realizar nova pesquisa, com métodos mais avançados de avaliação neuropsicológica. Segundo o pesquisador, no estudo atualmente em andamento, objeto de tese de doutorado de Gustavo de Val Barreto, são utilizados métodos computadorizados com medidas dos tempos de reação dos pacientes a determinados estímulos.

Um dos aspectos que têm sido observados é o impacto da doença sobre o desempenho escolar. No artigo Funções executivas e velocidade de processamento em crianças e adolescentes brasileiros infectados por HIV, publicado no início deste ano, Haase e colaboradores referem-se à “comprovada diminuição da incidência de encefalopatia associada ao HIV”.

O estudo também constata que, apesar das situações de estresse a que são submetidas essas crianças – muitas foram abandonados pela família ou perderam a mãe por causa da aids –, “não há evidências de que elas tenham mais ansiedade, depressão ou problemas de comportamento do que a população em geral”. Elas também não têm incidência maior de doenças mentais, reitera Vitor Haase.

O professor alerta, contudo, para a necessidade de programar uma assistência educacional especializada para os jovens que não se beneficiaram das modernas terapias antirretrovirais e que possuem déficits cognitivos. “Um número cada vez maior deles está atingindo a idade adulta e precisa se qualificar para o mercado de trabalho”, justifica Hasse.

Grupo de pesquisa HIV/aids maternoinfantil
Coordenador: Jorge Pinto, professor do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina
As atividades são desenvolvidas no Centro de Treinamento e Referência (CTR) em Doenças Infecciosas e Parasitárias (DIP) do Hospital das Clínicas e envolvem os departamentos de Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia, Propedêutica Complementar e Psicologia – que inclui o Laboratório de Neuropsicologia do Desenvolvimento. Parcerias: Prefeitura de Belo Horizonte, Ministério da Saúde, Laboratório Farmacêutico Federal Farmanguinhos, National Institutes of Health (NIH) e Organização Mundial da Saúde (OMS).

(Ana Rita Araújo/Boletim 1884)

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