Rosânia Felipe/Escola de Enfermagem |
As condições de acesso, a deficiência das políticas públicas de abastecimento de alimentos e a crescente supressão do jantar pelas famílias brasileiras são alguns dos fatores que prejudicam o consumo de frutas e hortaliças, conclui pesquisa desenvolvida no Departamento de Nutrição da Escola de Enfermagem da UFMG. Realizado na capital mineira, o estudo Consumo de frutas e hortaliças em serviços de promoção da saúde de Belo Horizonte, Minas Gerais é iniciativa do Grupo de Pesquisas de Intervenções em Nutrição, da Unidade. De caráter quantitativo e qualitativo, envolveu, nos anos de 2013 e 2014, pessoas com pelo menos 20 anos que frequentavam 18 polos do Programa Academia da Saúde (PAS), mais conhecido como Academias da Cidade, e as imediações desses serviços. Com base em entrevistas, foi realizada, em uma primeira etapa, ampla investigação sobre o consumo de frutas e hortaliças pelos usuários. O levantamento identificou o perfil socioeconômico dos indivíduos, condições e percepção de saúde, prática de exercício físico, hábitos alimentares, perfil de compras e técnicas empregadas na manipulação e armazenamento e verificou as representações sociais quanto ao consumo desses alimentos. O ambiente alimentar também foi investigado, incluindo a identificação dos locais de comércio de frutas e hortaliças, georreferenciamento e caracterização desses estabelecimentos em relação a fatores como condições higiênico-sanitárias, qualidade, variedade, preço de frutas e hortaliças e alimentos ultraprocessados, assim como a presença de publicidade e ações coletivas de incentivo ao consumo de frutas e hortaliças nos territórios do Programa Academia da Saúde. Sob a coordenação da professora Aline Cristine Souza Lopes, a equipe que desenvolveu o estudo visitou 336 estabelecimentos comerciais da capital. De acordo com ela, a distância entre a casa do consumidor e os locais de venda de frutas e hortaliças e a qualidade dos produtos oferecidos são variáveis que pesam na decisão de quais alimentos vão compor as refeições. “O fácil acesso, tanto em relação à distância quanto à qualidade dos alimentos, contribui para a maior aquisição e consumo de alimentos saudáveis, como frutas e hortaliças”, informa a pesquisadora, destacando que esses indicadores são mais satisfatórios nas regiões centrais da cidade e pioram à medida que a análise se desloca para áreas mais periféricas. Perfil dos entrevistados Em geral, os entrevistados associaram o consumo de frutas e hortaliças a efeitos benéficos à saúde e ao paladar. No entanto, as quantidades recomendadas para a ingestão ainda são desconhecidas de boa parte dos usuários. A falta de vontade e/ou esquecimento (39,5%), a falta de hábito (28,7%) e o costume de não jantar (42,6%) foram obstáculos mencionados para justificar o não consumo desses alimentos. Além disso, 43% dos entrevistados alegaram que realizar refeições fora de casa interfere negativamente no consumo de frutas e hortaliças. Almoço e jantar são as refeições em que há mais possibilidade de consumo de hortaliças. Contudo, observa a professora Aline Lopes, o costume de jantar vem se tornando cada vez mais raro. “A crença, errônea, de que refeições noturnas são responsáveis pelo aumento de peso tem levado as pessoas a abandonar o hábito de jantar, substituindo-o por lanches, que podem ser menos saudáveis. Isso tem reduzido o consumo de frutas e hortaliças e, por vezes, prejudicado a qualidade nutricional da refeição”, avalia a professora. Aline Lopes defende a ampliação das políticas públicas de abastecimento de alimentos por meio de feiras livres e sacolões. “As unidades do programa ABC estão, geralmente, em áreas mais centrais. Em média, os participantes da pesquisa residiam a 319 metros de estabelecimentos comerciais, mas em áreas mais afastadas, como as regiões Norte e Barreiro, essa distância praticamente dobrava”, exemplifica. Segunda etapa Academias da Cidade (Rosânia Felipe, jornalista da Escola de Enfermagem, e Victor Alves, bolsista de jornalismo. Com colaboração de Fred Lamêgo, jornalista das Redes Sociais da UFMG. Matéria publicada na edição 1918 do Boletim UFMG)
Foram entrevistadas 3,4 mil pessoas. Eram, em sua maioria, mulheres (88,1%) e com excesso de peso (62,7%). Boa parte dos participantes informou ter doenças, como hipertensão arterial (53,2%), diabetes mellitus (44,1%) e dislipidemias (16,9%). A maioria relatou manter o hábito diário de consumir frutas (62%) e hortaliças (72%).
Os dados qualitativos relativos ao território subsidiaram a segunda etapa da pesquisa – o planejamento e a aplicação de ações de incentivo ao consumo de frutas e hortaliças. A intervenção, que durou sete meses, contemplou experiências culinárias, degustação de frutas e hortaliças, intervenções no ambiente dos serviços e distribuição de material educativo.
Implantado nacionalmente, o Programa Academia da Saúde (PAS) é constituído por polos do Sistema Único de Saúde com infraestrutura, equipamentos e quadro qualificado para orientação de práticas corporais, atividade física e de lazer, alimentação saudável, segurança alimentar e nutricional, entre outros aspectos. A capital mineira conta com 63 unidades do programa.