Universidade Federal de Minas Gerais

Estudo da Arqueologia mostra como distribuição de cômodos de hospital psiquiátrico infantil serviu a estratégias de disciplinamento dos pacientes

quarta-feira, 13 de abril de 2016, às 8h50


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Para a arqueologia da arquitetura, prédios são artefatos – como louças ou potes de cerâmica – carregados de discursos e ideologia. A leitura desses discursos é feita por meio de metodologias específicas, como o Modelo Gamma, criado para a análise dos espaços internos de um edifício. Esse foi um dos principais recursos utilizados pela arqueóloga e historiadora paraense Juliana Brandão Moreira para estudar, no âmbito do Programa de Pós-graduação em Antropologia, da Fafich, o Hospital Neuropsiquiátrico Infantil (HNPI), que funcionou em Belo Horizonte de 1947 até a década de 1980. A pesquisa resultou na dissertação de mestrado Arquitetura que enlouquece: poder e arqueologia.

"Por meio da leitura da espacialidade do prédio, foi possível compreender as estratégias de disciplinamento, controle e cura exercidas sobre as crianças internadas lá, muitas das quais sequer sofriam de transtornos mentais", afirma a pesquisadora, que cursa o doutorado, também na UFMG.

Antes de detalhar a metodologia e os mecanismos de controle baseados na distribuição do espaço, o trabalho põe em questão o conceito de loucura e sua história na sociedade ocidental. Juliana chama a atenção para o fato de que, desde a Antiguidade, pessoas que não se ajustavam aos padrões sociais e geravam incômodo eram segregadas. Na Idade Média, por exemplo, os prédios construídos para isolar leprosos foram transformados em manicômios. No século 19, o médico francês Philippe Pinel defendeu que os doentes mentais deveriam ficar em casas afastadas das cidades.

Deslocamento e observação
Em Minas Gerais, segundo Juliana Brandão, as primeiras políticas públicas para o tratamento de doentes mentais surgiram no início do século 20, quando foi criado o hospício de Barbacena. Em 1947, um hospital militar construído 33 anos antes na Rua Manaus, bairro Santa Efigênia, foi transformado no HNPI. Ela observa que, embora o hospital tenha sido criado para atender crianças com doenças nervosas e mentais, para lá eram enviados também menores abandonados e portadores de outras doenças. Ou seja, o HNPI funcionava como aparelho mantenedor da ordem social, compondo conjunto que incluía prisões, escolas e manicômios travestidos de hospitais.

"Não tive acesso à planta baixa original, então optei por uma arqueologia sem colher de pedreiro, baseada em observar atentamente, deslocando-me pelo prédio", diz a pesquisadora. Ela explica que o Modelo Gamma, proposto em 1984 pelos teóricos Bill Hillier e Julienne Hanson, analisa a permeabilidade das construções, isto é, tenta compreender como se dão os acessos e a movimentação em seu interior. Uma estrutura é distributiva se os acessos podem ser feitos por mais de uma via e não distributiva se apenas por uma via. Juliana também utilizou medidas criadas por Richard Blanton (de escala, integração e complexidade), que auxiliam em leituras comparativas. Os dados geraram gráficos que representam a forma de distribuição do prédio.

"A configuração do interior do prédio após a criação do HNPI é caracterizada por circulação restrita e falta de caminhos alternativos. Amplas enfermarias foram transformadas em pequenos cômodos, que passaram de 37 para 46, com fechamento de muitas portas, o que reduziu as vias de circulação", comenta Juliana Brandão. "Isso facilitava o controle e criava uma sensação de confinamento, como em algumas escolas, reformatórios e orfanatos antigos. Havia também áreas panópticas, pontos desde os quais era possível vigiar grande quantidade de cômodos."

Um corredor por pavimento
A pesquisadora acrescenta que os corredores do HNPI evidenciam a prática do poder disciplinar. No primeiro e no segundo andares, a circulação era feita em apenas um corredor. Pacientes e funcionários ficavam facilmente visíveis em qualquer movimento, assim como suas interações, já que os corredores eram os principais pontos de encontro. A análise do edifício não possibilita a identificação de práticas de tratamento psiquiátrico, mas documentos, como matérias de jornal, mencionam o uso de eletrochoque e de quartos de contenção, com paredes forradas para prevenir ferimentos graves em momentos de crise.


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Tombado pela Prefeitura há mais de 20 anos e ocupado desde 2013 por grupos que produzem arte e cultura em sistema de autogestão, o prédio que abrigou o hospital militar e a unidade de atendimento a crianças e jovens com supostos problemas mentais sofreu muitas modificações nas últimas décadas. Ainda assim, Juliana Brandão encontrou desenhos nas paredes. "Esses desenhos, que sugerem melancolia, eram provavelmente uma das únicas formas de os pacientes darem vazão ao tédio e ao estresse de estarem confinados num espaço onde não havia brinquedos nem espaço para brincar", diz a pesquisadora, que já iniciou estudos sobre o hospício de Barbacena para produção da tese de doutorado, sob orientação do professor Andrés Zarankin.

Dissertação: Arquitetura que enlouquece: poder e arqueologia
Autora: Juliana Brandão Moreira
Orientador: Andrés Zarankin
Defesa em: 2015, no Programa de Pós-graduação em Antropologia

(Itamar Rigueira Jr. / Boletim 1936 – Fotos de Juliana Brandão)

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