Fotos: Marina Gontijo / UFMG |
Enxergar o território em sua complexidade e diversidade foi o eixo central da abordagem do professor José Augusto Pádua, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, um dos participantes da mesa-redonda Ecologia e meio ambiente, realizada na tarde desta quarta-feira, 5, como parte da Conferência internacional sul-americana: territorialidades e humanidades, sob a coordenação do professor Raoni Rajão, da Escola de Engenharia. A exposição do pesquisador da UFRJ teve como princípio a construção histórica do território do Brasil, celebrado no hino nacional como “gigante pela própria natureza”. José Augusto [em foto ao lado] mostrou que o imaginário do país foi fortemente consolidado com seu território, mas desconsidera uma série de questões. “A narrativa tradicional de Aroldo Azevedo [influente geógrafo brasileiro] revela um espaço que vai sendo preenchido ao longo dos séculos e superestima a densidade populacional. O que na verdade existia era um arquipélago de manchas de colonização, com gigantescos sertões entre elas", afirmou Pádua. “Trabalhar no nível do mapa político deixa de fora o caleidoscópio de formas de vidas presentes no continente, as zonas de transição entre os biomas, a nossa incrível rede hidrográfica e o mosaico de populações que viveram aqui, agregadas sob a denominação homogeneizante de índios”, criticou o professor. A premissa da história ambiental defendida por ele vai na contramão dessa tendência ao mesmo tempo histórica e geográfica: “Trata-se de pensar a construção histórica em ambientes cheios, diversificados e dinâmicos, nunca em espaços vazios, abstratos e passivos onde a humanidade vai imprimindo o que quer”. Salto de consciência Andrés Ribeiro inspira-se na ecologia integral, que congrega três dimensões: matéria, vida e consciência. Segundo ele, a atualidade é marcada pelo ritmo rápido da consciência, dos pensamentos, sonhos e sentimentos, em oposição ao lento ritmo geológico e biológico em que se desenvolvem a matéria e a vida. É nessa dimensão menos tangível, de consciência, que aplicar os princípios da ecologia se mostra fundamental. “Devemos ecologizar tudo, como o menino do dedo verde: a consciência, a crença, as tradições, as palavras, o desejo e as humanidades”, propôs o autor, em referência à obra de Maurice Druon e ao objeto da Conferência. Em perspectiva semelhante, Joceli Andrioli [ao lado], do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), defendeu que é necessário um salto de consciência que permita superar o modelo de sociedade contemporâneo, no qual um pequeno núcleo da burguesia internacional detém poder sobre milhões de seres humanos. Para ele, o rompimento da barragem de Fundão da Samarco, em novembro do ano passado, em Bento Rodrigues, é consequência desse modelo. “A aceleração do processo de produção de minério de ferro está no cerne da questão de Mariana, um crime de enormes proporções que diz respeito aos atingidos pela barragem e à sociedade como um todo”, diz. Ainda sobre o desastre, o ativista fez duras críticas ao modo como ele vem sendo tratado pelo governo e pelas empresas mineradoras. Depois de quase um ano, nenhuma família das comunidades atingidas pela avalanche de resíduos foi assentada. “Foi dado ao criminoso o direito de determinar quem é a vítima e quais são seus direitos. A gestão da Vale e da Samarco foi estendida para todo o Rio Doce”, diz ele. Para Andrioli, o momento político atual é crítico: “É só olhar para o receituário de PECs do atual governo que notamos um avanço na exploração dos trabalhadores. Estamos em um momento de encruzilhada relacionado não só com Mariana, mas com toda a conjuntura nacional de privatização, desmonte, entrega e destruição social e ambiental”. A programação da Conferência internacional sul-americana: territorialidades e humanidades continua até sexta, 7, e pode ser conferida on-line. O evento integra as comemorações dos 90 anos da UFMG e é preparatório para a Conferência Mundial das Humanidades, que será realizada em Liège, na Bélgica, em 2017.
Maurício Andrés Ribeiro [foto ao lado], autor do livro Ecologizar, trouxe para o evento uma visão ampliada do conceito de ecologia, deslocando-o para além das fronteiras das ciências biológicas e naturais. Ele defendeu o que chamou de "ecoalfabetização" para viabilizar essa mudança de paradigma.