Universidade Federal de Minas Gerais

Rosânia Felipe/Escola de Enfermagem
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Aline Lopes: distância até os locais de venda pesa na decisão do consumo

Estudo da Escola de Enfermagem analisa obstáculos que dificultam o consumo de frutas e hortaliças entre os belo-horizontinos

segunda-feira, 9 de novembro de 2015, às 5h50

As condições de acesso, a deficiência das políticas públicas de abastecimento de alimentos e a crescente supressão do jantar pelas famílias brasileiras são alguns dos fatores que prejudicam o consumo de frutas e hortaliças, conclui pesquisa desenvolvida no Departamento de Nutrição da Escola de Enfermagem da UFMG.

Realizado na capital mineira, o estudo Consumo de frutas e hortaliças em serviços de promoção da saúde de Belo Horizonte, Minas Gerais é iniciativa do Grupo de Pesquisas de Intervenções em Nutrição, da Unidade. De caráter quantitativo e qualitativo, envolveu, nos anos de 2013 e 2014, pessoas com pelo menos 20 anos que frequentavam 18 polos do Programa Academia da Saúde (PAS), mais conhecido como Academias da Cidade, e as imediações desses serviços.

Com base em entrevistas, foi realizada, em uma primeira etapa, ampla investigação sobre o consumo de frutas e hortaliças pelos usuários. O levantamento identificou o perfil socioeconômico dos indivíduos, condições e percepção de saúde, prática de exercício físico, hábitos alimentares, perfil de compras e técnicas empregadas na manipulação e armazenamento e verificou as representações sociais quanto ao consumo desses alimentos.

O ambiente alimentar também foi investigado, incluindo a identificação dos locais de comércio de frutas e hortaliças, georreferenciamento e caracterização desses estabelecimentos em relação a fatores como condições higiênico-sanitárias, qualidade, variedade, preço de frutas e hortaliças e alimentos ultraprocessados, assim como a presença de publicidade e ações coletivas de incentivo ao consumo de frutas e hortaliças nos territórios do Programa Academia da Saúde.

Sob a coordenação da professora Aline Cristine Souza Lopes, a equipe que desenvolveu o estudo visitou 336 estabelecimentos comerciais da capital. De acordo com ela, a distância entre a casa do consumidor e os locais de venda de frutas e hortaliças e a qualidade dos produtos oferecidos são variáveis que pesam na decisão de quais alimentos vão compor as refeições.

“O fácil acesso, tanto em relação à distância quanto à qualidade dos alimentos, contribui para a maior aquisição e consumo de alimentos saudáveis, como frutas e hortaliças”, informa a pesquisadora, destacando que esses indicadores são mais satisfatórios nas regiões centrais da cidade e pioram à medida que a análise se desloca para áreas mais periféricas.

Perfil dos entrevistados
Foram entrevistadas 3,4 mil pessoas. Eram, em sua maioria, mulheres (88,1%) e com excesso de peso (62,7%). Boa parte dos participantes informou ter doenças, como hipertensão arterial (53,2%), diabetes mellitus (44,1%) e dislipidemias (16,9%). A maioria relatou manter o hábito diário de consumir frutas (62%) e hortaliças (72%).

Em geral, os entrevistados associaram o consumo de frutas e hortaliças a efeitos benéficos à saúde e ao paladar. No entanto, as quantidades recomendadas para a ingestão ainda são desconhecidas de boa parte dos usuários. A falta de vontade e/ou esquecimento (39,5%), a falta de hábito (28,7%) e o costume de não jantar (42,6%) foram obstáculos mencionados para justificar o não consumo desses alimentos. Além disso, 43% dos entrevistados alegaram que realizar refeições fora de casa interfere negativamente no consumo de frutas e hortaliças.

Almoço e jantar são as refeições em que há mais possibilidade de consumo de hortaliças. Contudo, observa a professora Aline Lopes, o costume de jantar vem se tornando cada vez mais raro. “A crença, errônea, de que refeições noturnas são responsáveis pelo aumento de peso tem levado as pessoas a abandonar o hábito de jantar, substituindo-o por lanches, que podem ser menos saudáveis. Isso tem reduzido o consumo de frutas e hortaliças e, por vezes, prejudicado a qualidade nutricional da refeição”, avalia a professora.

Aline Lopes defende a ampliação das políticas públicas de abastecimento de alimentos por meio de feiras livres e sacolões. “As unidades do programa ABC estão, geralmente, em áreas mais centrais. Em média, os participantes da pesquisa residiam a 319 metros de estabelecimentos comerciais, mas em áreas mais afastadas, como as regiões Norte e Barreiro, essa distância praticamente dobrava”, exemplifica.

Segunda etapa
Os dados qualitativos relativos ao território subsidiaram a segunda etapa da pesquisa – o planejamento e a aplicação de ações de incentivo ao consumo de frutas e hortaliças. A intervenção, que durou sete meses, contemplou experiências culinárias, degustação de frutas e hortaliças, intervenções no ambiente dos serviços e distribuição de material educativo.

Academias da Cidade
Implantado nacionalmente, o Programa Academia da Saúde (PAS) é constituído por polos do Sistema Único de Saúde com infraestrutura, equipamentos e quadro qualificado para orientação de práticas corporais, atividade física e de lazer, alimentação saudável, segurança alimentar e nutricional, entre outros aspectos. A capital mineira conta com 63 unidades do programa.

(Rosânia Felipe, jornalista da Escola de Enfermagem, e Victor Alves, bolsista de jornalismo. Com colaboração de Fred Lamêgo, jornalista das Redes Sociais da UFMG. Matéria publicada na edição 1918 do Boletim UFMG)